"Excelentíssimas pessoas com as quais marco compromissos, saibam que, nestes últimos tempos, nunca cheguei à hora combinada a nenhum dos eventos agendados. Na realidade, cheguei cinco horas adiantado. Sugiro assim que, por uma questão de empatia, comecemos a perguntar aos noctívagos em que fuso horário pensam eles. Da minha parte, para referência futura, aqui fica a indicação: no fuso horário do Massachusetts.
A razão tem 2,13m. Um motivo de força maior, portanto. Ver os jogos dos Boston Celtics em direto implica ter de esfregar repelente contra as picadas do sono, mas, passado uns dias, a mente habitua-se a estar a 300 minutos de distância do corpo. Quanto à produtividade? Até aumenta, visto que as horas de sono são substituídas pelas atividades que preenchem os 14 descontos de tempo. São adaptações à rotina que se justificam.
Neemias Queta anda a praticar o basquetebol mais entusiasmante da carreira e está a viver o sonho da maneira plena que já merecia. Em certas fases, os portugueses fizeram o esforço coletivo para se pronunciarem com uma falsa imparcialidade. Neste momento, já ninguém na NBA duvida que as reclamações feitas às escassas oportunidades dadas ao Gigante do Vale da Amoreira não eram mera proteção a um compatriota.
O arranque da NBA não é levado muito a sério pela maioria das equipas. No entanto, os Boston Celtics estão num ponto em que têm de lutar por todas as migalhas. As restrições financeiras forçaram um emagrecimento do plantel, substancialmente diferente daquele que foi campeão em 2024. Se tem sido possível manter alguma competitividade depois das saídas de Jrue Holiday, Kristaps Porzingis, Al Horford e Luke Kornet, certamente que a erupção de Neemias está relacionada.
O poste foi titular nos primeiros dez jogos dos Celtics. A inédita utilização (23,6 minutos por jogo) teria o efeito natural de dilatar as estatísticas e, de facto, o jogador de 26 anos leva máximos de carreira em ressaltos (8,1), assistências (1,7), roubos de bola (0,9), desarmes de lançamento (1,4) e pontos (8,7). Esta época, já conseguiu tantos duplos-duplos (2) como nas quatro épocas anteriores (2).
O aumento do tempo em quadra, para muitos, podia ser uma aterradora maneira de evidenciar defeitos. De Neemias Queta já sabemos com o que contar. Não sendo o protótipo de jogador perfeito, é eficiente no aproveitamento das ferramentas que tem. Agarremos na estatística avançada pela qual se guia a liga norte-americana.
Após os primeiros dez jogos da época, o português registou um defensive rating de 98,2 e, no site da NBA, surgiu como líder desta estatística que estima a quantidade de pontos que uma equipa sofre quando um determinado jogador está em campo por 100 posses de bola. A diferença entre pontos marcados e sofridos dos Celtics é de +82 quando Neemias está no soalho e de -59 sem ele. Indispensável? Talvez.
Quando a Tribuna Expresso o entrevistou, durante a offseason, Neemias Queta mostrava-se otimista com as promessas de maior protagonismo deixadas por Brad Stevens. Porém, notava-se na linguagem corporal que precisava de as ver concretizadas antes de proceder aos agradecimentos. Ser estrela no EuroBasket, ao serviço de Portugal, trouxe-lhe um pingo (só mesmo um pingo) de arrogância saudável que o fez regressar aos Estados Unidos sem que a NBA o pudesse menosprezar. De qualquer forma, sempre que entra em campo, não dá para ignorar uma história de vida com tantas dificuldades que parece impossível tudo ter corrido pelo melhor.
Para os fãs da NBA em Portugal, cada afundanço de Neemias Queta é um ponto de exclamação num conselho deixado já faz tempo: “Nós avisámos!”"

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