"Na rua iluminava o quarteirão com a aura de um talento infinito, acompanhado pela maturidade de quem conheceu o futebol antes mesmo de alguém lho ensinar. Hoje, reclama liberdade e confiança para se expressar, as mesmas que, nos tempos idos da infância, lhe permitiram evitar a anunciada derrota social. Antes para alimentar o eterno sonho da prosperidade, agora para recuperar as melhores recordações de menino, Jonas atribui à bola e ao jogo a importância da vida: não pode viver sem eles. É um génio do futebol que se apetrechou com o luxo de criações sublimes, a solidez do compromisso com as comunidades que o acolheram e o orgulho de ser profissional, sem beliscar a força dos elementos que lhe definiram o perfil: atrevimento, provocação, revolta e ambição.
Jonas podia ser um dos capitães de areia de Jorge Amado, o malandro para quem o pequeno delito não é propriamente crime; um pouco de batota e informação equivocada, emitida em cada gesto e movimento, são apenas parte do seu padrão criativo; iludir os carrascos espalhados pelo espaço ofensivo obedece ao estilo e aos princípios de quem luta por sobreviver e ser feliz. Tudo em nome da auto-estima, da causa que defende, da comunidade que representa e dos amigos com quem reparte o suor, a dedicação e os objectivos. Sendo um jogador pouco escrupuloso com as regras vigentes - se puder ludibriar a autoridade máxima em campo não hesita um segundo -, não custa imaginá-lo de boné com a pala para trás, olhar enigmático e roupas despreocupadas pronto a qualquer malfeitoria menor. É para isso que ali anda: para evidenciar a arte de que é feito e aproveitar os erros alheios.
Pode perceber pouco de etiqueta mas sabe tudo sobre paixão, engenho, picardia, aventura e solidariedade. Se o futebol é engano, ele é o futebol, porque poucos são tão perfeitos nessa arte de mentir com todo o corpo; de dar informações equivocadas aos adversários e de, entre um monte interminável de opções para cada lance, escolher precisamente aquela que mais cedo abandonou como solução. Numa equipa de tendência atacante, tem marcado a ritmo alucinante (26 golos na época, 57 em ano e meio de águia ao peito), mais do que seria suposto atendendo à correlação de estilos e de funções com Mitroglou, seu parceiro de ataque - João Pinto pincelava as obras-primas mas era Jardel quem as assinava; Saviola encantava a plateia e multiplicava a produção mas os golos eram de Cardozo... Sendo candidato à Bota de Ouro, cabe-lhe, acima de tudo, assumir-se como denominador comum da dança colectiva que antecede o remate final.
César Luis Menotti disse um dia, pensando em futebol, que o Mundo também devia estar grato a quem levou o piano a casa de Mozart, relevando a importância do músculo na expressão artística. Em muitos casos entendidos como fracassos de Jonas importa reconhecer que nem sempre os carregadores de piano cumpriram o seu dever; que o facto de não ter havido concertos grandiosos se deveu mais aos solavancos que afectaram o instrumento do que à desinspiração do criador. O brasileiro melhora o futebol daqueles com quem entra em contacto; é um goleador temível mas também um jogador sublime, que alimenta o enlace criativo da equipa e dá perigo, malícia, brilho e emoção a cada bola em que toca; um génio que combina a frieza dos números e o calor de quem deslumbra e exalta as bancadas com invenções deslumbrantes que põem a máquina funcionar. Com muitos ou poucos golos, em palcos de maior ou menor dimensão, perante adversários mais ou menos categorizados, só por preconceito ou ignorância alguém se atreve a discutir-lhe os méritos, recusar-lhe a influência e não o reconhece como um dos melhores avançados da história do Benfica. Negócio da China é não aceitar que o mercado o leve."
Sem comentários:
Enviar um comentário
A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!