Últimas indefectivações

terça-feira, 17 de dezembro de 2019

O desporto tem de ser mesmo para todos

"Vem isto a propósito da importância que todas as políticas que visem a integração, a igualdade de oportunidades através do desporto, devem ter no contexto nacional, ainda não suficientemente "adaptado" a estas necessidades.

No passado fim de semana a Selecção Nacional de Andebol em Cadeira de Rodas (ACR) foi medalha de prata no Campeonato da Europa, disputado na Croácia, sendo apenas superada pela equipa da casa. Estão de parabéns os homens e as mulheres (as equipas são mistas) que representaram Portugal.
Foi um trabalho de preparação intenso, pouco conhecido, mas de excepcional mérito. Nas pessoas do seleccionador nacional Danilo Ferreira e do coordenador nacional do programa Andebol4All, Joaquim Escada, quero manifestar o meu agradecimento. Temos pela frente desafios enormes que podem chegar até aos Jogos Paralímpicos 2024 (Paris), e nós queremos lá estar.
Vem isto a propósito da importância que todas as políticas que visem a integração, a igualdade de oportunidades através do desporto, devem ter no contexto nacional, ainda não suficientemente "adaptado" a estas necessidades. Sabemos, através de vários estudos, que a actividade desportiva, informal ou formal, tem imensas virtualidades, quase nunca valorizadas pelos poderes políticos na sua globalidade, e que são exponenciadas quando se trata de pessoas com alguma limitação, física ou psíquica.
O desporto está a fazer pela capacitação dos cidadãos o que muitas medidas no papel e muitos milhares de euros não conseguem, muito fruto de um trabalho de voluntariado associado, que temos de realçar.
Conto aqui uma história que jamais esquecerei. Numa das minhas primeiras saídas como presidente da Federação de Andebol de Portugal, estive presente no torneio Garcicup, Estarreja, onde decorria também uma competição de ACR. O speaker de serviço, em entrevista a um dos atletas de cadeira de rodas, perguntou quantas vezes treinava por semana. O atleta acabou por referir que as vezes que treinava eram as únicas em que saia de casa. Podia não ser exactamente assim, mas para mim foi suficiente para perceber que o Desporto em geral e o Andebol em particular, estavam a cumprir uma parte da sua missão. O de "tirar as pessoas de casa", de as juntar, de as associar e acolher como iguais e de lhes dar oportunidades para que a igualdade seja uma palavra cumprida.
No fundo, é o papel do Desporto na capacitação, na autoestima de crianças e jovens que de outra forma não teriam. É o papel do Desporto junto dos adultos, na prática da actividade física e consequente combate a doenças associadas à inactividade. É o papel do Desporto na inclusão, e no alavancar das capacidades dos cidadãos em situação de alguma fragilidade. É o papel do Desporto na integração de pessoas com uma qualquer deficiência, que têm todo o direito a participar na sociedade de forma integral. Mas há problemas e situações por resolver. Não fora a dedicação de centenas de pessoas, de forma voluntária, nas instituições, nos clubes, nas associações e nas federações desportivas e nada disto estaria a acontecer.
Na FAP assumimos este desiderato de corpo inteiro. Pela igualdade, pela construção de oportunidades e de instrumentos que permitam essa igualdade, mas confesso que não é fácil. Com o apoio imprescindível do IPDJ e do INR, que têm dirigentes que compreendem e reconhecem bem esta realidade, temos vindo a desenvolver o Andebol4All em várias dimensões - Andebol em Cadeira de Rodas, para a Deficiência Intelectual, nos Estabelecimentos Prisionais e nos Centros Educativos. São centenas de atletas envolvidos, muitos deles jovens que, assim, têm uma possibilidade, uma oportunidade, de "sair de casa".
Mas falta ainda muito por fazer. Os poderes públicos têm de reconhecer a sociedade civil como parceira indispensável. Eu sou dos que não acredita que o Estado tudo consiga (ao estilo soviético) ou que tudo deva ser privatizado, nomeadamente a vertente desportiva. Um sistema misto, de apoios estatais com apoios privados e voluntariado continua a ser o mais adequado, neste momento, à situação do país. Mas tenhamos a consciência que continua a não ser apelativa à iniciativa privada o apoio a eventos desportivos de carácter comunitário e social. Temos de arranjar soluções para que os privados sintam interesse em contribuir para este desafio. O Estado tem de dar condições para que o privado substitua o que o Estado não quer, ou não pode fazer. Possível é, infelizmente não sei se estamos em condições de o conseguir, a bem de "tirar as pessoas de casa". Se não o conseguirmos é lamentável e vamo-nos lamentar no próximo futuro, mas por aqui continuaremos a pugnar pela igualdade de oportunidades. "

Sem comentários:

Enviar um comentário

A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!