Últimas indefectivações

quarta-feira, 7 de julho de 2021

Comunicado da Direção...


"A Direção do Sport Lisboa e Benfica esteve reunida esta tarde, a fim de analisar a situação decorrente da investigação de que é alvo pelas autoridades judiciais o Presidente Luís Filipe Vieira.
Todos os membros da Direção estão firmemente determinados a defender sem qualquer reserva, de forma coesa e como lhes compete, os interesses do Clube, que, esclarece-se, não é objeto da investigação.
Nessa medida, empenhar-se-ão em dar plena colaboração às entidades competentes, no sentido de apurar a verdade até às últimas consequências.
A Direção garante aos sócios e simpatizantes que a ambição, competitividade e gestão do Clube se encontram asseguradas, no respeito e em observância das normas regulamentares estabelecidas nos estatutos."

João Mário – Al Musrati


"Depois de bem cedo se ter percebido que o meio campo do Benfica da temporada passada não tinha a competência necessária para somente com dois elementos carregar o jogo defensivo, transformando-o em ofensivo, a equipa encarnada parece ter percebido lacunas e prepara-se para mudar as peças do seu mal fadado sector.
Mas, casará João Mário com Al Musrati?
Não poderia ter o Benfica melhor dupla. E se no passado recente Palhinha – João Mário formaram a melhor dupla de médios da Liga, Al Musrati – João Mário têm condições para juntos serem o melhor meio campo da Liga NOS 2021 – 2022.
O líbio é o jogador perfeito para qualquer meio campo do futebol português. Passada larga, imponência no duelo, muito forte quer na pressão pós perda que determina tantas vezes a capacidade para se dominar jogos, quer na recuperação defensiva – E tanto que os clubes grandes precisam de quem chegue rápido atrás para defender contra ataque, mas também uma qualidade inolvidável em posse. Recebe sempre bem, e por isso encontra saídas fáceis da pressão, enfrente quem enfrentar. Assume construção e liga o jogo ofensivo com tremenda qualidade. É o tal médio completo – Porque defende e ataca, porque se impõe em todos os momentos e fases do jogo – que o Benfica tanto precisa.
João Mário é o par ideal. O oito, que surge entre linhas para desequilibrar as estruturas adversárias quando estas mais se fecham.
Surge mais alto pausando o jogo, não perdendo a posse, procurando melhores caminhos e dando fluidez ao jogo! O jogo precisa de quem não perca a posse, que faça o ataque posicional ter sentido, critério. Não é o homem do último passe, mas demasiadas vezes é o homem do penúltimo passe. Quem com a sua qualidade, pausa e decisão alimenta o homem que assiste. E difere de todos os oitos encarnados pela competência que também trará no meio campo defensivo. É agressivo, veloz e reactivo na perda. Não tem os traços defensivos do seu possível parceiro de sector, mas é seguramente bastante mais completo que qualquer outra opção.
A chave do ataque posicional, o homem do penúltimo passe:



Com Al Musrati – João Mário, o Benfica terá finalmente capacidade para ter mais jogo em ataque posicional, porque joga e porque não deixa jogar os adversários, e com isso mais condições, mais lances para que a sua frente de ataque possa fazer a diferença.
O centro de todo o jogo reside na capacidade ofensiva e defensiva do sector intermédio e o Benfica poderá dar o salto qualitativo que tanto procura se conseguir juntar os dois médios no mesmo 11. "

Leonor...

Contas...

105x68...

Treino...

Circuito!


"2020 - Portimonense SC "compra" o jogador.
2020 - Portimonense SC "empresta" o jogador.
2021 - FC Porto compra o jogador por 2,5M em fim de contrato.
Tudo isto em ano e meio. Gozam com isto tudo!
CC Liga Portugal @AnaMartinsGomes @PJudiciaria"

Benfica After 90 - Pre-Season...

Análise: João Mário...

Tiago Brito...

Modalidades #54 - Semanada...

O fim da minha infância futebolística


"A 5 de julho 1982, no Estádio Sarriá, o futebol mudou para sempre, e todos mudámos um pouco com ele: nunca mais ninguém jogou um jogo tão puro e tão artístico como aquele Brasil.

Eu tinha 11 anos, e naquele verão quente os nossos jogos, na calçada da Praceta de Sofala, no bairro da Figueirinha, em Oeiras, conheceram outros protagonistas. Subitamente, ninguém era mais Carlos Manuel, Jordão ou Chalana.
Todos queriam ser Zico. Sócrates. Junior. Falcão. Éder. Não me lembro de alguém querer ser Serginho ou Valdir Peres.
Todos os jogos eram uma espécie de Maracanã, de miúdos que nunca tinham ido ao Brasil, a não ser nas novelas da Globo.
Tínhamos visto, justamente na televisão, aquele Brasil bater um frágil Portugal por 3-1, em maio, em S. Luis do Maranhão. Depois a selecção brasileira tinha treinado no Estádio Nacional e na Luz, antes de ir para Espanha. Habituámo-nos às suas caras, nas páginas gigantescas do jornal A Bola, apaixonámo-nos pelo seu jeito brincalhão nas entrevistas. Vimos os desenhos animados do Naranjito e decidimos: «Vamos ser do Brasil!»
Até porque, nessa altura, a ideia de uma seleção portuguesa ir a um Mundial era tão verosímil como a ideia de Portugal fazer um foguetão e chegar a Plutão.
E depois o carrossel começou a andar, em Sevilha, Mundial dentro: 2-1 à URSS (os golos de Sócrates e Éder são poemas), goleadas à Escócia e Nova Zelândia, e, já em Barcelona, a campeã em título Argentina varrida por 3-1 e Maradona expulso, de cabeça perdida, no meio daquele ciclone de futebol bonito, toques de calcanhar, fintas de circo. Jogar como se fossem miúdos na praceta, uma malandrice vestida de azul e amarelo.
Perder com a Itália? Só por piada. Para mim, que tinha 11 anos e a visão linear que se tem do Futebol aos 11 anos, era evidente: os italianos não ganharam nem um jogo da primeira fase, com Polónia, Camarões e Perú, vão ganhar à equipa do futebol bonito?
Mas foi.
Lembro-me que chorei, no fim do jogo. Estava em choque. O empate teria bastado.
Um lance, em particular, bailava na minha mente, ressentida e amuada, com o golpe sofrido: Óscar sobe à área, cabeceia, Zoff faz a melhor defesa da sua carreira (diria o veterano guardião, anos mais tarde) e segura a bola, junto ao poste, em cima da linha.
Parecia-me criminoso, o Brasil estar fora do Mundial. Paolo Rossi? Nunca tinha ouvido falar.
Mas haveria de saber, muitos anos mais tarde, o que pensou aquele anti Cristo número 20 dos italianos, na sua mais gloriosa tarde.
«Sabíamos estar perante uma das melhores equipas de todos os tempos. Eu tinha visto os seus jogos e eles pareciam marcianos. Jogavam e memória, podiam jogar de olhos vendados, de tal maneira era perfeito o entendimento entre eles. Mas nenhuma equipa é invencível. E naquele dia encontraram uma seleção italiana particularmente inspirada. Nada nem ninguém pararia os 11 mosqueteiros azzurri», escreveu Paolo Rossi, no prefácio do livro de Paulo Roberto Falcão, «Brasil, o time que perdeu a copa e conquistou o mundo».
Sou tão marcado por este jogo, que procuro tudo o que me possa explicar com mais e mais profundidade o que aconteceu ali. A criança que eu era nunca se conformou. Ela e eu sabemos bem que aquilo não teve explicação. Nem há justificação. É crime.
Ora o livro é a radiografia desse Mundial 82 feito pelo extraordinário médio brasileiro da Roma. Falcão escrevia crónicas diárias, que enviava de Espanha para a Folha da Tarde, jornal de Porto Alegre.
Na manhã seguinte ao jogo de Sarriá, os leitores de Falcão leram as sofridas palavras escritas pelo número 15 daquele escrete.
«Terminado o jogo, ninguém falava. O Júnior ainda tentou animar a gente, falando, meio com raiva, que apesar da derrota tínhamos de lembrar que fomos a melhor equipa da Copa. Mas quase ninguém ouviu direito. A viagem de ónibus também foi silenciosa e na concentração foi ainda pior.»
O livro foi publicado em 2012, 30 anos depois do jogo. E Falcão foi perguntar aos colegas de equipa, 30 anos depois, a pergunta que, acredito, baila no espirito de milhões de pessoas, a quem este jogo marcou como nenhum outro:
«Porque perdemos?»
Valdir Peres diz que foi porque a Itália esteve sempre na frente do marcador. Que o Brasil, marcando primeiro, não perderia nunca. Leandro fala em erros próprios. Luisinho diz que foi falta de humildade. Éder considera que foi um «aborto da natureza». «Demos um vacilo e a Itália aproveitou», referiu. Junior confessa, com graça, que nunca encontrou resposta para essa pergunta. Zico foi pragmático: «A Itália foi melhor.»
Deve ter sido. Foi, mas como?
Olhemos a estatística do jogo.

                      Brasil Itália
Faltas                 18 20
Passes Errados   40 31
Remates à baliza 7 5
Ataques               23 6

Cínicos.
Gentille foi tudo menos isso e o árbitro deixou. Eu agarrei-me a tiradas assim, esperando que uma intervenção divina pusesse a mão na consciência e fizesse o tempo voltar atrás, para repor a justiça. E a infância nos fosse devolvida.
Porque, naquele dia, acabou a minha infância futebolística. As 44 mil pessoas que encheram o Estádio Sarriá, devidamente demolido, anos mais tarde, não sei se tiveram noção de que, em cada um deles, algo teria igualmente mudado, para sempre, no seu entendimento do jogo.
Nunca mais ninguém jogaria tão puro. Futebol sem sombras nem medos. E com arte.
As vezes que já procurei na net por uma camisola daquelas, Topper, símbolo do café do Brasil metido no escudo da CFB. Até já escrevi à marca. Não há. Virou mito, aquela camisa amarela.
Até o árbitro do jogo, o israelita Abraham Klein, refere que percebeu logo, quando o jogo acabou, que tinha feito parte de um encontro para a história. Diz que Sócrates o cumprimentou , sem nada dizer, de olhos cheios de lágrimas, a caminho dos balneários, no final do jogo. E que nunca se esqueceu dessa imagem.
Brasil - Itália, 1982. Que tragédia.
No final do seu livro, Falcão decide responder à tal pergunta; porque perdemos?
E eu adoro essa resposta, é a melhor de todas. Porque consegue apaziguar aquele Pedro de 11 anos. Falcão diz que ganhámos. «Aquele Brasil de 82 foi um campeão do encantamento.»
E foi. E é, para sempre. Uma equipa para todas as idades que tivemos e teremos. E mesmo depois. Não me lembro de nenhuma outra equipa com esse poder.
Ganhámos. Faz a festa, torcida brasileira! Afinal, ganhámos."

Certa vez um certo príncipe...


"Cerca de quinze dias depois de ter subido ao trono, Carol seguiu com a Roménia para o Mundial do Uruguai

Durante a fase da adolescência, Carol Caraiman de Hohenzollern-Sigmaringen foi, como todos os meninos ricos, uma fonte de preocupação para o pai. Passava tardes inteiras a catalogar os selos da sua enorme coleção e o resto do dia e da noite na boémia com os amigos, à caça de mulheres, raramente regressando a casa sem trazer consigo uma daquelas bebedeiras que parecem morder como uma cadela nos calcanhares. Como filho do rei Ferdinand da Roménia, estes excessos eram-lhe admitidos, mas ninguém acreditava que viesse ser um sucessor de jeito. A entrada na idade adulta tornou-o ainda mais desvairado por tudo o que fosse um rabo de saias. De tal forma que, durante a I Grande Guerra, mandou a tropa às malvas e desertou para se casar em segredo com Zizi Lambrino, uma moça de boas famílias com a qual teve um filho, Mircea Gregor Carol Lambrino. Por muito boa que fosse a família Lambrino, Ferdinand foi aos arames e mandou encerrar o filho no Mosteiro de Bistrita durante exatamente setenta e cinco dias. Basicamente não teve de se preocupar muito. A despeito de ter tido tempo para ser mãe, Zizi foi despachada da Roménia e o casamento formalmente anulado de forma que, no ano seguinte, enquanto viajava, como príncipe que era, em redor do mundo, Carol apaixonou-se pela rapariga certa, a princesa Helena da Grécia e da Dinamarca, filha do rei Constantino I da Grécia. Em 1921 estavam casados e trataram também de conceber rapidamente o pequeno príncipe Michael, candidato a futuro eleito do trono não fora o caso de os romenos terem decidido que queriam antes uma República forçando a abdicação de Carol em 1940, precisamente dez anos após ter sido elevado a monarca. Pelo caminho tinha feito todos os possíveis para ser impedido de se tornar rei, algo que abona a favor da sua visão de futuro. Sobretudo dedicar-se com convicção a uma amante chamada Elena Lupescu, mais tarde conhecida por Magda, um nome que em romeno costumava ligar as mulheres a um passado de má vida. Conseguiu o que queria: o pai, furibundo, retirou-lhe os direitos de sucessão e convidou-o a ir viver para longe, algo que Carol fez com grande dose e contentamento, marchando para França de braço dado com a sua Elena ou Magda, como a queiram chamar.
O problema destas histórias de amor entre príncipes e plebeias é que os príncipes têm tendência a encontrar outras plebeias mais atraentes ou então vão dar a reis o que lhes ocupa muito do tempo que anteriormente dedicavam às mancebas. Metidos num sarilho com a morte de Ferdinand I, os governantes romenos resolveram aprovar uma lei que revogasse a decisão do falecido em relação à sucessão de Carol. E, assim sendo, este regressou à Roménia para se ver igualmente metido numa camisa de onze varas à frente de um país que sobrevivia como podia à maior crise económica da sua história.
Não tendo sido um príncipe muito dotado para a função, como rei Carol não prestava grande atenção às questões governativas. Para compensar, dedicava-se a fundo ao seu trabalho como presidente da Federação Romena de Futebol e encaixou no bestunto a ideia fixa de levar a Roménia ao primeiro Campeonato do Mundo, organizado pelo Uruguai de 13 a 30 do seguinte mês de julho, tarefa homérica para quem tomara posse do reino a 3 de junho.
A história repetia-se: Carol não fora um exemplo como príncipe mas tirara todas as vantagens de o ter sido. Agora, como rei, tratava-se de reinar. Tratou de assumir as funções de selecionador, tomando o lugar de Costel Radulescu, concedeu uma amnistia a três jogadores de nomeada que haviam sido presos por crimes menores e tratou de convencer os diretores de uma companhia inglesa de extração de petróleo a emprestarem-lhe quatro dos seus empregados que considerava fundamentais para construir a equipa. No dia 21 de junho de 1930, pouco mais de quinze dias depois de se ter tornado rei, Carol e a seleção da Roménia embarcaram no porto de Génova no navio Conte Verde que fez escala em Villefranche-sur-Mer para apanhar a seleção francesa e o presidente da FIFA, Jules Rimet, que levava a Taça do Mundo numa maleta, e em seguida realizou um desvio até Barcelona par que a seleção da Bélgica também pudesse cruzar o Atlântico. Colocada no Grupo 3, com Peru e Uruguai, a Roménia bateu os primeiros por 3-1, perdendo para os futuros campeões por 0-4 e sendo assim eliminada na primeira fase. Apesar de tudo, fora uma jornada triunfante e seguida pelo povo romeno com uma excitação nunca vista o que fez com que muitos esquecessem a fome e a miséria. Por pouco tempo, claro. Fome e miséria é algo que ninguém esquece de um dia para o outro. Carol regressou à Roménia e casou, finalmente, com Elena, dita Magda, Lupescu, depois de se divorciar de Helena. Foi deposto e tentou o exílio no México. Achou o país demasiado quente e a comida excessivamente picante. Veio para o Estoril e comprou uma moradia chamada Casa do Mar e Sol. Podia ter nome de cervejaria, mas morreu por lá sossegado em 4 de Abril de 1953. Para quem o quiser visitar, encontra-lhe os restos no Panteão da Casa de Bragança, no Mosteiro de São Vicente de Fora. Sempre está lado a lado com gente fina..."

Euro2020: Itália 1 (4) - (2) 1 Espanha

O Karaté falará português nos J. O. de Tóquio?


"Tóquio 2020 aproxima-se! A estreia do Karate nos Jogos Olímpicos também se aproxima. Uma estreia com uma presença efémera dado que o mesmo já não estará presente nos J. O. de Paris 2024.
Antes de respondermos à questão que encima este artigo, teremos de fazer um enquadramento histórico a fim de se compreender toda a complexidade da mesma, dado que a passagem do Karate de arte marcial a desporto de combate não foi uma mutação repentina, mas um processo gradual (com diversas fases em diferentes contextos históricos e culturais) inserido em modificações sócio-culturais – há uma progressão temporal que determina uma evolução – e pela aculturação de uma realidade oriental na cultura ocidental – há uma difusão geográfica, espacial, que implica um alastramento por todo o mundo. Todo este processo, um lento passo-a-passo, originou aquisições e reinterpretações mas também degenerações, até porque as diferentes condições históricas e a disparidade das diversas culturas criaram situações objectivas de desigualdade. (1)
1º parêntesis: a terminologia correcta é “Karate-do” ou “Karatedo”. A lei do menor esforço ou outros interesses levam-nos a falar em “Karate” (e quão importantes são esses “interesses”…).
2º parêntesis: apesar de associarmos o conceito de “arte marcial” a técnicas de lutas orientais, este termo provém do nome do deus romano da guerra, Marte, e a notação escrita mais antiga que conhecemos remonta a 1639 no livro “Pallas Armata, The Gentlemans Armorie”, escrito por Sir James Turner, referindo-se à “arte marcial da esgrima”. Logo, é um constructo de origem ocidental.
3º parêntesis: “O Karate não é considerado uma das artes marciais tradicionais japonesas, apesar de algumas vezes ser referido como tal fora do Japão. Após a Restauração Meiji (1868) o conteúdo das artes marciais mudou enormemente, refletindo o fato de que elas não mais deveriam ser utilizadas em combate e que já não eram de treino exclusivo da classe guerreira. Refletindo esta nova circunstância, o termo Bujutsu foi substituído pelo termo Budo, implicando que deveria ser treinado mais sob princípios espirituais do que para o combate.” (2) Apontava-se assim mais para uma codificação de técnicas e para uma forma de realização pessoal através da acção motrícia de combate ritualizado e simbólico, sendo o corpo do outro o objecto e objectivo da acção, e o contacto corporal intencional, directo e um fim em si. “Depois da Segunda Guerra Mundial, houve a necessidade de modificar certas visões das artes marciais e (mudar) a ênfase de artes práticas com objetivo de defesa nacional para desportos que conferem maior harmonia e universalidade.” (2)
4º parêntesis: segundo Patrick McCarthy (3), em 1933 o Dai Nippon Butokukai – organismo do governo nacional do Japão para as artes marciais – lançou um repto aos mestres de Karate da altura em Okinawa a fim de que o então denominado Tode ou Karate-jutsu fosse reconhecido oficialmente no Japão… Pretendia-se assim não só organizar o ensino desta arte, mas também tornar a mesma pertença original do Japão, por força de um poder nacionalista combinado com um sentimento anti-chinês. Foram quatro as imposições do Butokukai: desenvolver um uniforme/equipamento ‘standard’; adoptar um sistema de graduações “dan/kyu” semelhante ao de Jigoro Kano no Judo; estabelecer um programa/sistema de ensino/avaliação; e mudar o primeiro ideograma de “Tode” e adicionar o sufixo “do”, resultando a palavra japonesa “Karatedo”. Como se verifica, estas foram imposições políticas. Em 1936, os mestres mais representativos de Okinawa acordaram aceitar estas condições e assim se deu início à institucionalização do Karate. O acto de constituição do Karate foi pois um acto político e podemos dizer que o Karate existe só desde 1936.
A apresentação do Karate como um desporto (a primeira competição formal aconteceu no Japão no já distante ano de 1957 sob a égide da Japan Karate Association) levou a que se formasse uma Federação Europeia em 1963, tendo-se realizado três anos depois o 1º Campeonato Europeu de Karate, e uma Federação Mundial em 1970 (a WUKO, actualmente WKF), a qual realizou o 1º Campeonato Mundial de Karate em Tóquio nesse mesmo ano.
A World Karate Federation (WKF), a federação internacional mais representativa da comunidade karateka – sim, porque há outras 5 ou 6 federações internacionais – lançou uma enorme campanha (‘The K is on the Way’ era o mote) tendente a que o Karate estivesse presente no programa dos J. O., não conseguindo ter sucesso em relação a 2012 nem a 2016. A hora chegou apenas para os J. O. de 2020.
Exultou-se, dando loas, quando o Karate foi contemplado no programa dos J. O. de 2020, atirando-se foguetes e recolhendo-se as canas. Propalaram-se virtudes e potencialidades, glorificaram-se valores e benefícios, celebrou-se a festa e deram-se hossanas. Realçou-se uma futura via melhor, mais atractiva, mais dinâmica e com maiores virtualidades. Treinadores, competidores e praticantes glorificaram a modalidade… Adeptos do Karate “puro e duro”, ou em linguagem corrente, do tradicional, descobriram a fórmula de se projectarem e adquirirem ‘status’ dedicando-se à competição arrastando para ela aqueles sobre quem tinham responsabilidades. Passaram a ser mais relevantes os lugares no pódio e as medalhas em detrimento de uma formação harmoniosa do indivíduo ou de uma construção do seu carácter.
Apareceram discursos afirmando que finalmente o Karate era um desporto olímpico – quando já o era desde 18 de Março de 1999, desconhecendo-se esse facto ou confundindo-se «desporto olímpico» com «modalidade constante do programa dos J. O.» – surgiram campanhas prometendo uma maior visibilidade da modalidade, um aumento do número de praticantes nos ‘dojo’ (vulgo ginásio ou academia, o lugar onde se pratica a via) – esquecendo o “do”, a via, o caminho, (o tal “do” que existe no Kendo, no Judo, no Iaido, no Aikido) a ponto de se retirar este sufixo do termo Karatedo (ou Karate-do) mas continuando a manter o mesmo no início do termo ‘dojo’ (o que seria do local de treino sem um conteúdo para treinar e ser treinado???).
Não podem estes arautos dizer que não foram alertados para o modo de seleccionação dos competidores: só haveria 80 vagas para os karateka participantes nos J. O. – 40 vagas femininas e 40 vagas masculinas, sendo que 60 seriam na prova de kumite (combate) e 40 na prova de kata (formas técnicas) – e a selecção dependeria da contabilização de pontos conquistados num circuito mundial, o qual estabeleceria um ‘ranking’. Não seria uma escolha equitativa por países… como julgaram muitos dos que, indocumentadamente, foram induzidos em erro.
E, exactamente para puderem participar nesse circuito, um planeamento bem efectuado alicerçado num bom orçamento teriam de ser bem articulados. O que se verificou? Uns competidores a movimentarem-se por um lado, outros por outro, deixando entregue uma qualificação à última da hora em três eventos: o Karate Premier League em Lisboa, o Campeonato Europeu em Porec, na Croácia, e o Torneio de Qualificação Olímpica em Paris. E se alguns bons resultados faziam alimentar alguma esperança, parece-nos que uma má gestão de recursos fizeram ruir essa esperança. A estratégia da crença e do milagre ‘in extremis’ resultaram num fracasso. Se um 7º lugar num Campeonato Europeu entre 30 competidoras se pode classificar de bom resultado, dado se encontrar no primeiro quarto da classificação (embora não desse apuramento para os J. O.), o que dizer de um afastamento logo na primeira ronda numa prova de kumite, ou de um 9° lugar em 34 ou de um outro 21° em 35? Quanto a Paris, oito competidores deslocaram-se ao Torneio de Qualificação Olímpica – derradeira hipótese – mas nada conseguiram… Parece-nos que os competidores se aplicaram, se esforçaram, se comprometeram, mas algo falhou. Será objecto de análise pelas entidades responsáveis?
E se a equipa feminina de kata de Portugal conquistou a medalha de bronze no Campeonato Europeu, há que ter a noção de que o fez entre 12 equipas...
Há anos que constatámos que a alta competição não se compadece com amadorismos. Continuamos a constatar…
Regressando à pergunta inicial, não, não teremos Karate a falar português nos J. O. de Tóquio. Provavelmente a modalidade continuará com a mesma visibilidade ou sem ela, os ‘dojo’ com os mesmos praticantes e os competidores com os mesmos resultados… os selecionadores, os árbitros e os dirigentes com as mesmas saídas lá fora! E os treinadores cá por casa? Deitaram os foguetes e recolheram as canas, agora calados como nunca, não se manifestam. Ahhhh, e como nos dizia Jorge Valdano em «A Bola» (03.07.2021, p. 31), embora em relação ao futebol, “antes de modificar campeonatos, há que fortalecer o produto com treinadores corajosos. Só assim se aguentará este negócio.” Faça-se o necessário ‘transfer’.
Mas alegremo-nos! Valéria Kumizaki e Douglas Brose também não estarão em Tóquio. Aliás, o país irmão também não terá lá ninguém, nem para falar português do Brasil. Vão estar 34 países nos próximos J. O. e nenhum deles falará a nossa língua. Victor Hugo disse algo parecido com isto (e citamos de memória): “a consolação dos infelizes é não estarem sozinhos na sua miséria”."