"No próximo dia 25 de outubro, os sócios do Benfica vão às urnas para escolher os novos órgãos sociais. A ocasião deveria constituir o expoente máximo de afirmação da democracia interna do clube. Porém, o caminho até ao sufrágio está marcado por uma incerteza jurídica que não deve ser ignorada.
Para a legítima realização das eleições, impõem os Estatutos do clube (artigos 48.º e 96.º) a observância do regulamento eleitoral aprovado para o efeito, enquanto instrumento normativo que concretiza as condições do sufrágio e assegura a validade do ato eleitoral.
Sucede que, na Assembleia Geral realizada no passado sábado, 27 de setembro, destinada a aprovar o novo regulamento eleitoral, o resultado foi inequívoco: 69,86 por cento dos sócios rejeitaram a proposta apresentada.
Posto isto, convocados para votar a 25 de outubro, os sócios do Benfica enfrentam uma pergunta essencial: quais são afinal as regras do jogo?
E, nesta senda, a Mesa da Assembleia Geral (MAG) veio anunciar que estas eleições serão reguladas pelos estatutos do clube e pelas normas não revogadas do regulamento eleitoral de 2021.
Ora, os Estatutos do clube (aprovados a 8 de março deste ano e que entraram em vigor com a convocatória para a Assembleia Geral Eleitoral, divulgada no passado dia 30 de setembro) impõem expressamente (artigo 48.º) que as eleições para os órgãos sociais do clube se regem segundo o disposto em regulamento eleitoral, a aprovar em Assembleia Geral, sob proposta da direção.
Importa, por isso, recordar a origem deste regulamento eleitoral, cujas normas regularão o ato eleitoral de 25 de outubro, conforme comunicado pela MAG.
E, aqui chegados, verifica-se que o regulamento eleitoral de 2021 não nasceu de uma aprovação em Assembleia Geral, como impõem os estatutos já em vigor. Resultou de um diálogo entre a Direção, a MAG e o movimento «Servir o Benfica», criado com carácter transitório para as eleições de outubro desse ano e com o entendimento de que os futuros órgãos sociais decidissem sobre a necessidade de um novo regulamento para aprovação da Assembleia Geral. Passo esse que não se concretizou, já que a proposta do novo regulamento eleitoral foi reprovada na Assembleia Geral de 27 de setembro.
Ora, recorrer ao regulamento de 2021 agora, sem que este tenha sido aprovado em Assembleia Geral, significa ignorar o que está expressamente previsto nos estatutos em vigor. O Benfica avança assim para um ato eleitoral com regras de um regulamento que não passaram pelo crivo da Assembleia Geral, podendo colocar em causa a legitimidade e a segurança jurídica do processo.
Assim, salvo melhor opinião, a decisão da MAG em aplicar o regulamento eleitoral de 2021 pode resolver o vazio imediato, mas não elimina a fragilidade institucional que se instala quando, tudo o que não estiver explícito nos estatutos, depende de um regulamento eleitoral que não foi aprovado em consonância com o que determinam as normas estatutárias.
Parece-nos, portanto, que as consequências são evidentes: eleições realizadas nestes termos ficam, naturalmente, vulneráveis a contestações ou impugnações. O vencedor arrisca-se a carregar o ónus de ter sido eleito sob regras não legitimadas pelos sócios, o que compromete não só a credibilidade do resultado, mas também a coesão que deveria emergir das urnas.
E, neste sentido, salvo melhor opinião, não basta à Mesa da Assembleia Geral informar que assegura que as eleições serão «regulares, lícitas, transparentes e auditáveis». Continua a existir uma questão central que subsiste e deveria ser acautelada: existe legitimidade no processo eleitoral anunciado?
Estamos em crer que a transparência formal que se pretende assegurar, não substitui a necessidade legal de aprovação do regulamento eleitoral em Assembleia Geral.
Certo é que se os candidatos optarem por não reagir nem assumir uma posição clara antes das eleições, parece inevitável concluir que «vão a jogo» a aceitar, sem reservas, as regras que agora são impostas. Caso contrário, qualquer contestação após o sufrágio soará a uma conveniente desculpa de «mau perdedor».
Em conclusão, o ato eleitoral em causa, apresentado como a expressão máxima da democracia de um clube, vê-se agora envolto em incerteza normativa, com a sua credibilidade fragilizada e podendo vir a levantar dúvidas quanto à validade e ao reconhecimento dos futuros órgãos sociais."

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