"O Jorge era trolha. Tinha muitos anos de experiência. Começou por construir uma vivenda na Margem Sul. Depois: convidaram-no para ir para uma obra no norte, em Felgueiras. 'Parece que há lá muito graveto', disse-lhe um colega. Jorge exigiu materiais mais caros. Queria parquê nos quartos e uma lareira na sala. 'Mas sem factura', pediram-lhe os empresários da indústria têxtil. O trolha aceitou e meteu algum ao bolso. Estava lançado. Continuou a saltar de obra em obra, até que um dia, foi desafiado para um projecto maior, em Braga. Juntou meia dúzia de homens da sua confiança e fez-se ao trabalho. Na inauguração as falhas estavam à vista, havia uns fios soltos e umas tomadas que não funcionavam, mas a acústica era boa. E entregou a obra só com alguns meses de atraso e com uma derrapagem financeira que interessava a toda a gente. Ficou bem visto e um gabinete de arquitectos convidou-o para uma obra especial, a seis anos - uma catedral neorealista. A ideia era a de conseguir o Pritzker, o prémio Nobel da arquitectura. Jorge nunca tinha ouvido falar de tal coisa. Chamou a sua equipa, reforçou os ordenados e nem queria acreditar quando chegaram as madeiras nobres do Brasil, as pedras preciosas da Argentina e os filões de ouro da ex-Jugoslávia. Tudo sem mexer uma palha, a equipa de trabalho estava bem oleada. Todos acreditavam que não deveria faltar muito para conseguir o prémio. Jorge achava-se o maior arquitecto do mundo, mas era só um pedreiro muito bem pago, com uma equipa que lhe dava todas as condições para chegarem juntos ao Nobel. 'Nada disso', disse Jorge - 'Eu sou o melhor'. E bateu com a porta quando só faltavam terminar os arruamentos. Consta que aceitou uma pipa de massa para ir salvar unicórnios para a Atlântida. A Catedral, essa, continua linda."
Ricardo Santos, in O Benfica
Sem comentários:
Enviar um comentário
A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!