"Prescrever é um verbo muito nosso, usado a preceito e abusado com mais rigor ainda. Prescrever está no ‘antes’ – no tempo do que é de regular, de estabelecer, de preceituar – e também no ‘depois’ – no tempo do que cessou de existir com o decorrer do tempo. Prescrever nunca é do tempo útil do agir.
Assim, no Portugal da bola e da Federação e da Liga e da Nau Catrineta e das verdades relativas, tudo se pré-escreve na lei e tudo, na mesma lei, se prescreveu. Só assim se compreende que os dirigentes do Boavista exijam que a mesma justiça que condenou o clube os ressacie agora, porque essa mesma justiça exerceu a atitude muito lusitana do ‘deixar prescrever’ com a mesma competência com que se exerce o ‘deixar andar’. Aliás, de uma deriva a outra e das duas deriva esta podre sensação de impunidade que transforma a justiça desportiva portuguesa numa anedota de prostíbulo rasca.
No mesmo âmbito, foi-nos comunicado que a Comissão de Instrução e Inquéritos da Liga Portuguesa de Futebol Profissional decidiu arquivar um processo a um ex-dirigente do Sporting, por prescrição. Afinal, umas famosas imagens de alguém a depositar dinheiro na conta de um fiscal de linha não existem porque a realidade das mesmas prescreveu, deixou de existir. Da mesma forma, aquela célebre lista com informações pessoais sobre os árbitros, também não deve ter existido, ou, se existiu, deixou de o ser porque prescreveu. Ainda nesta semana, o Sr. Costa recebeu um prémio da Associação de Futebol do Porto. Algures no tempo deve ter prescrito uma realidade chamada Apito Dourado. Porque isto de prescrever acontece sempre em desencontro com o tempo da Justiça é que o Torga dizia que “a História é morosa e nunca chega a tempo. Mesmo quando condena, é sempre fora de horas, depois dos crimes prescritos, numa altura em que já nenhum dos culpados pode cumprir a penitência.” "
Pedro F. Ferreira, in O Benfica
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