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sexta-feira, 14 de abril de 2023

5 Grandes noites em Itália


"Para virar do avesso uma eliminatória que se tornou inusitadamente complicada após noventa minutos, cabe ao SL Benfica fazer o que nunca conseguiu: vencer por mais de duas bolas em solo italiano.
Em 67 anos de participação em provas continentais, o máximo que o Benfica conseguiu foram quatro vitórias pela margem mínima (que suavizam o registo medonho de 11 derrotas em 14 viagens).
Aliás, a redundante média de finalizações certeiras na bota peninsular (uma por jogo, 14) exige do plantel e de Roger Schmidt uma destreza ofensiva que não foi concretizada por Eusébio e Coluna, por Néné ou Chalana, João Vieira Pinto ou Valdo. Todos eles ganharam em Itália mas nenhum, por mais talento que tivesse, conseguiu dar ao Benfica um placar com três golos. Ou dois, não sofrendo nenhum.
Apesar do registo probrezinho, Itália e Benfica casam bem. Como todo o matrimónio, nem sempre a relação pautou pelo melhor ambiente.
A ligação escreve-se pela irreparável tragédia da Superga e os laços ao Torino, ganha laivos de rivalidade pelas finais europeias perdidas contra milaneses, pela constante dificuldade em lá jogar – atestada pela epopeia de 2013-14, quando se perde uma final em Turim depois de impedir a Juventus de ganhar o caneco na própria casa.
Mas o registo na Luz, bem mais meritório (apenas quatro derrotas em 14 jogos), a história criada em conjunto e pormenores tão especiais como a relação de Miccolli com o Terceiro Anel ajudam a explicar essa harmonia entre Benfica e transalpinos.
Relembramos então cinco jogos memoráveis jogados em Itália que servem sobretudo para lembrar que é preciso fazer bem melhor do que em qualquer um deles para continuar o sonho europeu 2022-23.
Resta comprovar se este Benfica é realmente transcendente como demonstrou a espaços ou não passa de mais uma versão frágil, que se afunda nas primeiras contrariedades e mete em causa o caminho glorioso até Abril.

Juventus FC 0-1 SL Benfica (Taça dos Clubes Campeões Europeus 1967/68) – Uma daquelas tragédias, autêntico atentado ao património material da Humanidade. Todo e qualquer historiador que se debruce sobre o passado benfiquista lamenta o sucedido. Do mais abastado e comprometido ao mais amador, por mais que vasculhe, pergunte, escave e desarrume caixotes, gavetas, sótãos e caves, arquivos profissionais e memória daqueles que viram ao vivo ou pela televisão, chega a um beco sem saída: não ficou para a posteridade qualquer registo audiovisual do livre de Eusébio marcado no Comunale, naquela noite de Maio de 1968 em Turim, quando aprontou um balázio a 40 metros que só parou no fundo das redes de Roberto Anzolin, goleiro da Zebra.
A Velha Senhora era treinada por Heriberto Herrera, o central paraguaio que se tinha tornado técnico principal do clube depois do primeiro Agnelli ter deixado a presidência – era vital naquela fase alguém competente o suficiente para aguentar o barco, mantê-lo nos mesmos mares de AC ou Inter (já campeões europeus) e quem melhor que Heriberto, que pelas iniciais em sigla serem as mesmas de Helenio Herrera, o mago do catenaccio, era referido por HH2? Como o primeiro, era defensor acérrimo da disciplina mental e tática, do plural sempre antes do individual como mindset essencial para o sucesso; e por isso, assim que aterra em Turim, trava-se de razões com o mágico Sivori, o Bola de Ouro de 1961 que quatro anos depois estava já em decadência.
Era então uma armada exemplarmente organizada, chatinha como o actual Inter de Simone Inzaghi, aquela que o Benfica enfrentava nas meias-finais daquela Champions, perdida depois na final frente ao United de George Best ou Charlton.
Na Luz houve 2-0, em Turim falaram os periódicos dum Benfica «mestre em todas as questões do jogo», que controlou a partida a seu bel-prazer, com destaque para Coluna, imperial na intermediária a fazer de carteirista e maestro, e Eusébio, que apesar de claustrofobicamente guardado por dois ou três italianos, não se coibiu de mostrar as qualidades que faziam dele o melhor avançado da Europa.

AS Roma 1-2 SL Benfica (Taça UEFA 1982/83) – Foi aqui que Eriksson assegurou a sua longa e triunfal carreira na Serie A, numa tarde em que aquele Benfica já longe das façanhas europeias da época dourada conseguiu regressar ao topo europeu com uma vitória incontestável na casa da AS de Ancellotti, Falcão, Conti, Prohaska e Pruzzo, uma constelação regida pelo astral do lendário Nils Liedholm.
Perderiam nessa tarde contra o também gigante Benfica de Eriksson, mas não ficariam a perder: no final da época seriam coroados campeões do Calcio, quatro pontos mais que a Juventus de Platini. Só para ver se nível da coisa.

FC Internazionale 4-3 SL Benfica (Taça UEFA 2003/04) – A época iniciara-se com uma pré-eliminatória contra outros italianos. O Benfica, que Camacho fizera regressar à Europa quatro anos depois, havia sido passado a ferro pela SS Lazio, sobretudo no Olímpico (3-1). Obviamente que faltava estofo a um conjunto cheio de bons valores, encabeçados por Simão. Por isso era apenas uma questão de experienciar, de atestar qualidades, de competir e adaptação mental a ambientes dessa natureza, à pressão inerente de jogar nos melhores estádios da Europa.
O Benfica, ao perder com essa Lazio, havia caído para a Taça UEFA e percorrera caminho até aos Oitavos de final, onde já era quase impossível escapar a uma truta, agora que o lago ia ficando cada vez mais apertado. Era o Inter de Vieri, Obafemi Martins e Recoba, guardados por um enorme Toldo na baliza – o responsável pelo empate a zero na primeira mão na Luz, onde o Inter levou um amasso daquele Benfica tenrinho.
E talvez tenha sido essa ingenuidade da equipa que permitiu entrar no Giuseppe Meazza cheio de garimpa, de queixo levantado e a fazer peitos a uns rapazes que tinham chegado às meias da Champions no ano anterior: Nuno Gomes faz o 1-0 e pouco depois atira ao poste, pondo em polvorosa o arrebatador contingente luso que acompanhou a equipa – mas o Inter deixou o tempo correr, puxou dos galões, virou o jogo e nunca permitiu uma verdadeira réplica ao Benfica, que reduziu aos 76 para 4-3 e tentou quase tudo até final. Nada a apontar…

Juventus FC 0-0 SL Benfica (Liga Europa 2013/14) – A maior demonstração de força do primeiro Benfica de Jorge Jesus. Nunca os encarnados foram tão comprometidos, tão perfeitos na interpretação tática das ideias do seu treinador, tão empolgantes no esforço para proteger a sua baliza.
O recital defensivo que permitiu ao Benfica chegar à segunda final consecutiva da Liga Europa fica nos livros e na memória de todo o benfiquista: Matic tinha-se ido embora em Janeiro, Fejsa estava lesionado e por isso tornou-se um épico como Oblak, Luisão, Garay ou Rúben Amorim geriram todas as ameaças e foram aguentando o pressing dum meio-campo de luxo – Pirlo, Vidal, Pogba – e dum Tévez ainda no topo mundial.
Enzo Pérez é expulso a 25 minutos do fim, Garay lesiona-se quando já não dava para fazer mais substituições. E foi assim, estoicamente, que o Benfica segurou com nove o que muitas equipas não conseguiriam com onze.

Juventus FC 1-2 SL Benfica (Liga dos Campeões 2022/23) – Foi tão recente e está tão vivo ainda no imaginário colectivo que provoca imediatamente a mais simples das perguntas: pode a saída dum jogador justificar tamanha diferença na capacidade duma equipa? Por quantos venceria este Benfica de Turim o actual Inter, jogando em Lisboa? Que passará pela cabeça de Roger Schmidt e equipa técnica ao reverem estas imagens e a lembrarem-se da forma categórica como o Benfica se impôs neste 1-2 e depois no 4-3 da Luz?"

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