"É difícil escrever estas palavras neste momento. É difícil escrever cada uma destas letras, parecem-se demasiado com os segundos que, há pouco, passavam um a um no ecrã da televisão. O Mundial tem esta intensidade, joga-se a euforia e a decepção. O árbitro encheu o peito de ar para fazer ouvir aquele apito final há poucos minutos. Agora é o momento da decepção.
A rapidez com que ultrapassamos este sentimento diz alguma coisa sobre a maneira como estávamos a viver ou, se quisermos ser ainda mais exigentes e psicanalistas de nós próprios, sobre a maneira como vivemos. Quantos de nós disseram "eu já sabia" ao reagirem ao golo de Cavani aos 7 minutos? Quantos começaram logo a mentalizar-se de que a selecção iria perder apenas para, preventivamente, se resguardarem contra o incómodo desta decepção? E, depois, quando o Pepe empatou, quantos voltaram instantaneamente a acreditar?
É difícil redefinir expectativas, sobretudo quando se passa do tudo para o nada. Este lamento não é sequer uma crítica, é apenas uma constatação. A frustração não precisa de ficar no seu grau zero, no seu nível mais primário: o ressentimento, alguém tem de ser culpado, alguém tem de pagar.
Acho normal que, ao longo dos noventa minutos, tenhamos passado por fases de descrença, mas quem não alimentou uma pontinha de esperança a cada centro, quando a bola cruzava o ar e já havia quem se preparasse para saltar na área? Teria bastado uma única feliz coincidência: uma cabeça e a bola a interceptarem-se, uma a bater num certo ponto da outra.
É difícil. Num único jogo, fica para trás todo o esforço da fase de grupos e, mesmo, do apuramento que, como sabemos, não era garantido à partida. Mas que outra opção nos resta? Não há maneira de desfazer o que aconteceu. Podemos encontrar explicações na lógica que escolhermos para acreditar de novo: não foi desta vez, mas haverá outras oportunidades.
Pessoalmente, neste momento, prefiro pensar que talvez tenha sido preferível perdermos agora com o Uruguai do que, daqui a pouco, nos quartos de final, sermos obrigados a eliminar a França. Pobres franceses, há que ter alguma humanidade. Para eles, seria demasiado doloroso perderem duas vezes seguidas com Portugal em competições desta grandeza. Logo a seguir, nas meias-finais, se tivéssemos de eliminar o Brasil, também não seria fácil. Afinal, são o nosso país irmão.
Assim, ao sairmos com o Uruguai, um pequeno e simpático país, demos uma alegria a cerca de 3 milhões e meio de pessoas. Fizemos a nossa boa acção."
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