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sexta-feira, 17 de julho de 2020

Futuro

"O mundo depende dos jovens se quiser futuro, e isto é uma verdade tão óbvia quanto incontornável, mas este mundo louco em que vivemos roda a diferentes velocidades. Nas latitudes mais ricas e desenvolvidas, está cada vez mais envelhecido. Nas mais pobres e desafiantes, explode de juventude. No entanto, nenhum destes dois extremos parece ser favorável aos jovens, senão vejamos. Do lado rico, onde as gerações mais velhas dão aos jovens todas as condições para uma educação de excelência e lhes acenam com empregos para a vida e rendimentos de fartura, na verdade reconhecem-lhes muito poucas competências. Deste lado, as entrevistas de emprego são poucas, porque os mais velhos fazem tudo para se manter jovens até tarde e fazem formação e estudam, cruzam o saber com a experiência e agarram-se à vida profissional cientes de que o tempo lhes começa a escassear e que abominam a própria ideia de inactividade, para muitos sinónimo de inutilidade. Por isso é cada vez mais lenta a renovação das gerações profissionais, e a tecnologia cava ainda mais a situação ao substituir a mão de obra humana por máquinas cada vez mais perfeitas e, quase, sonha-se, capazes de pensar e resolver problemas. O último reduto da inteligência humana. Por isso, os jovens, quando (e se) têm uma hipótese, temem o fantasma da falta de experiência. Em muitos casos com razão, porque acontecer-lhes frequentemente serem confrontados com a necessidade de experiência pelas mesmas entidades que, muitas vezes, dizem aos menos jovens que procuravam alguém mais novo. Nesta parte do mundo, para ser jovem e ter sucesso é necessário ser dotado com boas competências, ser skilled e conseguir provar que essas mesmas competências são uma vantagem competitiva. E então, sim, as portas começam a abrir-se, e os jovens conseguem, frequentemente, dar ao mundo corpo e alma e protagonizar feitas fantásticos que quase custa a acreditar de tão jovens que são. As últimas décadas estão cheias de exemplos destes, não é preciso enumerar, basta pensar, por exemplo, no Facebook e na sua história.
Do lado, pobre, porém, como a educação ou a pobreza endémica que se opõem com barreiras intransponíveis entre a infância e o futuro, ser jovem não é melhor. Poder-se-ia dizer que seria mais fácil, com menos provas a dar, mas os números são aí imensos, as oportunidades proporcionalmente menos, e o dinheiro muito menos, tanto que garantir a simples sobrevivência se torna em si mesmo um sonho. Aqui, na vida mais dura e agreste do trabalho casuístico, precário e barato, de pouco importa o que os jovens sabem fazer desde que o façam, rápido, bem, barato e em grandes quantidades. Neste extremo do mundo, onde a vida se põe a cada um ao nível da sobrevivência básica, desperdiçam-se talentos aos milhões e ignoram-se, quase por completo, as competências dos jovens.
Nestes dois mundos, que giram num mesmo planeta a diferentes velocidades, se encerram os dramas de milhões e milhões de jovens. Felizmente não de todos sem excepção, mas de uma grande maioria que passa pela primavera da vida como se nela não houvesse melhor que o outono, e quem perde com isso é a humanidade.
A ONU sabe bem que assim é e por isso decidiu pôr uma luz forte sobre as competências dos jovens, ciente de que é preciso valorizá-los e dar-lhes o espaço a que têm direito no mundo, qualquer que seja a velocidade a que ele rode. E nós, no futebol, aplaudimos esta medida porque, para lá da ética, dos valores e da justiça, sabemos o tesouro que encerra. Quantas vezes, no desporto-rei, vimos o talento galáctico vir do mais humilde dos becos? Tantas, que já nem falamos disso, mas essa é bem a prova de que o desporto, e o futebol em particular, tem muito para fazer pelo mundo e pelos jovens, porque acredita no valor de cada um e sabe celebrar cada indivíduo como um campeão em potência."

Jorge Miranda, in O Benfica

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