Últimas indefectivações

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Construir o amanhã do rugby


"Terminada a janela dos Autumn Internationals, ficou definido o ranking World Rugby que servirá de base para o sorteio de grupos do próximo Mundial. Para Portugal, esta janela incluiu três jogos, embora apenas o jogo frente ao Uruguai tivesse impacto na classificação da Seleção. A derrota por 8-26 refletiu a imagem actual do rugby português: ausência de estratégia clara, plano de jogo pouco coerente, bancadas com pouco público e opções de jogadores que geraram dúvidas. Os dois jogos seguintes, diante de Hong Kong e Canadá, terminaram com boas exibições e vitórias, evidenciando que existe talento e qualidade.
Nas últimas semanas, o rugby português recebeu três boas notícias que podem levar a uma nova fase de desenvolvimento. Desenvolvimento esse que terá obrigatoriamente de ser mais estruturado, mais exigente e, sobretudo, mais profissional.

1. O Plano Nacional para o Desporto, apresentado pelo Governo é um sinal político decisivo e inclui 44 medidas para «aumentar a prática desportiva, combater desigualdades e modernizar o sistema desportivo nacional». Destaco as seis mais relevantes para o rugby português.
— €3,5M destinados ao Centro de Alto Rendimento de Rugby. Um investimento estruturante que permitirá qualificar as condições de treino e servir de casa para os jogos da Seleção Nacional, evitando ter de jogar no Campo de Honra do Estádio Nacional.
— A disponibilização de verbas para a contratação de profissionais qualificados. Permitirá à Federação Portuguesa de Rugby (FPR) dotar-se de uma equipa de gestão mais experiente e especializada. Esta profissionalização é indispensável numa modalidade que se quer mais competitiva quer interna quer internacionalmente.
— O alargamento da Unidade de Apoio ao Alto Rendimento na Escola ao ensino superior, procurando garantir que os jogadores possam prosseguir os estudos enquanto são atletas de alta competição. Esta medida é uma necessidade real e urgente do rugby português, cujas condições não permitem a dedicação exclusiva dos jogadores e a profissionalização a 100% não deve ser uma opção no curto/médio prazo. Ideal seria ainda estender, abrangendo o apoio à conciliação com atividades profissionais.
— A revisão do modelo de oferta desportiva e do modelo competitivo no Desporto Escolar. Esta decisão abre uma oportunidade estratégica para o rugby, ainda que numa primeira fase, se necessário, através de touch rugby, mais simples e acessível de implementar. Esta inclusão permitiria aumentar o recrutamento, expandindo o contacto inicial com a modalidade e promovendo a sua divulgação. Teria também efeitos positivos no financiamento da FPR, já que uma parte relevante do seu orçamento depende diretamente do número de atletas inscritos, através dos apoios IPDJ.
— Reforçar os programas de bolsas de preparação para esperanças olímpicas no ciclo de Los Angeles-2028. Com este reforço, a FPR poderá dispor de maior capacidade financeira para investir na equipa de Sevens, ficando nas suas mãos a decisão de criar uma estrutura dedicada exclusivamente à preparação olímpica, com o objetivo ambicioso e histórico de conquistar a primeira presença nos JO. A autonomização dos Sevens tem sido um tema debatido no rugby nacional e a verdade é que um plano específico, estável e focado exclusivamente nesta vertente poderá trazer benefícios significativos na performance desportiva.
— O apoio a clubes e associações que pretendam criar ou ampliar a oferta de prática desportiva feminina. Num ano em que o Campeonato do Mundo de rugby feminino superou as expectativas, torna-se evidente que a modalidade atravessa uma fase de crescimento global. Portugal não deve perder a oportunidade de dar um passo na construção de um projeto estruturado para o rugby feminino, apostando na formação, no desenvolvimento competitivo e na criação de condições que permitam às jogadoras progressão real na modalidade.
Acredito que estas medidas, em conjunto, representam a possibilidade de um salto organizativo e competitivo sustentável.

2. As novas regras de player welfare. A World Rugby apresentou recentemente as novas regras de proteção do bem-estar dos jogadores. As medidas mais relevantes são o número máximo de jogos anuais por atleta (30), a obrigatoriedade de sete semanas de descanso e novas práticas e controlos de carga física e recuperação. Estas mudanças terão impacto direto no rugby português. Não se trata apenas de adaptar calendários; trata-se de rever modelos, estruturas competitivas, processos de treino e mais importante ainda a relação entre clubes, Seleção, Federação e jogadores. O cumprimento destas normas vai obrigar o rugby português a colocar-se num patamar de exigência que nunca foi discutido.

3. A nova World Rugby Nations Cup, oferece à Seleção Nacional a possibilidade de disputar mais seis jogos de alto nível por ano, além dos cinco do Rugby Europe Championship. Esta competição permite uma maior exposição dos jogadores ao alto rendimento e um calendário competitivo alinhado com as melhores nações emergentes. Mas exige infraestruturas, preparação avançada, planeamento anual rigoroso e a organização profissionalizada que defendo.

Três sinais, um caminho
Estas notícias podem representar um ponto de viragem para o rugby português. O desafio é transformar esta oportunidade em crescimento sustentável. Para isso, será necessária visão, competência e capacidade de execução. Se a FPR conseguir alinhar os clubes, jogadores e dirigentes com as exigências do novo contexto internacional, o rugby terá condições para deixar de viver apenas de momentos inspirados e passar a construir um projeto sólido, contínuo e ambicioso e tornar-se um desporto de referência a nível nacional.
O futuro pode estar a mudar. Cabe-nos garantir que esta mudança se transforma em desenvolvimento real — dentro e fora do campo.
Uma última palavra para a excelente vitória da seleção de sub-20 no Rugby European Championship. Ainda que não seja um verdadeiro Campeonato da Europa, não podemos tirar o grande mérito nesta segunda vitoria consecutiva num torneio europeu sob alçada da Rugby Europe."

Sem comentários:

Enviar um comentário

A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!