"Em 1960, a prova-rainha do ciclismo português deu a conhecer uma das etapas mais difíceis da sua história
O ciclismo é um desporto de valores humanos; a fraternidade e abnegação pela equipa, a solidariedade com os outros, a coragem e resiliência individuais. A Volta a Portugal de 1960 foi reconhecida como uma das mais violetas até então. Decorreu de 14 a 28 de Agosto e atravessou 18 etapas por mais de 2600 quilómetros. Esperava-se uma prova cheia de emoção! Eram 116 os ciclistas inscritos, 'mais que na Volta à França', e entre eles figuravam espanhóis, italianos e franceses.
De 'águia ao peito' foram Jo
ao de Brito, Manuel Simões, Armando Ramos, Henrique Castro, Eugénio dos Santos, José Anastácio e Ilídio do Rosário, o benfiquista mais promissor, que conquistou a camisola amarela na 4.ª etapa, ao chegar a Braga.
Questionado se lutaria pela 'hipnotizante camisola', afirmou não pensar nisso, mas sim em defender a camisola e as cores do Benfica. Desse ponto de vista, iria lutar em nome da equipa e só lhe tirariam a camisola 'quando cair para o lado'. Há palavras que, quando ditas, produzem um efeito profético. A 5.ª etapa ligou Braga e Viseu, mais de 230 quilómetros de subidas exasperantes e estradas em más condições, e foi percorrida sob um dilúvio dantesco. A cinco quilómetros da meta, Ilídio do Rosário cairia para cima de um monte de pedras, devido ao seu desgaste físico causado, particularmente, pela fome. Em mais de 200 quilómetros comera só três bananas e uma laranja. Embora os alimentos distribuídos fossem suficientes, a chuva estragou grande parte deles, sobretudo os de composição sacarina. 'A fome era tanta', que teve de comer as secas cascas da laranja.
Manuel Simões caiu perto de Viseu, tendo sido levado para o hospital com uma fratura na cabeça, acabando por desistir. Outros também o fizeram, como o grande Alves Barbosa. A equipa francesa da Peugeot não compareceu sequer no início da 6.ª etapa. Tornaram-se medidas excepcionais para apoiar as equipas adiou-se em uma hora a partida do dia seguinte para prolongar o descanso, dispensaram-se multas diversas e repescaram-se 42 corredores que não cruzaram a meta em tempo útil.
Ainda assim, apenas 50 ciclistas cruzariam a meta final, quatro deles envergando a camisola do Benfica. José Anastácio foi o que melhor se classificou, em 21.º lugar.
Embora criticada, a 'Volta 60' mediu o desempenho dos atletas e permitiu compreender a evolução da modalidade. O Benfica ganhou embalo, reforçando, ao longo da década, a sua notoriedade no ciclismo.
Conheça mais histórias sobre o ciclismo do Benfica na área 3 - Orgulho Eclético, do Museu Benfica - Cosme Damião."
Pedro S. Amorim, in O Benfica
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