"Não tenho nada contra a caça às toupeiras empreendida pelo Ministério Público. Tenho, aliás, tudo a favor. A violação do segredo de justiça em Portugal é uma mancha na nossa democracia. Estas fugas de informação são sempre recebidas pela opinião pública de duas maneiras e ambas doentias: trata-se de uma afronta intolerável ao regime quando o segredo sonegado desfavorece o nosso clube ou o nosso partido ou os nossos amigos e é uma festa quando acontece precisamente o contrário. Ou não é assim? Portanto, quanto à caça às toupeiras julgo tê-los esclarecido. Sou a favor. Já quanto à caça ao Zivkovic, sou absolutamente contra. Nos últimos jogos do Benfica tem sido um ver se te avias desta nova modalidade da caça ao sérvio. Tem sido um valente, o Zivkovic. E hoje há mais, vão ver.
Ter-se-á volvido o futebol uma questão de regime? Não me refiro ao jogo maravilhoso que dura 90 minutos e obedece a dúzia e meia de Leis claríssimas mas ao ‘outro’ futebol, aquele que, de um século para o outro, se viu transformado numa indústria global, numa máquina poderosa que não só gere milhões como também parece gerir ou ser gerida, depende sempre do ponto de vista, por banqueiros, políticos, magistrados, jornalistas e sabe-se lá por mais quem. E gere, não menos inocentemente, as chamadas redes sociais, o novo flagelo público de qual convém fugir a sete pés.
A meio do seu reino de campeão da Europa, o futebol nacional deveria deleitar-se numa clarividência e paz de espírito decorrentes do seu sucesso continental dentro das 4 linhas. Mas não é de todo isso o que se passa fora das 4 linhas. Subsiste actualmente o futebol português na sua mais grave crise institucional de sempre se considerarmos, como é justo fazê-lo, que são os clubes as verdadeiras instituições que promovem o jogo – a essência de tudo – e que, no caso dos ‘três grandes’, são esses os clubes que pomposamente visitam uma vez por ano a Assembleia da República onde se apresentam na cara dos deputados com um extenso rol de lamúrias quando estão em maré de derrotas ou com um certificado de epifanias quando, pelo contrário, estão em maré de vitórias.
Acontece que não podem estar todos os três em maré de vitórias. Que fazer? Com o auxílio das novas tecnologias de comunicação, com a memória fresca de como o processo do Apito Dourado liquidou socialmente o império de Pinto da Costa e com o Ministério Público obrigado a abrir investigações a cada dúzia de denúncias anónimas – será mesmo assim? – somaram-se os ingredientes fatais. Um indício certeiro da decadência moral é a banalização dos anúncios de abertura de processos. Os ‘escândalos’, na realidade, duram meia hora. O anedotário que se lhes segue dura mais porque dura até ao próximo escândalo e até à próxima vaga de graças. A banalização é tramada. É este o regime."
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