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sábado, 9 de agosto de 2025

O novo plano de Lage (com Ivanovic e não Barreiro)


"Onze jogadores a defender desde a baliza contrária é apenas uma das faces do processo encarnado. As dúvidas surgem sobretudo no momento da equipa com bola, disfarçadas por... Schjelderup

A cada dia que passa parece claro qual o Benfica que se desenha na prancha de Bruno Lage. É claro que o puzzle não está completo. Há ainda uma diferença grande entre o onze ideal e as restantes opções que habitualmente se sentam no banco. É preciso também olhar para o contexto de pré-eliminatória e isolá-lo de uma maratona como a Liga, intercalada com uma possível exigente Liga dos Campeões, em que a cada semana surge um problema diferente e, por vezes, não encaixa com as soluções disponíveis ou com o tempo para encontrá-las. Estruture-se ainda a equipa em 4x4x2 ou em 4x2x3x1, que a certa altura pareceu ser o caminho, mesmo as onze primeiras escolhas não fazem esquecer que ainda serão necessárias mais unidades criativas, sobretudo a partir dos flancos.
Não é que possa medir assim, porém podem sempre fazer-se algumas contas. Saíram, como elementos de ataque, Kokçu e Di María, dois definidores por excelência, Carreras, cada vez mais influente na ligação e na largura, e um suplente bastante utilizado como era Amdouni, já para não falar no pouco que deram Renato Sanches e Belotti, ainda assim opções frequentes, o primeiro quando disponível fisicamente. Para substituí-los, as águias contrataram Enzo e Ríos, ganhando agressividade e resistência à pressão na construção, Dedic, invertendo as fugas à pressão da esquerda para a direita (embora Tomás Araújo conseguisse equilibrar quando em campo), e Ivanovic, reforçando a aposta no ataque à profundidade e na capacidade de definição na finalização. Obrador entrará na rotação. Soma feita, há pelo menos um argentino veterano, mas de enorme influência por substituir, acreditando que os reforços são aquilo que parecem: tiros certeiros. Os dois triunfos, Supertaça e Nice, comprovam entretanto que o processo ganha solidez e alguma fluidez.
Um processo que assenta numa forte organização defensiva —e que começou muitos metros à frente, na distribuição dos três avançados (Schjelderup, Pavlidis e Ivanovic) pela construção gaulesa a três, através dos centrais, sublinhando talvez que Lage quer recuperar uma pressão mais alta em relação ao pós-Schmidt. Que tem em Aursnes mais uma vez peça importante, ele que tem de jogar sempre, pela sua dimensão tática na equipa, agora a servir como equilibrador de um flanco que é muito alimentado por Dedic, essencial desde as fugas à pressão às combinações para chegar à linha final ou até em eventuais ligações com Ríos ou Ivanovic ou em incursões por dentro. E que ganhou uma agressividade competitiva diferente no meio-campo com Enzo e Richard Ríos.
No ataque, e se Aursnes aqui também é um pivot importante nos desdobramentos posicionais (e arrastamento dos adversários) — como mais uma vez se viu no primeiro golo na Riviera —, a equipa parece, em determinados momentos, demasiado vertical. Não é a mesma coisa meter bolas longas para Schjelderup ou para Akturkoglu, ainda que o norueguês tenha feito um esforço e lutado por todas as bolas como se calhar não se tinha visto até aqui, decidido a aproveitar de vez a oportunidade. Todavia, foi quando o jogo estabilizou, quando a bola lhe chegou rente à relva, que o nórdico mostrou que pode ser bem mais útil do que o turco, desde que as águias não façam um bypass completo ao ataque posicional. Tudo somado, terá sido dos melhores em campo. E, mais uma vez, provado o seu ponto.
Percebo que se elogie Aursnes, que foi lateral para Dedic encaixar no extremo contrário, médio interior para libertar o bósnio para as arrancadas e extremo para cruzar para o golo de Ivanovic. O norueguês é tudo isso. Um 3-em-1, que sabe sempre o que fazer. Mesmo que nem sempre a técnica o acompanhe nos melhores gestos, ao contrário do que aconteceu no belo cruzamento que deu o 0-1. Enzo e Ríos pareceram mais ligados, mais complementares do que no Algarve e o argentino, sobretudo, parece em claro crescimento na influência no jogo da equipa. Até por ser mais difícil, de lhe ser exigida a ligação entre setores e, como tal, correr mais metros com e sem bola, o colombiano precisará de mais tempo. Para o nível de influência que dele se pretende, sobretudo se o 11 não crescer em número de criativos, a mudança de contexto terá sido bastante grande e precisa de alargar a passada. Mas há bons sinais. Tal como em Ivanovic. Que entrou direto para o 11 (e fez muito mais sentido do que Barreiro). Que marcou na estreia. Que confirmou o que já se sabia: é compatível com Pavlidis e o entendimento, pela amostra, será rápido. Que vem para somar ao grego e não para o substituir. E que, se tudo correr como todos no clube esperam, terá impacto no futebol português.
O Benfica dá assim continuidade à conquista da Supertaça — que, como nos últimos dérbis, também podia ter caído para o outro lado, sendo desta vez melhor a finalizar e mais coeso a defender do que o arquirrival —, com uma vitória moralizadora, sem grandes espinhas, diante de uma das boas equipas de França, ainda que distante em termos de argumentos individuais da formação portuguesa. A pré está bem encaminhada e o play-off, diante de Feyenoord ou Fenerbahçe, será certamente um ou dois níveis acima quando comparado com este Nice. Porque ninguém imagina que, na Luz, haja hecatombe tal que leve à eliminação dos encarnados perante a formação gaulesa, que até foi perdendo por questões físicas jogadores nucleares. É futebol, contudo, parece um cenário bastante longínquo.

P.S. O futebol tem perdido demasiada gente boa. Jorge Costa, tal como Diogo Jota, que nos deixou em lágrimas, era boa gente. Ambos mereciam que os elogiássemos em vida, não agora. Mas quero acreditar que nos roubaram o tempo para fazê-lo condignamente ao se despedirem de nós de forma tão precoce. Ao surpreenderem-nos assim. O Jorge confundia-se com o FC Porto e o FC Porto com ele. Mais do que qualquer outra personalidade, ele era o FC Porto. Viverá nas nossas memórias, tal como nós, estupidamente efémeros, viveremos naquela que deixarmos aos nossos. Se vires o Diogo, dá-lhe um abraço, Jorge. Até sempre."

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