"A aproximação ao dérbi foi exaustivamente comentada e todas as possibilidades imaginadas. Muitas contas feitas e cenários traçados ao detalhe. A grande expectativa, o nervosismo geral e a tensão acumulada eram enormes, talvez como nunca, nos dias que antecederam aquele que poderia ter sido o jogo do título.
Para quem partia atrás para o jogo do ano, marcar primeiro era quase obrigatório. Ao contrário do desejado, o golo inaugural adversário acabaria por ser um verdadeiro rombo na estrutura moral da equipa do Benfica, que procurava iniciar a recuperação. Pior cenário não se imaginava e logo a abrir. De repente, a necessidade absoluta de marcar pelo menos um golo passava a dois. As dificuldades eram, assim, logo dobradas, ampliando as dúvidas e projetando um teste muito duro, mas que viria a ser discutido até final. Di María, a dúvida que persistia quanto ao onze, regressava, acrescentando valor de um jogador especial, mas também envolto na dúvida se estaria realmente preparado para o grande embate.
Com a atitude competitiva de sempre, mesmo depois de algumas semanas ausente, foi, ainda assim, um jogador muito ativo enquanto jogou e que ameaçava poder fazer a diferença. No primeiro tempo, os dois remates mais perto do golo são da sua autoria. António Silva, outro dos visados, correspondeu à responsabilidade que sobre ele recaía face ao temível adversário direto. No golo que cedo condicionou o jogo, o avançado sueco atraiu as atenções principais para si, mas soltou para Trincão, que beneficiou de uma deficiente cobertura do espaço central, mesmo com superioridade numérica da defesa. À quantidade não correspondeu a qualidade posicional de preenchimento do espaço defensivo.
Este foi dos jogos em que um início desastroso acaba por condicionar o jogo inteiro. O Benfica sentiu, claramente, a gravidade do momento e mostrou-se precipitado, apressado, preocupado. As ações eram individualizadas e as perdas de bola frequentes. A resposta mais racional e coletiva demoraria a chegar. Mesmo visivelmente afetada pelo golo, a equipa forçou o domínio, mas esbarrando num adversário já reunido atrás, com destaque para o seu trio central defensivo e para Hjulmand, pilar absoluto do meio-campo.
As bolas paradas representam, principalmente em jogos mais fechados, importância especial que decide muitos jogos. Esta arma, da qual o Benfica vinha tirando frequente proveito, não funcionou como vantagem desta vez, também resultado da estatura superior dos defesas do rival. Do banco vieram Schjelderup e Belotti, principalmente estes, que mexeram com a equipa, e o Benfica forçava, ameaçando conseguir a desejada vantagem. A urgência crescia e a tensão também, provocada por faltas e interrupções sucessivas que travavam a fase decisiva do jogo.
Foi um jogo mais combatido que jogado e, com o decorrer do tempo, cada vez mais frequentemente interrompido. O golo de Akturkoglu, servido principescamente por Pavlidis, reavivou a chama, mas também reforçou o antijogo adversário e o alinhamento passivo do árbitro. O intenso desgaste do momento acabou por prevalecer, não premiando quem fez por ganhar.
Factos
Voltando a Di María, no rescaldo do clássico, tenho percebido algumas teorias e opiniões várias sobre a sua substituição. Será que fui o único a vê-lo levar a mão à coxa e logo depois alongar o músculo em causa, pouco antes do intervalo? Quanto a mim, confesso que o meu palpite antes do clássico apontava para a decisão do campeonato na derradeira jornada. Reconheço, no entanto, que esperava que o Benfica chegasse ao último dia a precisar só de empatar e sem depender de terceiros. As probabilidades diminuíram, todos o sabem, mas existem. Aconteça o que acontecer, impõe-se agora uma vitória em Braga.
Classe
Rui Borges é alguém que, como por exemplo, Luís Freire, seu próximo adversário, começou como treinador nos escalões mais baixos e subiu pelos resultados que foi alcançando. Estes dois casos, como alguns outros (não muitos), pertencem a histórias onde o verdadeiro mérito fala mais alto, sendo mostrado e confirmado no decorrer do tempo. Porém, como antigo jogador não pode ignorar uma responsabilidade moral acrescida.
Não se pode dizer que seja inédito, mas foi de profundo mau gosto o que publicamente declarou, em referência ao rendimento de jogadores de outras equipas, insinuando supostas diferenças de atitude. Desrespeita a classe a que pertence. Haveria ainda de repetir o excesso, então relativamente à gestão disciplinar dos jogadores do Vitória, atletas que ainda há pouco treinava. Treinador que foi jogador, mesmo que humilde, deve sempre manter o respeito pelo que foi e pelo que é.
Ter a responsabilidade de representar uma classe, cuja atividade é exigente e obriga a frequentes declarações públicas, pede especial contenção no discurso e o respeito pelos outros deve prevalecer, sempre."