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quinta-feira, 3 de julho de 2025

Villas-Boas gosta de jogar à roleta


"André Villas-Boas parece estar fixado num único tipo de perfil de treinador. Apostar em Farioli, que carrega uma imagem de derrota, é uma decisão demasiadamente arrojada. E arriscada

Um dos traços mais marcantes da presidência de Pinto da Costa foi indiscutivelmente o sentido apurado na escolha de treinadores. Nos nomes, nos momentos certos das respetivas carreiras e uma durabilidade no cargo que correspondia a um padrão: dois anos em média e depois algumas exceções, a última delas personificada em Sérgio Conceição. Antigamente chamava-se faro a esta capacidade que tem muito a ver com a intuição, algo que não se aprende; nasce-se, logo, é uma singularidade ao alcance de poucos.
Foi assim, aliás, na escolha de André Villas-Boas para a «cadeira de sonho»: um jovem e promissor treinador que aprendera com Mourinho e no pouco tempo em que esteve na Académica mostrou tudo o que era preciso para outros voos. Assim foi: em 2010/11 o FC Porto foi arrasador em todos os sentidos, de tal modo que no ano AVB faria o mesmo trajeto que o seu mentor fizera sete anos antes, ao trocar o Dragão por Stamford Bridge.
Percebe-se que o Villas-Boas presidente tenta seguir os mesmos passos do antecessor: escolhas arrojadas, mas entendíveis: o adjunto que conhecia a casa e reuniria condições para se emancipar (Vítor Bruno, tal como aconteceu a Vítor Pereira, ex-adjunto de… Villas-Boas); um argentino com pinta de marcar a diferença e produto da melhor escola de treinadores da América do Sul (Martín Anselmi) e agora um daqueles técnicos da moda, que nem o rótulo de derrota estampado na testa põe em causa as esperanças de um novo despertar (Francesco Farioli).
A questão é que Villas-Boas parece estar fixado num único perfil de treinador, quando a história do FC Porto mostra que a cada experimentalismo (que os houve, geralmente com sucesso) seguiu-se sempre uma opção mais conservadora, fosse na personalidade ou mesmo na idade. Até nos momentos de maior glória, Pinto da Costa procurou a diferença nos estilos e na forma de comandar no que toca à substituição de treinadores, sabendo como funcionam os balneários e a necessidade de abanar as dinâmicas de grupo: o estouvado Tomislav Ivic a seguir ao cirúrgico Artur Jorge; o pedagogo Jesualdo Ferreira depois do conflituoso Co Adriaanse e por aí fora — falhou redondamente, no entanto, na tentativa de mudar o paradigma após a saída de José Mourinho, ao trazer o italiano Luigi Delneri que nem bom dia sabia dizer em português.
Villas-Boas correria um risco fosse quem fosse o sucessor de Martín Anselmi, mas ao colocar as fichas novamente num jovem estrangeiro que pouco conhece o futebol luso é gostar de jogar à roleta. Porque além das vicissitudes próprias do nossa liga há a memória recente de um campeonato perdido pelo Ajax para o PSV cujo dramatismo é dez vezes superior ao que aconteceu a Sérgio Conceição ou Bruno Lage quando perderam o primeiro lugar depois de vantagens confortáveis.
Não tenhamos dúvidas: ao mínimo deslize, as lágrimas de Farioli naquele último jogo em Amesterdão vão ser aproveitadas até à exaustão pelos rivais do FC Porto, num processo de desgaste de imagem do qual o italiano não tem qualquer culpa.
Dirão os mais otimistas que os bons resultados fazem esquecer as más memórias e esta aura de fragilidade, mas para que as vitórias em série apareçam é preciso haver condições circunstanciais e estruturais que o favoreçam. E todos sabemos que isso hoje está bem longe de acontecer."

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