Últimas indefectivações

sábado, 16 de junho de 2018

A Assembleia Geral

"A Assembleia Geral do Sport Lisboa e Benfica foi um êxito e um bom exemplo daquilo que deve ser um clube moderno, responsável e unido. O Orçamento e o Plano de Actividades para 2018/19 foram aprovados por esmagadora maioria - quase 80% - e durante a reunião magna imperou sempre o Benfiquismo. Após a brilhante apresentação do vice-presidente Nuno Gaioso Ribeiro, os Sócios foram chamados a votar. No Pavilhão Fidelidade respirou-se um sentimento de confiança no futuro. É verdade que os pressupostos do Orçamento permitem-nos encarar os próximos 365 dias com a certeza que iremos disputar cada competição com o ambição de vencer. Porquê? Porque o reforço do investimento nas modalidades e no ecletismo do nosso Clube e a aposta do Futebol Feminino serão evidentes. O crescimento das receitas de quotização, graças ao lançamento de dois programas, provam a preocupação constante e primordial com os Sócios. Já ultrapassámos a barreira dos 218 mil Sócios e, seguramente, chegaremos aos 300 mil nos próximos meses. Temos um líder que pôs as contas em ordem, profissionalizou o Clube e credibilizou-o. O aumento previsto do lucro de 0,5 milhões de euros, mais 8%, é apenas mais um resultado positivo do homem que escolhemos há 14 anos para gerir os destinos da nossa instituição. É bom recordar que Luís Filipe Vieira foi sempre eleito e nunca nomeado. Da última vez, teve uns esmagadores 95,5% de votos e, por isso, o Presidente tem toda a legitimidade para se mostrar motivado, confiante e ambicioso. Contrariamente a outros, temos um líder que se assume nos maus momentos. Luís Filipe Vieira disse que era o único responsável pelos insucessos.
Todos sabemos que não é verdade, mas é digna de registo esta postura. Os grandes líderes afirmam-se, sobretudo, nas contrariedades."

Pedro Guerra, in O Benfica

Serenidade, fervor e união

"Muitos paladinos de desgraça alheia e alguns assustadiços benfiquistas temiam a realização da Assembleia Geral do Sport Lisboa e Benfica da passada segunda-feira. Recordavam o alvoroço da anterior sessão de Setembro, realizada ao auge do mais violento o mais caviloso, inesperado e insane ataque sistemático que alguma vez fora tão cuidadosamente organizado, tão carregado de infâmia e de banditismo impune, contra uma qualquer instituição em Portugal. Infelizmente, mercê das circunstâncias, essa triste reunião degenerara em evidentes episódios de descontrolo das partes em presença. Mas, pior do que tudo, a estúpida divulgação de algumas dessas pesarosas imagens através da web, intensamente replicadas, viria servir de pasto e escorreria como baba fétida pelos alarves queixais dos mais conhecidos abutres que se usam refastelar nas habituais 'comesainas' comunicacionais das televisões de banda estreita.
As bestas julgavam que era sempre assim. Mas nunca fora. Mesmo quando passámos por outros momentos difíceis da nossa história centenária e gloriosa. Nem há de voltar a ser. Nunca mais.
A verdadeira tradição, a profunda cultura do Benfica, escorada em sólidas fundações assentes nos valores da liberdade, da democracia e da convivialidade e união em torno dos amados símbolos do Clube, sempre pôde acolher ideias contrárias, sabendo envolver a diversidade e sempre tendo sido capaz de resolver antagonismos.
Foi por isso mesmo que o Benfica nasceu; foi dessa forma que o Benfica cresceu; é é precisamente deste modo que o Benfica continua a alimentar o seu crescimento imparável. São estes factores fundacionais que nos diferenciam, de modo absoluto das práticas e dos baixos usos de outras associações nas quais se permitem, se cultuam e se divinizam os meros intérpretes circunstanciais que, mais ou menos transitoriamente, se façam eleger, reeleger ou revalidar nos galandrins dos seus pequenos poderes (invariavelmente tornados irrestritos), mediante sucessivas paródias eleitorais, empacotadas sem qualquer pudor diante dos basbaques.
No Benfica, a reunião da Assembleia Geral constitui o momento mais nobre e mais elevado da vida quotidiana do Clube, no qual, regularmente, os eleitos prestam contas perante os eleitores e em que os sócios não só exprimem livremente todos os seus cuidados de entrega e de dedicação ao Sport Lisboa e Benfica, como conjecturam e julgam sobre os actos daqueles que elegeram.
Ora, depois dos infelizes incidentes de Setembro, esta reunião de 11 de Junho voltou ao registo tradicional das nossas Assembleias Gerais, em que soubemos conjugar serenidade de análise com fervorosa exaltação clubística. Em muitos momentos da magna reunião, senti, confesso, o frémito do orgulho por ser benfiquista e estou convencido de que o mesmo terá sucedido e muitos dos mais de mil sócios que ali estavam. Mas, desta reunião e destes registos, não irão perorar as bestas nos seus currais mediáticos...
Como sempre aconteceu, muitas e muito interessantes sugestões foram lançadas com repto ou contributo de Sócios intervenientes aos Órgãos Sociais do Sport Lisboa e Benfica. E, nesta ocasião em que, mais do que nunca, devemos apurar todos os nossos sentidos de união e salvaguarda do Glorioso, estou absolutamente seguro de que a Direcção e a Mesa da Assembleia Geral não perderão o ensejo para instituir e aplicar expeditamente as boas ideias que ali pudemos acolher, conjuntamente com o laborioso Plano de Actividades apresentado pela Direcção que o Orçamento igualmente aprovado sustenta."

José Nuno Martins, in O Benfica

Ainda não acabou...

Sporting 5 - 4 Benfica

Entrámos bem, conseguimos uma vantagem interessante, permitimos a reviravolta... e já na parte final, num último esforço, tivemos quase a levar o jogo para prolongamento...
Tal como o Joel afirmou, independentemente de tudo o resto, efectuamos demasiados erros não forçados!!!
Tudo em aberto... Quarta-feira temos o jogo 2 na Luz.



PS: Depois da inesperada derrota da semana passada, os nosso sub-20, corrigiram o resultado, e conquistámos o título, e somos Bicampeões Nacionais do escalão...

Bruno inconsolável com Cristiano

"Da ficção sobre o actual momento leonino à realidade da estreia da Selecção Nacional no Campeonato do Mundo da Rússia-2018

Bruno de Carvalho está inconsolável. Hoje, as televisões, as rádios e os jornais entenderam - vá lá saber-se com que inconfessáveis razões - que a Selecção portuguesa e o seu jogo de abertura do Mundial, com a Espanha, era mais importante do que ele. Pior a Selecção ainda é um desígnio colectivo, uma bandeira da Pátria. Pior é ser ultrapassado e humilhado pelo esplendor de uma individualidade. Cristiano Ronaldo, um madeirense que a única coisa boa que teve até agora foi uma caricatura com uma cara um bocado parva. Em resposta a esta afronta, Bruno pondera promover, esta tarde, uma conferência de imprensa na Gulbenkian para atacar o que considera ser «esta inqualificável escolha editorial» que o suspenso presidente considera contrária aos superiores interesses do Sporting.
Segundo fontes dignas de crédito, também o Conselho Directivo leonino, depois de ter reunido de emergência numa cabina telefónica da zona de Alvalade, decidiu estudar a possibilidade jurídica de avançar com a criação de uma comissão transitória para dirigir a Federação Portuguesa de Futebol, a fim de proibir a realização de qualquer jogo de Selecções, oficial ou não oficial, que possa contribuir para desfocar a atenção dos sportinguistas espalhados pelo mundo.
Instado a pronunciar-se sobre o facto da FIFA e da UEFA nunca virem a autorizar tais propósitos, o líder leonino twittou no seu buncker: «O presidente do Sporting nunca reconhecerá legitimidade em quem não foi votado, convocado ou nomeado por ele ou pela doutora Elsa».
Entretanto, A Bola sabe que o inquietante e prolongado desaparecimento do, antes, inesgotável director de comunicação, Nuno Saraiva, se deve ao facto do indefectível brunista estar, há meses, em Washington, incumbido de uma missão tão específica quanto secreta: preparar uma complexa cimeira entre os dois mais fortes líderes do mundo: Donald Trump e Bruno de Carvalho.
Aguarda-se, com natural curiosidade, o teor da agenda, mas fontes próximas da administração americana falam da possibilidade de vir a ser considerada a hipótese de ambos os líderes trabalharem em conjunto um bloqueio económico e militar que obrigue à desnuclearização do Estádio da Luz e ainda a proclamação de um impedimento universal de actividade profissional a Cristiano Ronaldo, por manipulação e monopolização do interesse dos portugueses, em manifesto prejuízo dos superiores interesses do Sporting e dos Estados Unidos.

Nota Importante: Este é um texto de pura ficção. Qualquer ponto comum com a realidade é, apenas, mera coincidência.

Portugal, como certamente terão visto no frenético jogo com a Espanha, voltou a ser Cristiano e mais dez. O Homem deu cabo da Espanha inteira e desde o D. Afonso Henriques que não aparecia português mais destruidor. Bem pode o meu querido amigo Pereira Ramos levar uma vida de monge, na laboriosa missão de provar aos espanhóis que os portugueses são fixes, que aparece sempre um CR7 e lhe dá cabo de anos e anos de trabalho meritório.
Curioso: nem todos os espanhóis levaram a mal o hat trick do português, dado que o melhor do mundo destroçou o fisco espanhol que, se soubesse antes o que se passou depois, teria ordenado Cristiano Ronaldo a vinte anos de prisão ou, em alternativa, ao degredo definitivo.
Agora, Messi vai ter um trabalhão para fazer melhor. Não vai ser fácil. Pelo que parece, o pequeno génio argentino está em crise e não consegue ganhar a Ronaldo, nem ao fisco espanhol. Podem dizer-me que é cedo para cantar vitória, que ainda vem aí aquele Marrocos que nos lixou no México e aquele Carlos Queiroz que nos lixou na África do Sul, mas haja esperança. O presidente já disse que tem bilhete e hotel marcado para Moscovo.

O regresso de Alcochete
As anunciadas rescisões de contrato no Sporting, a serem irreversíveis, podem causar danos arrasadores para o futuro, a médio e curto prazo, ao futebol profissional dos leões. O problema, para os novos responsáveis, que vierem ter a coragem de gerir o clube, coloca-se no campo jurídico (tentar reverter alguns casos e cuidar de justificar as maiores indemnizações possíveis) e no campo desportivo (criar condições para uma equipa de futebol digna). Incontornável será, sempre, o regresso à fonte essencial: Alcochete.
(...)"

Vítor Serpa, in A Bola

Palavras para quê?

"Poder-se-á dizer que Portugal foi feliz na forma como empatou com a Espanha. É verdade que teve, a Selecção Nacional, a infelicidade de ter visto o VAR ter saído para beber um café no primeiro golo espanhol, mas tudo o resto foi felicidade pura, porque uma análise objectiva, mesmo que sempre complicada quando se trata de um jogo de Portugal num Campeonato do Mundo, teremos de dizer que a Espanha foi, sempre, melhor que Portugal. E em longos períodos foi até, muito melhor. Nada que nos deva envergonhar, porque estamos afinal a falar de uma das melhores selecções do mundo.
Mas a maior felicidade desta Selecção é poder contar com Cristiano Ronaldo. Já não há, de facto, adjectivos para descrever CR7, porque tudo aquilo que possamos dizer será, sempre, pouco em relação ao que o capitão representa, hoje, para o futebol português. Podemos, de facto, não ser a melhor selecção do mundo, mas temos - por muito que custe a muitos admiti-lo - o melhor jogador do mundo. E com ele, como ficou ontem bem evidente, não podemos ter limites para o sonho. Enquanto Cristiano estiver por aí podemos ser tão grandes como os maiores. Chega para ganhar o Mundial? Talvez não. Mas, também, talvez sim. E só esta dúvida diz tudo."

Ricardo Quaresma, in A Bola

Para Marrocos

"Perdi um tempinho a rever os grupos dos Mundiais, de 1930 a este, certo de que nenhum teria sido composto com três países cujas capitais fossem tão próximas, como acontece com este no qual estão Portugal, Espanha e Marrocos. Partindo de Lisboa, a mais central das três, são 502 Km até Madrid e 562 até Rabat, totalizando 1064. Extraordinariamente pouco atendendo a que a tendência de organização dos grupos sempre olhou a confederações. Encontrei caso parecido numa das primeiras edições, em 1954, um grupo com Suíça, Itália e Bélgica, pois partindo de Berna distam 489 Km para Bruxelas e 691 para Roma, somando 1180 Km. Ainda assim, ligeiramente mais distantes. Acabei, porém, a perceber que me enganara, pois já houve, sim, capitais mais próximas: em 1990 houve grupo com Itália, Checoslováquia e Áustria e, partindo de Viena, são 252 Km para Praga e 765 para Roma, totalizando 1017. O triângulo Lisboa-Madrid-Rabat mantém, em todo o caso, especifidades: Rabat é africana; Lisboa é a cidade mais ocidental do continente europeu, o que torna as vizinhanças improváveis.
Tentei,  porque ao trabalho me dera, perceber que importância teria isto e foi com tristeza que me pareceu, realmente, que nenhuma. Fez-me recordar, ainda assim, ideia do livro História de Portugal, coordenado por Rui Ramos, que há uns anos li como se a um romance: «Acantonado nesse finisterra, o reino vivia o impasse hispânico. O apelo do mar sentia-se. A opção seria Ceuta». Foi o tapume de Espanha que nos encaminhou para o mar e a primeira parada da nossa epopeia seria, justamente, Marrocos. Foi lá, ainda em Alcácer Quibir, que perdemos o mitológico D. Sebastião, que morrendo nos devolveu à Espanha que sempre tentáramos ladear. Com o empate de ontem parece-nos claro que Marrocos, tão próximo, é sempre o caminho em frente."

Miguel Cardoso Pereira, in A Bola

Cristiano Ronaldo & mais 10

"O jogo de abertura de qualquer Campeonato do Mundo é suposto constituir-se numa sensaboria medonha. Reforçando a nota, deve a partida inaugural de um acontecimento desta dimensão terminar num empate, de preferência sem golos, ou numa vitória pindérica da selecção do país anfitrião. É isto o que mandam as boas maneiras do internacionalismo. Os russos, sempre agarrados às suas manias, resolveram mandar às malvas esta bonita tradição da hospitalidade e destroçaram a equipa nacional da Arábia Saudita com uma mão cheia de golos sem resposta. E, ainda assim, com tantos golos, o jogo foi uma sensaboria. Cinco golos e um aborrecimento.
Aparentemente, um Campeonato do Mundo de futebol é para os melhores do mundo, para a elite da elite desta magnífica indústria planetária. Felizmente, há excepções para alegrar com os preciosismos das cores locais o sisudismo da presunçosa organização. Não bastava ter a Espanha despedido o seu treinador 48 horas antes do jogo de estreia (até mais ver é o cúmulo do terceiro-mundismo deste Mundial'2018) e ainda se soube que o presidente da federação saudita, o senhor Ezzat, insultou publicamente os seus jogadores depois da catástrofe inaugural com a Rússia. Imagine-se um acontecimento portentoso como este, um Mundial, a ser beliscado intelectualmente pelos desvarios de um presidente exótico ao ponto de apontar a dedo os nomes dos jogadores que mais o desapontaram em campo e ainda "os erros técnicos" gerais que conduziram à derrota. Uma coisa destas, de facto, só lá nas arábias.
Já o outro jogo do nosso grupo, entre marroquinos e iranianos, só tendo um golo, foi mais interessante do que o dos russos com os sauditas com aquele despudorado fartote de golos. Começou muito bem a selecção de Carlos Queiroz. Jogou um bocadinho menos do que o adversário mas soube atar a equipa de Marrocos e esperar pelo golpe de sorte.
"Cristiano Ronaldo & mais 10" - é uma espécie de firma - conseguiu a proeza de adiantar a equipa no marcador e depois voltou a re-adiantar a equipa no marcador e, finalmente, quando já eram os espanhóis que iam adiantados no marcador e a coisa se apresentava negra, lá voltou a firma "Cristiano Ronaldo & mais 10" a fazer das suas e a impor um empate que soube como ginjas, em função da realidade dos factos. Aliás, quer no penálti com que inaugurou a noite, quer no livre directo com que fechou a noite, Cristiano Ronaldo não precisou dos "mais 10" para nada. Fez tudo sozinho, sofreu as faltas e cobrou-as exemplarmente. Foi lindo."

A Seleção contra o clubismo

"O futebol português está mais do que nunca dividido em dois. Por um lado clubes, que muitas vezes fazem com que não se goste dele. Do outro lado a selecção nacional, campeã da Europa, há dois anos, e entre as melhores do mundo, há vinte anos. Dois mundos claramente separados em que tudo se opõe ou quase. No século 21, a Selecção profissionalizou-se e estruturou-se. É menos engraçada de seguir do que antes para os média, mas é respeitada em todos os lugares do planeta e amada por toda a população portuguesa. Se ganhou o último Euro, é porque foi bem sucedida, como todos os campeões. Mas é acima de tudo a culminação de um longo processo que tornou possível esse sucesso. A Selecção portuguesa nem sempre é bonita de se ver, mas com o tempo ela é admirável.
A Selecção é a cara glamorosa de um clube de futebol doente. Aqui em França, quase desistimos de contar, em detalhes, todos os assuntos que poluíram a temporada da Liga Portuguesa. Porque eles eram complicados de entender para os nossos leitores. Porque, visto de França, é difícil explicar as fontes do "clubismo" em voga em Portugal. O caso dos emails, a acusação de líderes do Benfica, a expedição punitiva de "apoiantes" encapuzada no centro de treino do Sporting com o consentimento implícito do presidente do clube, o pingue-pongue dos média permanente entre chefes dos três "grandes"... Tudo isso parece ser de outro século ou até mesmo de outro regime político. Que país da Europa Ocidental, além de Portugal, vê o seu futebol atravessado por tantas polémicas, negócios, até mesmo a delinquência? Nenhum.
Felizmente, a Selecção sabe ser amada. Soube separar-se, pouco a pouco, dessas pequenas chicanas. Estamos muito longe, em 2018, do quarteto de treinadores responsável pela equipa nacional no Euro 84 ou o amadorismo de Saltillo em 1986.
O Mundial que começou ontem (bem ou mal) em Sochi contra a Espanha vai dizer até que ponto a equipa de Fernando Santos é imune aos acontecimentos domésticos. Os sérios eventos ocorridos há umas semanas em Alcochete inevitavelmente serão evocados se, por acaso, Rui Patrício cometer erros tão grandes quanto a sua mão no terreno do Marítimo. Ou se William Carvalho perder uma bola a meio-campo. "São tópicos paralelos que não afectam a selecção", afirmou João Mário.
"Tenho total confiança nos meus jogadores", afirmou Fernando Santos. Mas quem treinou os três grandes ainda pode confiar nesses clubes? Eles jogam muitas vezes contra a sua equipa, mesmo que isso mostre menos do que quando o Real Madrid devolveu o técnico espanhol a dois dias de uma Copa do Mundo.
Metade dos portugueses na Rússia foram formados no Sporting, quatro deles ainda estão lá e acabaram por rescindir unilateralmente o seu contrato com os leões. Isto pode não impedir Portugal de se qualificar. E não será uma desculpa suficiente para a eliminação precoce. Mas os futebolistas repetem com demasiada frequência que o futebol é jogado com detalhes por isso é difícil imaginar que o impacto da trágica temporada do Sporting será zero.
Fãs portugueses, aproveitam ao máximo este Mundial. Apoie a sua equipa nacional como ela merece. E vá de férias com as imagens de uma digna e valorosa Selecção à sua frente, mesmo caso não vença no final das contas. Porque no começo da próxima temporada vai ter de lidar novamente com o lado negro do futebol português. E se você gosta de futebol, isso pode deixá-lo tão mal na cabeça como se estivesse de ressaca um dia depois de uma festa regada com vodka."

Ele faz-nos acreditar

"Quando Eusébio e os Magriços protagonizaram um dos episódios míticos dos Mundiais, o autor destas linhas tinha 3 anos... O filme, que vi e revi, do Portugal-Coreia do Norte e dos outros jogos mágicos da Selecção em Inglaterra em 1966 é admirável, mas obviamente quem viveu no momento aquela jornada gloriosa teve sentimentos e emoções que imagens (até já coloridas) não conseguem transmitir.
Ontem, todos nos arrepiámos com uma proeza notável de Cristiano Ronaldo num jogo que fica para a história do futebol português e dos Mundiais. Pode parecer cruel dizê-lo, mas faltava a CR7 uma demonstração desta grandeza. E a boa sensação que fica, é que pode ter sido apenas o começo de algo ainda maior. Será possível? Ele faz-nos acreditar que sim, que é possível.
O Irão de Carlos Queiroz entrou com o pé direito, mesmo lutando contra limitações que outras selecções não tiveram na preparação para o Mundial. Foi com um golpe de sorte mas compensa a coragem dos bravos iranianos que conquistaram o segundo triunfo em fases finais.
Os tribunais estão a tirar o poder a Bruno de Carvalho e a provar que ele não tinha razão. Quando, magnânimo, anunciou que viabilizava a AG de dia 23, BdC já sabia que um juiz o obrigava a isso. Decididamente, fica cada vez pior na fotografia."

Um Exército Chamado Ronaldo e outros prazeres

"Qual o português que, depois da exibição de Ronaldo, não deixou escapar um risinho mefistofélico quando Messi, a carregar nos ombros o peso do mundo, falhou o penalty?

Ainda Ronaldo. Há uns anos era acusado, com aquele prazer acerbo que temos em atacar os melhores dos nossos quando não se mostram à altura de padrões concebidos no sofá, de não render na selecção o que rendia nos clubes. Das várias explicações possíveis para o facto, a mais benevolente era a de que na selecção Ronaldo não era seguia no andor dos talentos que o carregavam nos clubes. A outra, mais maldosamente lusitana, era a de que as conquistas na selecção não lhe interessavam tanto como as da entidade patronal, por simples razões pecuniárias. Que o dinheiro seja importante para Cristiano Ronaldo (e para mim e para si, caro leitor) não duvido. Que alguma vez tenha sido esse o motor dos seus desempenhos em campo, nem me parece discutível. É apenas absurdo. Ronaldo corre atrás de ser o melhor da história deste desporto. É um repto individual que ele aprendeu a conciliar com o colectivo, embora em noites como as de ontem, em que Ronaldo é general de exército de um homem só, este maravilhoso desporto colectivo se assemelhe mais do que nunca a um desporto individual.
Na conferência de imprensa, um jogador tão talentoso como Bernardo Silva era todo ele vergonha e gratidão, como se ele e os outros colegas fossem os beneficiários imerecidos do acaso cósmico que os pôs a jogar ao lado de Ronaldo: “Sobretudo um grande Cristiano [o que fez a diferença]. Há que dar-lhe o mérito. Esteve ao seu melhor nível e quando ele está ao seu melhor nível tudo é possível.” Estar ao melhor nível é um eufemismo. A única comparação possível é a de um general a carregar os soldados feridos pelo campo de batalha, com morteiros a caírem-lhe ao lado e balas a assobiarem-lhe aos ouvidos, enquanto afasta o inimigo com tiros tão precisos como os de um sniper. Ontem, quando Nacho desenhou o terceiro golo, a primeira coisa que pensei foi: “lá vai o Ronaldo ter de marcar mais um.” A solução não estava na equipa, na tática, no treinador. Estava em Ronaldo, esse extra-terrestre graças ao qual vivemos há anos acima das nossas possibilidades futebolísticas.
Outro dos grandes prazeres do Mundial é que não há espaço para ideologias dogmáticas sobre o que deve ser o futebol. Xavi Hernández, enorme futebolista e lamentável guardião de uma pretensa pureza futebolística, deve assistir com mágoa atenuada pela prodigalidade qatari aos jogos do Mundial em que tanto podemos admirar o jogo de posse da Espanha como o brilhantismo de Ronaldo e menos dez. Tanto podemos deliciar-nos com uma recepção de bola de um jogador marroquino cujo nome esquecemos como podemos saudar a tenacidade defensiva dos iranianos cujos nomes não queremos lembrar. Podemos agradecer a audácia de Deschamps em apresentar um trio de ataque com Mbappé, Dembelé e Griezmann e, ao mesmo tempo, sentir como uma terrível injustiça a derrota da Austrália, ainda por cima atirada ao tapete por um daqueles golos de Charlot. Podemos achar que a Dinamarca não merecia ganhar e, simultaneamente, pensar que sem a vitória dos dinamarqueses não teríamos o drama de Cueva, que abandonou o relvado em lágrimas por ter falhado um penalty. Podemos vibrar com a entrada em campo da Argentina, apesar de a mais bela camisola do mundo só se ver nos adeptos na bancada, e reconhecer, não obstante, o mérito dos islandeses.
Bem, aqui confesso algumas reticências. A Islândia no Mundial é uma anedota. Explico: ouvida a segunda vez perde a piada. Percebemos a lógica, o país de 300 e tal mil habitantes, a aposta estruturada no futebol, os jogadores em part-time, etc. Depois, claro, o ritual das palminhas. Sim, de início teve impacto. Aquele arremedo poderoso e tribal de belicismo nórdico (afinal, era só mesmo um ritual futebolístico), a coreografia do espírito de corpo, que, quando foram eliminados no Europeu pela França, esperei que pusessem o treinador numa pira funerária e, contristados e agradecidos, o imolassem (Birkir Imolassen dava um belo nome islandês). Mas depois o ritual foi franchisado e fomos submetidos a versões internacionais desde Alvalade a campos pelados. O ressentimento, pelo menos o meu, foi, com ou sem razão, canalizado para a fonte original. E eis que eles regressam novamente com aquela pose de nórdicos descontraídos – “nem levamos isto muito a sério” – registada pela Dinamarca em 1992. O treinador, Heimir Halgrimsson, afirmou na conferência de imprensa antes do jogo com a Argentina que, quando o Mundial acabar, volta a ser dentista, o que até pode ser uma oportunidade de carreira para Jorge Sampaoli caso não passe da fase de grupos.
Esta atitude subrepticiamente moralista do amador que, entre um implante e uma remoção de tártaro, vem ao Mundial – e que agrada ao adepto neutral que torce sempre pelo mais fraco – suscitou em mim o desejo de ver a Islândia ser esmagada pela selecção das Pampas de tal maneira que já nem tivessem vontade de reaparecer para o segundo jogo, e se refugiassem nos quartos, dois a dois, um a fazer de jogador e outro de público, numa celebração doméstica e acanhada do pseudo-ritual guerreiro. Por tudo isto dir-se-ia que eu teria ficado muito desiludido com o empate entre as duas selecções. Nada disso. Isto é o Mundial. Sempre que a coerência, os dogmas, as convicções e as preferências precárias ameacem o divertimento, nem que seja o divertimento mesquinho do desmancha-prazeres, basta deixá-los à porta. E a sério, qual o português que, depois da exibição de Ronaldo, não deixou escapar um risinho mefistofélico quando Messi, a carregar nos ombros o peso do mundo (ou de Maradona, que até literalmente faz mossa) e com ar de quem pode vomitar a qualquer momento, falhou o penalty?"

Grande 31 !

"Hoje joga a Austrália e recupera-se um grande 31! No apuramento para o Mundial de 2002, na Coreia do Sul e Japão, os Socceroos receberam a selecção da Samoa, num encontro que ficou para a história. Ainda que sem os principais jogadores, o resultado final de… 31-0 (!) deu aos australianos o epíteto de maiores goleadores em registo Mundial. E um jogador seu, o mundialmente… desconhecido Archie Thompson, tornou-se o mais prolífero avançado internacional ao facturar num único jogo por 13 vezes!
Outro australiano, David Zdrilic, acabou por ser secundarizado nesse encontro porque marcou apenas 8 golos! Ainda assim, um dos melhores em campo foi Salupu, o guarda-redes adversário! Os deuses não estiveram com Samoa, de nada valendo a prece do seleccionador Tunoa Lui antes do encontro: "Rezamos a Deus para sofrer poucos golos".
O impiedoso resultado também não favoreceu o apuramento australiano que, naquele período, só apresentava a participação de 1974, na Alemanha Ocidental. Curiosamente, a Austrália quase se classificou em 1966, entretanto eliminada pela… Coreia do Norte.
História em Mundiais tem Tim Cahill, uma figura maior dos australianos com ascendência em… Samoa. Antigo jogador do Everton, marcou o primeiro golo no Alemanha 2006 e tornou-se o primeiro australiano a vencer uma votação para Man of the Match. É ainda o único representante da Ásia e Oceania que já integrou a lista dos 50 nomeados para a Bola de Ouro (2006).
Se, aos 38 anos e na sua quarta participação mundial, Cahill conseguir fazer o que melhor sabe, entrará num grupo restrito de goleadores que deixaram a marca em quatro Campeonatos, juntando-se a nomes como Pelé, Uwe Seeler, Klose e… Cristiano Ronaldo que ontem, contra a Espanha, alcançou esse desiderato.
A Austrália chega à Rússia Rússia depois de ultrapassar as Honduras e imediatamente antes, no play-off asiático, a Síria. Uma selecção que quase permitiu, no campo desportivo, uma alegria a um povo que vive em verdadeiros campos de morte.
Hoje, perante os vice-campeões europeus franceses (o que é sempre bom de lembrar), é possível que seja a Austrália a passar por um grande 31!"

Aquele golo

"O livre de Cristiano Ronaldo foi um jogo à parte. Foi um livre como música. Tocada por Miles Davis. Ou um gatafunho de Picasso a completar a única pomba do mundo.

Foi estranho o que aconteceu ao tempo durante o livre de Cristiano Ronaldo. Parou. Mas abriu só o suficiente para entrar a bola na baliza.
Foi como observar um pensamento ou um sonho de um rapaz pequeno. Estava lá a eternidade. Estava lá a ilha da Madeira. O guarda-redes ficou preso à trajectória. Todo o mundo parou. Só a bola foi autorizada a mexer-se.
Visto em directo, o golo de Cristiano Ronaldo parecia já uma repetição, em câmara lenta, de um livre muito antigo que se estuda nas universidades muito lá para o futuro, quando já estivermos todos mortos.
A bola seguiu o caminho desejado em todos os nossos inconscientes, curvando como a linha feita por um dedo a escrever o nome num vidro embaciado.
O golo interrompeu o jogo que era um vaivém de esforços e sortes e vinganças. Disse que estava farto de pressas e de incertezas e de medos. Fez com que um empate soubesse a derrota, fez com que um empate soubesse a vitória.
O livre de Cristiano Ronaldo foi um jogo à parte. Foi jogado contra a ideia que contra a Espanha ele não marcava golos. Foi jogado contra a ideia que ele já não era quem tinha sido. Foi jogado contra a noção que à Espanha ninguém marca três golos.
Foi um livre como música. Tocada por Miles Davis. Ou um gatafunho de Picasso a completar a única pomba do mundo. Foi um golo para espantar toda a gente menos o próprio marcador. Por uma vez a coisa correu como ele quis: a vontade e a realidade desistiram de andar à pancada uma com a outra. Assim se abriu uma brecha no tempo."

Molhos aos molhos

"Hat trick de CR7, o ketchup chegou mais cedo desta vez. Do outro lado também houve molho, mas foi com Diego Costa, e não com o habitual fornecedor, Sérgio Ramos.

Muitas vezes critiquei Brahimi, mas quero redimir-me. Também eu me perco em fintas quando escrevo, em vez de ser objectiva. O que é dramático aqui, que tenho poucos caracteres. Viram como acabei de desperdiçar uma centena deles falando de um argelino que nem está no Mundial? Para correr atrás do prejuízo vou comentar o jogo de ontem em modo telegráfico. Hat trick de CR7, o ketchup chegou mais cedo desta vez. Do outro lado também houve molho, mas foi com Diego Costa, e não com o habitual fornecedor, Sérgio Ramos. Ronaldo é o melhor marcador da prova, podemos acabar já? Ah, não, que o Carlos Queiroz está na frente. DeGea esteve mal, será que também anda a receber WhatsApps de Bruno de Carvalho? Guerreiro devia jogar com tradutor automático, porque às vezes não entende os colegas.
Espanha fez 693 passes. Lopetegui ficou desiludido porque nem todos foram para trás. Gritei várias vezes "Sai da frente, Guedes", mas o míster só me ouviu aos 79. Houve polémica e até um golo precedido de falta. Parecia um jogo da Liga NOS, a diferença é que agora os comentadores dizem que o VAR não presta. O primeiro empate já cá canta, faltam seis! (se calhar desta vez não dá assim, mas não me exijam mais cálculos, sabe Deus como foi difícil subtrair caracteres)."

Há mundial para além da bola

"Estamos todos todos doidos com o Mundial, ou a grande maioria pelo menos. Bons jogos de futebol, muita emoção, muito patriotismo e aquele sentimentozinho de pertença que nos aconchega a existência. Mas há Mundial para além da bola.

Primeiro que tudo, é irónico que aconteça na Rússia esta celebração da diversidade, que é o que é o Mundial pelo menos aos olhos de um optimista como eu. Sabemos bem que a Rússia é menos tolerante à diversidade que uma instagrammer ao glúten. E se durante este mês é tudo amor e alegria à volta daquele rectângulo verde, é importante lembrar que se a relva fosse preta provavelmente não existia futebol na Rússia.
A Rússia é o país onde qualquer homossexual, se quiser sobreviver, tem de correr como o Ronaldo, fintar como o Messi e saber encaixar uma cotovelada como o Pepe. No fundo, têm de ser os melhores homossexuais do mundo e mesmo assim andam sempre em sobressalto para ver se não são apanhados em fora-de-jogo-das-regras-normativas-da-sociedade-conservadora-extremista.
A Rússia é também, por exemplo, o país que com conhecimento do Governo de Putin dopou dezenas de atletas, que viriam a ganhar medalhas olímpicas, e que agora passa anúncios sobre fair-play no desporto. É tão engraçado como o facto de agora o Macaco, líder dos Super Dragões, dar palestras sobre desportivismo.
E claro que também é o país que tem quase tantas detenções ilegais de presos políticos como o William tem garrafas abertas no Guilty. Está ali a roçar as 70, e quase todas elas a propósito daquela nacionalização da Crimeia. Sabem? Como lhes dava muito jeito, fizeram como a Espanha fez com o Diego Costa e nacionalizaram aquilo, só que foi com tanques e tiros e a matar pessoas, em vez de só mudar o passaporte e marcar a Portugal.
Como se tudo isto não fosse já divertido o suficiente, o jogo inaugural foi o Rússia – Arábia Saudita. Se em vez de futebol fosse em Direitos Humanos, tinha ficado -20 a -20 e tinha perdido o mundo. Em futebol ficou 5-0, mas o mundo continua a perder enquanto houver países em que homossexuais, pessoas de tez não-branca, pessoas que não sejam da maioria religiosa do país, ou pessoas que tenham um pénis em vez de uma vagina, continuem a ser mais discriminados que um português que não goste do Eder depois de 2016.
Por outro lado, - e se calhar estou a ser ainda mais optimista do que é normal – é bom que o Mundial seja na Rússia. Pode ser que aprendam alguma coisa sobre a beleza da diversidade estar no facto de sermos todos e cada um não mais que um amontoado de células que num instante deixam de funcionar.
Pode ser que o futebol lhes ensine alguma coisa."

O jogo tem limites, Ronaldo nem tanto

"Foi uma noite de alto valor pedagógico para a selecção portuguesa, mais até do que a final do Euro"2016

Nenhum grupo de jogadores neste Mundial ganhou tanto como a selecção espanhola. Entre eles, há uma pilha de Ligas dos Campeões, Ligas Europas, várias finais, dois Europeus, um campeonato do mundo e talvez uma dúzia de títulos internacionais na formação. Sustenta-se em três das melhores equipas do planeta, duas delas as actuais titulares da Champions e da Liga Europa. Essa é uma distância que não se recupera com treinos, nem palestras; recupera-se ganhando e, sobretudo, sofrendo jogos como o de ontem à noite, com a consciência de que não haverá muito melhor nem mais difícil. Aqueles são os limites do futebol. A Selecção sentiu-os na pele e viveu para contar, ainda que o tenha feito à custa da falta de limites de Ronaldo. Descontando o factor monstro e a escassez de jogos destes no portfolio da maioria dos colegas (nem a final do Europeu teve um grau de dificuldade tão alto), Fernando Santos viveu uma noite muito rentável, mesmo acabando no empate do costume e sabendo que talvez venha a ser usado, como em 2016, para desvalorizar a equipa dele. Antes que o façam, fica um contributo: foi uma grande noite de bola, cheia de pequenas nuances, que vão das mais corriqueiras (como o VAR) até às mais profundas, como a questão filosófica entre a posse e os desapossados. Mais: a selecção de Santos fez muito e tem por onde melhorar; a de Hierro joga tão bem que não se vê como possa fazê-lo."

José Manuel Ribeiro, in O Jogo

Benfiquismo (DCCCLX)

9 golos !!!

Por. vs. Esp. !!!!

Jogo Limpo... Guerra & Rola

Circus Lagartus - XXVIII episódio

Mundial, dia 2: Só Cristiano Ronaldo podia assinar esta injustiça fantástica

"Ronaldo, e os seus três golos, foram uma injustiça à solta num jogo que a Espanha fez tudo para merecer ganhar - e que Portugal não soube por duas vezes defender. Mas quem tem Cristiano Ronaldo pode sempre sonhar. Até com imitações de milagre.

Cristiano Ronaldo! Que dizer? Talvez que, para falar deste jogador, é preciso recorrer ao dicionário e mesmo aí as palavras já só podem ser repetidas. Sou, portanto, substantivo: “o homem” fez um golo a abrir, a partir do nada; marcou outro a fechar a primeira parte, numa altura sempre importante; e, quando já tudo parecia perdido, para um adversário que mostrara ser superior, respirou fundo, concentrou-se, e arrancou uma cobrança de falta irrepreensível. Parece fácil mas é preciso confiança, personalidade e ser capaz. Conjugar tudo isso, a dois minutos do fim, num campeonato do Mundo, durante um jogo extremamente importante, só está ao alcance de muito poucos ao longo da História deste desporto-espectáculo. Por isso, revisito o dicionário e as palavras tantas vezes gastas: fantástico, magistral, lendário, sublime, estratosférico… E acrescento outra: injusto. Sim, injusto! Este empate (3-3) é injusto. Se aquilo acontecesse a Portugal, seria o que todos diríamos.
Ronaldo, e os seus três golos, foram uma injustiça à solta num jogo que a Espanha fez tudo para merecer ganhar – e que Portugal não soube por duas vezes defender. Mas quem tem Cristiano Ronaldo pode sempre sonhar. Até com imitações de milagre.
O que se viu ontem em Sochi, como na célebre exibição do “playoff” de apuramento para o Mundial do Brasil, com outros três golos numa noite em Estocolmo (3-2), são coisas que só vistas, e sempre para lembrar no futuro. Cristiano Ronaldo mudou dentro do campo. Já não é o extremo-goleador supersónico de outros tempos. Mas não mudou nem na vontade nem na classe. Ao mesmo tempo que se reinventou, nesses aspectos até melhorou. Simplesmente espectacular! Tudo o que fez, ao longo dos 90 minutos, foi bem feito. Um jogo enorme, à beira da perfeição, de participação no colectivo. Só ele podia ter cometido uma injustiça assim, marcando num jogo tantos golos como nos três Mundiais anteriores. Quem sabe se não deu o pontapé de saída para mais uma vez voltar a ser, para a FIFA, aquilo que é para os adeptos do futebol em Portugal: o melhor do mundo.
Volto atrás, ao princípio do jogo.
Portugal teve tudo a seu favor para conseguir um resultado positivo de forma mais fácil, mas a Espanha mostrou como é magistral no controlo da bola, no domínio do espaço, na inteligência em movimento, na paciência para abrir a defesa contrária. Neste aspecto, a equipa de Fernando Hierro só tem paralelo na do Brasil. Pode alegar-se que empatou indevidamente, num lance em que Diego Costa fez uma falta evidente sobre Pepe (que o vídeo-árbitro não assinalou, como deveria). Sim, pode. Mas tem de se reconhecer, também, que esse momento, aos 24 minutos, marcou o início da consolidação do jogo espanhol, apenas interrompido pelo monumental “frango” de De Gea num lance inventado por Ronaldo. O guarda-redes espanhol, que já esteve muito mal num particular com a Suíça (1-1), voltou a comprometer a sua equipa, na qual não se sentiu a mudança de treinador. O jogo está demasiado consolidado para abanar.
Este empate deixa algumas reflexões em aberto para os próximos dias. A primeira é se João Mário não faz mais sentido do que Bruno Fernandes, pela experiência e capacidade de promover a posse de bola. A outra é se, nos jogos que aí vêm, contra equipas mais defensivas, não é melhor ter André Silva de início. Gonçalo Guedes é um excelente jogador mas pareceu sentir em demasia a responsabilidade e o momento. Na primeira parte, em duas jogadas, teve nas pernas e na cabeça toda a pressão de jogar um Mundial.
E, sim, a defesa não esteve bem. Melhor dizendo: a equipa de Fernando Santos não defendeu como devia na maior parte do tempo. Começou a prometer fechar com esmero, pressionando alto, mas depressa descambou. É aí que se deve reconhecer o enorme mérito da equipa espanhola. Enfrentar David Silva, Iniesta, Isco e companhia a jogarem ao primeiro toque, abrindo e correndo, não é fácil. Os jogos seguintes serão diferentes. É preciso atenção mas não haverá este circo infernal que torna todos os lances capazes de serem um perigo.
Por várias razões, o empate merece ser festejado. Coloca Portugal no caminho do apuramento se a lógica se confirmar. E isso, como todos vimos, esteve mesmo para não acontecer. Uff!…"

O Araquíri Espanhol e o Ronaldo que Bate Bem

"Quaresma entrou e cumpriu na íntegra as indicações do treinador: fez um remate de trivela, ameaçou um apanha-bolas russo e insultou o árbitro.

Dizia-me um amigo, que gosta muito do mês do Mundial, da sucessão de jogos, dos equipamentos coloridos, dos adeptos exuberantes, que tem pouca paciência para os encontros da fase de grupos, sobretudo quando os “caprichos do destino” (ele fala assim, com o tom oracular dos diários desportivos) juntam selecções como Panamá e Tunísia ou Japão e Senegal. Olhei-o com alguma compaixão e depois expliquei-lhe que ele, na verdade, não gosta do Mundial porque o interesse de um Mundial não reside nos jogos que toda a gente quer ver – um Alemanha-Brasil ou um França-Argentina – mas naquelas partidas extravagantes que, em circunstâncias normais, o adepto comum pagaria para não assistir. O Mundial não é fascinante apesar de um Marrocos-Irão. É fascinante porque um cidadão respeitável, sem dívidas ao Estado português (a não ser uma multa por excesso de velocidade ainda dentro do prazo de pagamento), é capaz de almoçar à pressa para se sentar no sofá a ver um Marrocos-Irão e impor à família um regime de silêncio absoluto enquanto se ouvem os hinos nacionais.
É um facto que hoje, na era da informação, o exotismo futebolístico no Mundial se encontra ameaçado. Quase todas as selecções têm a sua estrela planetária. Marrocos, por exemplo, tem o central da Juventus, Mehdi Bhenatia, e quase todos os outros jogadores – a maioria dos quais nascidos em França – jogam em clubes europeus. Felizmente, o Irão ainda resiste e sendo certo que alguns dos seus jogadores actuam ao serviço de potências estrangeiras, como o Marítimo, outros ainda são recrutados em curiosas colectividades locais como o Persepolis, o Esteghlal Theran ou o Padideh.
O Mundial é também o palco preferencial para o sub-género de treinador pós-colonial: o ocidental evangelizador que vai ensinar os bárbaros a jogar à bola. Também nisto o Marrocos-Irão é exemplar. Prosseguindo uma tradição antiga, enviámos para o Oriente o professor Queirós – o nosso Bora Milutinovic – acompanhado de um adjunto cujo nome é quase um resumo da empreitada dos descobrimentos, Oceano Cruz. Os franceses também puseram o seu representante à frente da selecção marroquina, um tal Hervé Renard, de olhar matreiro, como o nome indica, e com todas as condições para daqui a uns anos receber um dos epítetos que invariavelmente recaem sobre os treinadores europeus que visitam tão distantes paragens: o feiticeiro branco, o soba das neves ou o xamã despigmentado.
Ao contrário do que a presença de Carlos Queirós num dos bancos poderia fazer supor, o jogo foi animado. Teve um pouco de tudo, sendo que desse tudo o mais foram entradas algo paleolíticas, livres destinados a reduzir a fauna aviária de São Petersburgo e, perto do final, um versão magrebino-persa de um sururu latino-americano. Se, de início, o Irão exibiu o clássico estilo retentivo das equipas do professor, depois soltou-se e, para choque da comunidade internacional, chegou mesmo a aproximar-se da baliza adversária. Os jogadores marroquinos demonstraram excelentes dotes técnicos e muita cerimónia na hora de rematar à baliza – não fosse Casablanca a capital mais próxima de Lisboa – excepto à deles, como eloquentemente demonstrado pelo avançado Bouhaddouz, autor de um fabuloso autogolo.
Uma das vantagens de jogos como um Marrocos-Irão é que podemos começar a torcer por uma equipa, acabar a torcer por outra e encontrar motivos de satisfação qualquer que seja o resultado. Por imperativo patriótico, tal descontracção já não é admissível quando joga Portugal. De espectador desinteressado e diletante transformei-me em fanático roedor de unhas. Aos três minutos, já tinha insultado seis espanhóis, incluindo quatro vezes o Busquets, e a vasta equipa de arbitragem. (Como tele-espectador agradeço a introdução do VAR neste Mundial porque oferece um árbitro exclusivo para os insultos de quem está em casa.)
A crise espanhola a meio da semana não tinha aumentado o meu optimismo. A confusão no adversário é sempre bem-vinda, mas quando do caos resulta o despedimento de um treinador como Julen Lopetegui, festejos antecipados são imprudentes. As notícias do hara-kiri (do espanhol araquíri, planta venenosa muito usada por suicidas andaluzes) foram manifestamente exageradas. Muitos destes jogadores espanhóis foram campeões europeus e mundiais sob orientação de Luis Aragonés e de Vicente Del Bosque, ou seja, a necessidade que têm de um treinador é meramente burocrática. O que também se aplica a outros casos. Veja-se o de Portugal, que só foi campeão europeu quando, em vez de um treinador, contratou o padre Fontes. (Estou a brincar, claro, o padre Fontes nunca trabalhou para a FPF). Para atenuar os meus receios li uma notícia que dava conta da evolução da federação portuguesa ao longo dos anos. O jornal Record falava da preocupação da equipa técnica portuguesa com o estado do relvado em Sochi: “O técnico pisou o tapete verde bem no centro do terreno e passou a ideia de que algo poderia não estar bem.” Há 32 anos, um grupo de excursionistas portugueses por terras mexicanas chegou a treinar num campo inclinado. Agora, temos um treinador-engenheiro que, com expressões de silvicultor, se põe a estudar as condições da flora russa.
Bem, quanto ao jogo, nem os nervos me impediram de ver a nossa entrada de rompante. Tivemos ainda uma grande oportunidade para fazer o 2-0, mas passámos o resto da primeira parte à rabia. Chegar ao grande círculo tornou-se uma quimera, uma espécie de El Dorado de que os antepassados de Ronaldo, Guedes e Companhia tinham ouvido falar mas cuja existência os seus descendentes já não poderiam provar. Conhecem aquelas histórias do gémeo bom e do gémeo mau separados à nascença? São Diego Costa e Pepe, só que aqui ambos os gémeos são maus. O brasileiro naturalizado espanhol ultrapassou o brasileiro naturalizado português com um golpe de que este se queixou mas que intimamente terá aplaudido, e marcou um golo usando José Fonte como pino.
Neste período crítico, a densidade populacional no meio-campo de Espanha era semelhante à das Ilhas Selvagens e, para o comprovar, quase no final da primeira parte, De Gea revelou-se tão útil a defender a baliza de Espanha como uma cagarra. O espírito de Loris Karius desceu sobre o guardião e, a ler muito devagarinho e a escrever muito torto, Portugal chegou ao intervalo a ganhar (afinal, como é que fomos campeões europeus? A jogar bem é que não foi.) Na segunda parte, a Espanha, com dois golos atípicos, passou para a frente do jogo e os jogadores portugueses rescindiram contrato com a bola alegando justa causa por falta de contacto físico e visual. A perder, Fernando Santos olhou para o banco à procura de Éder. Não o encontrando, lançou João Mário. Depois, entrou Quaresma, que cumpriu na íntegra as indicações do treinador: fez um remate de trivela, ameaçou um apanha-bolas russo e insultou o árbitro. Por esta altura, já todos nos tínhamos esquecido, e os espanhóis também, que Cristiano Ronaldo continuava em campo. Quando ele pegou na bola para marcar o livre lembrei-me das dezenas de livres que já o vi marcar em desespero de causa, mais em força do que em jeito, e ele, só para me contrariar, marcou o melhor livre da carreira na categoria mais em jeito do que em força. Dá gosto ser contrariado assim. Afinal, bates mesmo bem, Ronaldo."

Sporting suculento e recheado

"O presidente do Sporting luta contra destino certo de forma quixotesca, levando a sobrevivência pessoal para patamares nunca antes frequentados

Por estes tempos Bruno de Carvalho faz lembrar a odisseia de Pedro Dias quando andou a monte. O protagonista fugia a todas as polícias, ludibriava todas as dificuldades, sobrevivia a pão e água, ninguém o detinha, era a notícia permanente, parte da opinião pública já sentia uma simpatia pelos seus feitos de herói improvável, independentemente da gravidade dos seus actos.
Também o presidente do Sporting luta contra um destino certo, de forma quixotesca (para alguns grotesca), levando a arte da sobrevivência pessoal para patamares nunca antes frequentados no desporto nacional.
Desapareceram os apoios o líder leonino, fugiram-lhe os jogadores, rareia e bom senso, falta-lhe o sentido de oportunidade, mas não lhe falta nem a coragem, nem a determinação.
Numa época de defeso, com tão poucas notícias relevantes, até me parece mais divertida esta novela verde e branca, que ter que ver directos da Rússia para me elucidar sobre o penteado do Ronaldo, qual o vestido da jornalista mexicana que gosta de Portugal, que prato prefere o único português que vive a 200 Km de Kratovo, sobre a expectativa do cozinheiro que prepara o pequeno almoço, ou qual a nacionalidade do homem que corta a relva do campo de treinos.
Com a soporífera e irrelevante catadupa noticiosa vinda da Rússia, este Sporting é suculento e recheado de interesse, numa época de escassas notícias.

O Benfica realizou esta semana a sua assembleia geral com êxito e urbanidade.
Lançada por alguns meios de comunicação social em moldes catastróficos, vivemos uma assembleia de um clube grande, institucionalmente maduro, onde as críticas, sugestões e elogios conviveram em clima de grande benfiquismo para desgosto de quem se alimenta dos nossos fracassos ou percalços.
Foi em assembleia geral à Benfica que se aprovou (79,5 por centro) o orçamento, e será à Benfica que se lançará a próxima época.
O Benfica desta pré-época parece acertar nas contratações, antecipou as necessidades e não esperou pelo fim do mercado.
A 31 de Agosto, já foram disputados nove pontos da liga nacional, e uma entrada na liga dos campeões que significa milhões.
Não há tempo a perder, com tanto que há para ganhar. Este ano estou a gostar."

Sìlvio Cervan, in A Bola