"A Confederação do Desporto de Portugal (CDP), com a colaboração da TELLES e do consultor externo Ricardo Morgado, apresentou recentemente uma proposta alargada de reforma fiscal para o setor desportivo, que volta a colocar em cima da mesa uma questão antiga, mas ainda por resolver: o regime do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) aplicável à entrada em eventos desportivos.
Até ao Orçamento do Estado para 2012, a entrada em espetáculos, provas e manifestações desportivas beneficiava da aplicação da taxa reduzida de IVA, à semelhança do que atualmente sucede com muitos eventos culturais. Contudo, essa realidade foi alterada há mais de uma década, passando o acesso aos eventos desportivos a ser tributado à taxa normal. O resultado é um paradoxo difícil de justificar: na ótica do consumidor final, assistir a um concerto, a uma peça de teatro ou a uma exposição de arte é fiscalmente mais vantajoso do que assistir a uma competição desportiva.
A Diretiva IVA possibilita que os Estados-membros da União Europeia (UE) sujeitem à aplicação da taxa reduzida de imposto o acesso a diversos eventos de índole cultural, bem como as entradas em eventos desportivos. No quadro legal vigente, o Código do IVA prevê isenções e taxas reduzidas para um vasto conjunto de atividades culturais e recreativas, reconhecendo a sua relevância social e o interesse público que lhes está associado. No entanto, o desporto, que partilha a mesma função social, educativa e cultural, não beneficia deste enquadramento. Esta discrepância penaliza não apenas os espectadores, mas também clubes, sociedades desportivas, promotores e profissionais cuja atividade depende de um setor desportivo economicamente fortalecido.
A proposta apresentada pela CDP visa corrigir esta incoerência, propondo a aplicação da taxa reduzida de IVA no acesso a competições desportivas. Não se trata de um mero privilégio fiscal, mas sim de uma medida de justiça fiscal, que reconhece o papel essencial do desporto na sociedade e o seu contributo para a saúde pública, para a coesão social, para a educação e para o desenvolvimento económico local.
A Comissão Europeia, no seu Livro Branco sobre o Desporto, sublinha precisamente esta dimensão social e cultural, reconhecendo o desporto como um bem de interesse geral. A experiência de vários Estados-Membros da UE confirma que a aplicação de uma taxa reduzida de IVA no acesso a competições desportivas é não só possível, como desejável. Em países como a França, a Espanha ou a Bélgica, o desporto é tratado fiscalmente de forma semelhante à cultura, em linha com políticas públicas que procuram incentivar a participação e o acesso mais amplo da população.
Em Portugal, a manutenção da taxa normal de IVA no acesso a eventos desportivos representa um obstáculo ao acesso do público, encarece o preço dos bilhetes e limita o crescimento das assistências, penalizando um setor que tem um reconhecido impacto positivo na economia e na imagem do país. Além disso, a elevada carga fiscal incidente sobre o consumidor de eventos desportivos pode comprometer investimentos em infraestruturas e formação de atletas, afetando a sustentabilidade do setor.
É importante recordar que o direito ao desporto está consagrado na Constituição da República Portuguesa, que impõe ao Estado o dever de promover, estimular e apoiar a sua prática e difusão, enquadrando o desporto na categoria mais ampla dos direitos e deveres culturais. Não parece, por isso, coerente que a legislação ordinária em sede de IVA tribute a fruição de eventos desportivos de forma mais gravosa do que a fruição de eventos culturais.
A aplicação de uma taxa reduzida de IVA aos eventos desportivos deverá permitir, a médio prazo, reduzir o preço final ao consumidor, aumentar a participação e reforçar os benefícios sociais e de saúde pública. Trata-se de uma medida fiscal justa e socialmente responsável, capaz de criar um ciclo virtuoso: maior acessibilidade, mais prática desportiva, mais saúde, mais coesão social e um estímulo económico sustentado ao setor.
O desporto é cultura, educação, saúde e comunidade. Deve, por isso, ser equiparado a estes valores também no plano fiscal. A reforma proposta pela Confederação do Desporto de Portugal não é apenas uma questão técnica, é uma questão de coerência política e visão estratégica. Reconhecer o desporto como um bem de interesse geral é dar-lhe o estatuto que merece no ordenamento jurídico e na vida coletiva do país. Esta medida coloca Portugal em sintonia com boas práticas internacionais, reforçando o reconhecimento do desporto como motor de desenvolvimento social, económico e cultural."

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