"Poucos grandes jogadores terão sido tão eclécticos: lançou o peso, o dardo, saltou em altura, jogou basquetebol e foi avançado-centro. Costa Pereira. Um nome para a história. Tinha, na grande área, um estilo único. Uma autoridade imensa.
Há muitos anos que escrevo neste vosso jornal sobre episódios e figuras do Benfica, umas mais marcantes, outras que foram caindo no limbo do olvido, e poucas vezes tenho referido um personagem enorme chamado Costa Pereira. Uma injustiça!, dirá o meu pacientíssimo leitor. Com toda a razão, com toda a razão. Alberto Costa Pereira, natural de Nacala, Moçambique, infância passada na praia do Limbo, meninice entre casa, escola e areia, futebol de areia também, foi lá que deu os primeiros mergulhos, não apenas no oceano Índico mas também para segurar bolas chutadas pelos amigos.
Depois, o pai foi colocado em Nampula, e Costa Pereira foi ao Ferroviário mostrar os dotes.
E dotes ele tinha. Ainda não era o calmeirão que viria a ser, imponente nas saídas de entre os postes, impressionando a Europa com o atrevimento, sempre disposto a tomar conta de toda a sua grande área, assim mesmo com o pronome possessivo, ele era possessivo em relação ao seu território eram aqueles linhas e aqueles ângulos que nasciam branco em frente às balizas.
Lourenço Marques seria a etapa seguinte, para estudar, na Escola Técnica, chumbou a Físico-Química e a Tecnologia, se não teria o curso completo, mas veio o trabalho nos caminhos ferro, veio o futebol um bocadinho mais a sério no Imperial, encontrou por lá o Juca, que viria mais tarde para o Sporting, passou para a União, que tinha o famoso Costuras, do FC Porto, atenção que não era guarda-redes, isso foi depois, era avançado, tinha jeito de pés, ele próprio confessou, já na Metrópole, que poderia jogar nas calmas em qualquer clube médio da I Divisão.
O futuro era a baliza
Mas as balizam esperavam por ele. Primeiro na equipa de rapazolas do colégio interno que frequentou, depois nos juniores do Sporting de Lourenço Marques, o pai nem soube que ele estava nos leões, era demasiado Ferroviário para aceitar a traiçãozita, de Alberto passou a ser conhecido por Costa Pereira, o nome espalhou-se com a facilidade do fogo num campo de milho seco, seria o Costa Pereira até ao fim da vida.
O pai, quando soube do Sporting, pediu-lhe para trocar. Bem tentou. Fecharam-lhe a porta de saída, ficou um ano sem futebol, mas era um inquieto, tratou de se dedicar ao basquetebol, ao atletismo - salto em altura, lançamento do peso, dardo, velocidade - aí já no Ferroviário, sábado à noite jogava básquete, domingo vinha a bola de couro, as características físicas de Costa Pereira tornaram-se inconfundíveis, aquela forma de saltar e agarrar a bola frente à baliza como se fosse em baixo dos postes com a rede cilíndrica.
Veio para o Benfica, um bocado contra a vontade da família. Aos 21 anos, o Sporting de Lisboa chamou-o, mas o pai nem quis ouvir falar do convite. Nem pensar!
Tinha ganho a fama de ser um especialista nos penalties. Graças a um jogo em que defrontou o St. Mirren, da Escócia, e defendeu a grande penalidade marcada por Bill Steel, um nome forte do futebol britânico de então. Mas não foi só o penalty defendido. Foi a exibição total.
Costa Pereira tornava-se o Costa Pereira. Se tinha sido, até aí, um homem à procura do seu nome, via a sua lenda espalhar-se pelas margens do futebol português. Sete vezes campeão nacional, quatro Taças de Portugal, duas Taças dos Campeões Europeus.
Era ele e o seu Destino.
As balizas esperaram por ele, mas valeu a espera. Tornou-se dono delas..."
Afonso de Melo, in O Benfica
Sem comentários:
Enviar um comentário
A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!