"De todas as alarvidades ditas por Gianni Infantino na véspera do pontapé de saída do Mundial, a maior foi ter-se considerado um “trabalhador migrante”, embora tecnicamente seja, até, menos hipócrita do que dizer-se “gay” ou “árabe” ou queixar-se de ter sido discriminado quando era um suissinho de sardas e cabelo ruivo, sujeito a “bullying” num miserável cantão helvético.
Como diz o outro, aquilo foi gozar com quem trabalha. Foi gozar com quem morreu.
Contra-argumentar citando outro evento com supostas semelhanças, o chamado “whataboutismo”, é uma praga dos nossos dias, nascida da intolerância das redes sociais, mas ninguém esperaria que um líder, na posição esmagadora de presidente da FIFA, tivesse de servir-se de tamanha incongruência para justificar o seu soldo multimilionário.
Ou entrou em “burnout” ou está mesmo desesperado, para encenar uma saída do armário tão dramática e desrespeitosa.
Esmagado pela censura dos críticos “ocidentais”, inventou que os europeus têm uma dívida milenar em relação ao Médio Oriente, alinhando ideologicamente no “lobby” dos envergonhados da História. Pela lógica deste manga de alpaca suíço, só daqui a 3.000 anos seria plausível censurar os crimes do Comité Organizador do Mundial de 2022.
Mas, a que “ocidente” pertencem a Índia, o Paquistão, o Nepal, o Bangladesh, onde os negreiros do Catar recrutaram a maioria dos escravos dos estádios, milhares dos quais morreram numa das obras civis mais sangrentas, em proporção, desde a construção da Muralha da China?
Infantino vai, a partir de hoje, mostrar-se nos púlpitos dos coliseus do Catar no seu trono de “Emirino”, adjunto do Sheik al-Thani, com o funcionário de estimação pela trela, distribuindo salamaleques e oxalás, a troco de votos futuros, pela cáfila de dirigentes regionais e nacionais na fila do beija-mão que suporta o mais perverso regime desportivo do Mundo, a dinastia de Havelange, Blatter e toda a camarilha da FIFA.
A partir de hoje, vão os nababos degustar o chazinho nas tribunas enquanto os gladiadores dos tempos modernos tentam respirar e sobreviver no meio do deserto a justas esgotantes que, só por acção do ar condicionado, não terão as consequências dramáticas das pelejas medievais.
Não, Gianni, nestas últimas horas em que é autorizado não falar exclusivamente de futebol, asseguro-lhe: não haverá festa que lave o rasto de sangue e corrupção em que assenta o seu poder de vassalo."
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