"Da relva para a lama. Da ética normativa para o reino dos interesses sem regras. Da sensatez para a mais autofágica turbulência. Da exemplaridade para o mais reles nível. Da leal competição para a guerra total. Da decadência para a ausência de pudor. Da estabilidade para o arrivismo inconsequente. Da transparência para a mais ordinária delação. Da constatação do erro para a abusiva generalização do dolo. Da cooperação para a vendeta. Da verdade como atitude para a mentira e intriga como táctica. Eis como, com brandura, se pode classificar a patologia do nosso futebol. Transversal aos clubes, em que uns são mais iguais do que outros. E onde a memória se esboroa a cada esquina de oportunismo doentio. Onde uns acusam outros e vice-versa, não se vendo ao espelho e julgando-se imaculados. Onde tudo vale por nada valer. Tudo agora reforçado com a parva delegação de porta-vozes funcionários, sem que se ouçam as vozes que os sócios democraticamente elegeram. Com as crianças hoje, adultos amanhã, a respirarem este ar poluído e até venenoso, sem que haja coragem para dizer basta. Com programas nojentos em alguns canais de tv para os quais, em nome do totalitarismo das audiências, não há limites deontológicos e éticos e onde a prostituída regra é a de que qualquer fim (deles, claro) justifica qualquer meio. Um abandalhamento total com intervenientes que, por vã glória, colaboram no assassinato deste desporto.
Este não é o futebol da naturalidade de se ganhar e de se perder (e saber aceitar). Quem acode à sua reabilitação como (parafraseando António Gramsci) «um reino de lealdade jogado ao ar livre»? É uma utopia? Pois que seja."
Bagão Félix, in A Bola
penamente de acordo.
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