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terça-feira, 10 de novembro de 2020

No ponto mais alto da lenda


"Ainda a propósito dos 80 anos de Pelé, cumpridos no dia 23 de Outubro, e o fantástico Benfica 2-5 Santos para a segunda mão na Taça Intercontinental de 1962. Lisboa pôde ver todo o talento de Edson Arantes do Nascimento em todo o seu esplendor.

O próprio Edson Arantes do Nascimento (por extenso, Pelé, como dizia o grande cronista brasileiro Nelson Rodrigues) guardava com carinho, na memória, a noite impressionante da Luz de 11 de Outubro de 1962. O que o crioulo fez em Lisboa entrou para a lenda. Sofreu o Benfica, mas os grandes clubes têm a sua história ligada a vitórias e a derrotas memoráveis, e por aí se mede a sua grandeza. Pelé foi divino. E Deus vê-se nos pormenores.
Toda a imprensa internacional veio de cambulhada para Lisboa. O Benfica-Santos era o jogo dos jogos!
E era Eusébio contra Pelé também. Um duelo que se prolongou ao longo dos tempos, ora a favor de um, ora a favor do outro.
No estádio, em redor do estádio, o espanto, a surpresa, a estupefacção.
Gabriel Hanot: mestre do jornalismo, figura máxima do L'Équipe, pai da Taça dos Campeões Europeus, autoridade máxima na crítica do futebol. Hanot tinha um fascínio imenso pelo Benfica. Era, nessa noite, um francês desiludido: 'Custa dizê-lo, mas o Benfica perdeu porque jogou mal. E porque Costa Pereia, sem posição na baliza ou fora dela, sem segurança de mãos, também ajudou ao descalabro. Em segundo lugar, o Benfica não demonstrou ter conjunto. Não encontrou o seu estilo de jogo e que eu já vi em outras ocasiões. Julgo que José Augusto, a quem já considerei o melhor extremo-direito da Europa, não está em forma. Há dois anos era o n.º 1. Agora, pelos vistos, teve uma queda vertical. Os dois interiores, Coluna e Santana, também não cumpriram. Eusébio foi, quando a mim, o único jogador do Benfica ao nível da classe dos jogadores dos Santos. Também a revelar categoria esteve o n.º 11, Simões, com os seus raides velozes a caminho da grande área contrária, obrigando a defesa brasileira a conceder cantos em série. Já vi os campeões da Europa jogaram na Dinamarca, em Viena, em Berna; vi os jogos que fizeram contra o Tottenham e o Real Madrid. Pois bem, o Benfica fez contra o Santos a mais fraca das exibições que tive ocasião de presenciar'.
Era preciso um daqueles habituais Benficas monstruosos para bater o Santos. E o Benfica não conseguiu sê-lo.

Vai, minha tristeza...
O João Gilberto cantava Jobim:
'Vai, minha tristeza
E diz a ela
Que sem ela não pode ser...'
A tristeza encarnada tomou conta da Luz.
Carlos Pinhão, outro dois monstros sagrados do jornalismo: 'Apetece dizer: «Com Pelé não vale...» Um desafio é uma coisa, Pelé é outra. Com Pelé de uma lado, não há desafio, não há despique, não há equilíbrio possível. Apetecia acrescentar: «Tirem Pelé e venham, então, jogar com o Benfica...» Em Pelé tudo é simples, tremendamente simples e... fácil. Ele é apenas uma perna que se estica, um pé que se dobra, um pescoço que sobe, um tronco que se estende. Um tropeção na bola que faz com que ela siga à frente do negrito; um toque que leva o esférico a contornar, a dois milímetros de distância, o bico da bota do adversário (sem que este possa estender o pé ao menos mais um milímetro); um acelerar de segundos, que faz passar aquele 'veículo' da bola de 40 para 100 quilómetros à hora em cinco metros de terreno, e aí está Pelé, o magnífico Pelé, em frente de um guarda-redes, ora perguntando-lhe por onde que passe a bola, ora dando-a, em bandeja de prata, a um companheiro de equipa para que este gaste apenas a tinta do ponto final... Pelé é único. E chamar-lhe monstro, rei, santo, que sabemos nós desta desenfreada ânsia de o exaltar, é sempre tarefa inacabada. Pelé é Pelé. Não se caracteriza, não se retrata, não se define. No caso do Benfica, deste infeliz Benfica de anteontem à noite, sofre-se, apenas se sofre'.
Prosa extraordinária. Tenho pena de não ser minha, de não ter talento para tanto. Mas sirvo-me a si, leitor, na bandeja de prata de um dos momentos mais extraordinários a história do futebol de todos os tempos. O Benfica perdeu, é certo. E a derrota foi dura. Mas estava lá. Estava no lugar que é seu: no ponto mas alto da lenda!"

Afonso de Melo, in O Benfica

Dar a volta por cima com 'dignidade e desportivismo'


"Em 1939, o Benfica suspendeu o andebol. Arbitragem, violência e cansaço dos atletas foram as causas. Valeria a pena voltar?

Em 26 de Fevereiro de 1939, os 'encarnados' enfrentaram o Carcavelinhos FC na Tapadinha para a 8.ª jornada do Campeonato de Lisboa de andebol, disputado por onze equipas. O Benfica estava em 5.º lugar na tabela e o adversário era o lanterna-vermelha.
O jogo decorreu da pior maneira e foi anulado. Criticados 'pela excessiva dureza' ao longo da partida, três jogadores adversários acabaram expulsos. Com eles seguiu o benfiquista Carlos Vasques Filipe, que defendeu a sua equipa. Mesmo assim, a violência não refreou. O público invadiu o campo, obrigando o árbitro a pedir proteção PSP, dando o encontro por terminado a cinco minutos do final. O Benfica foi, no fim, elogiado pela sua dignidade e desportivismo.
As duas partidas não se realizaram por falta de comparência de alguns atletas. Alegando desentendimento entre atletas e Clube, a direcção de Júlio Ribeiro da Costa viu-se 'forçada, para prestigio do clube, a suspender' a secção em 10 de Março. O facto estranhou, pois, a equipa era uma boa referência no meio andebolístico, e afectou 'da maneira sensível a propaganda da handball'. Só na mesmo época, pelo menos o GD 'Os Treze' e o Carcavelinhos FC desistiram da prática do andebol. No ano seguinte, tentou-se retomar a actividade no Benfica, sem sucesso.
O cansaço dos jogadores foi uma das razões para a interrupção, pois praticavam mais que uma modalidade, jogando várias vezes por semana. A arbitragem era vista como deficiente para uma modalidade recente em Portugal. Mas pior que tudo era o público: desinteressado e violência. Tudo isto resultou na desistência por parte dos atletas pelo andebol.
Só em 14 de Fevereiro de 1943 o Benfica regressaria ao andebol, com uma única categoria a título experimental, num campeonato com seis equipas inscritas. A arbitragem, com 'falta de personalidade e subserviência condenável às exigências do público', continuava 'demasiado tolerante', tirando 'todo o brilho' à modalidade. Um árbitro acabou mesmo por ser violentamente agredido no campo do Marvilense FC.
Apesar do fraco resultado do Benfica nesse ano, a secção estava de volta depois de algum tempo de insistência e com jogadores exclusivos na sua prática. A modalidade desenvolveu-se nos anos seguintes. Em 1946 já se notava, 'com satisfação', o progresso da modalidade porque a categoria de juniores, com um ano de existência, foi campeã de Lisboa.
Seis anos depois, foi a vez dos jogadores de honra se sagraram campeões regionais, o que parece sugerir que a interrupção que a modalidade sofreu não foi negativa, pelo contrário, serviu para tomar balanço e avançar rumo à glória.
Pode saber mais sobre o mundo andebolístico do Benfica na área 3 - Orgulho Eclético do Museu Benfica - Cosme Damião."

Pedro S. Amorim, in O Benfica

Problemas encarnados – Mais do que sem bola, Mais do que erros da linha defensiva


"No Futebol Total do Canal 11, o Pedro Bouças falou sobre a forma como o Benfica tem consentido ocasiões de perigo aos adversários.
Mais do que a face mais visível – Erros no processo defensivo por parte dos centrais – há também problemas com bola e dificuldades evidentes na linha média."

Balanço


"Com a segunda paragem, na temporada, das competições de clubes, em virtude dos compromissos das seleções, importa fazer um balanço dos primeiros dois meses de atividade em 2020/21.
No Campeonato Nacional estão disputadas sete jornadas e o Benfica ocupa o segundo posto da classificação, em igualdade pontual com o Braga, a quatro pontos da liderança.
A nossa equipa atingiu o pleno de vitórias nas cinco primeiras jornadas, algo que não acontecia desde a época 1982/83. As duas derrotas seguintes, no Bessa e na Luz frente ao Braga, foram surpreendentes, tendo em conta o início fulgurante na prova.
Nas competições europeias, encontramo-nos a disputar a Liga Europa, inseridos no grupo D, após a eliminação na fase de acesso à Liga dos Campeões, num único jogo, o primeiro da temporada, na Grécia.
O primeiro lugar no grupo, a par do Rangers, é fruto de dois triunfos (Lech Poznan, na Polónia; Standard Liège, na Luz) e um empate (Rangers, na Luz). A passagem à fase seguinte está bem encaminhada, mas há ainda três partidas por disputar, sendo que duas delas serão realizadas no reduto de adversários.
Jorge Jesus tem promovido a rotação do plantel desde o início da temporada, com apenas cinco jogadores a participarem em todos os jogos: Darwin, Everton, Odysseas, Pizzi e Rafa. Vertonghen, Waldschmidt e Weigl marcaram presença em dez encontros. Só Everton e Odysseas perfizeram o pleno da titularidade nas onze partidas.
Entre os titulares mais frequentes seguem-se Vertonghen, com dez presenças no onze inicial, e Darwin e Pizzi, com nove. Odysseas (único totalista), Vertonghen, Everton e Darwin são os que têm mais minutos de utilização, entre os 26 utilizados. Weigl, Seferovic e Nuno Tavares compõem o trio de jogadores a que Jorge Jesus mais recorreu a partir do banco de suplentes.
No capítulo da finalização, com a equipa a apresentar uma média de golos por jogo ligeiramente superior a três (34 em 11 jogos), Seferovic, com seis, Darwin e Waldschmidt, com cinco, Pizzi, com quatro, e Rafa, com três, são os atletas que mais se têm destacado. Darwin lidera no capítulo das assistências, com seis, seguido de Everton, com quatro, e Grimaldo e Rafa, com três.
O regresso às competições está agendado para dia 21 de novembro, com o Benfica a visitar o Paredes na 3.ª eliminatória da Taça de Portugal. Seguir-se-ão as deslocações ao Rangers e ao Marítimo."

Benfica FM #133 - Rangers, Braga...

Se isto é errado, eu não quero estar certo


"Sempre fui um fã de rádio e foi através da rádio que vivi um dos momentos mais vibrantes da minha vida. Lembro-me perfeitamente de acompanhar o mítico Porto X Benfica de 1991 que ganhámos com dois golos do César Brito. Deitado na cama dos meus pais, ouvi o relato do jogo num aparelho cor de laranja que só apanhava as rádios locais e a Renascença. Apesar de não ter visto o jogo, sentia-se na voz do relatador, e no som ambiente do estádio, toda a tensão associada àquele encontro: o Porto tinha eliminado o Benfica, uns dias antes, para a taça, apesar de termos jogado muito bem, e este jogo era decisivo para apurar o campeão. O clima, esse, era irrespirável, com declarações (e ações) incendiárias que, lamentavelmente, fizeram escola. A alegria sentida aquando dos golos da nossa equipa foi indescritível. Não foi só um campeonato que se ganhou: foi um daqueles jogos que define o que é ser Benfica. É dar tudo. É ir à luta. É sair por cima quando já ninguém dá nada por nós. Isso é Benfica.
O meu primeiro ídolo vestia a camisola 6 e chamava-se Jonas Thern. Sei que a maioria dos miúdos gosta dos avançados ou dos jogadores vistosos, mas eu gostava daquele sueco discreto que varria o meio-campo com uma classe incrível. No Natal de 1990, recebi uma camisola encarnada ainda com o patrocínio da FNAC – o equipamento completo, com meias e tudo! Meias grossas, pareciam lixa, mas pronto: o importante é que eram Benfica. Na minha família direta todos eram Benfica, mas ninguém era sócio. Quando me fiz adulto, fui estudar para Lisboa e tornei-me sócio, em pleno Vietname. Sofri, como todos sofremos nessa altura. Passados 3 anos, a vida deu uma volta grande e tive de deixar de ser sócio: ou pagava as quotas ou punha comida na mesa, era assim tão simples. Foi duro, mas tinha de ser. A paixão foi-se desvanecendo, mas ia sempre acompanhando o Benfica.
No último ano e meio, fui voltando a descobrir o Benfica, muito graças a projetos como o Benfica Independente que, com os seus podcasts, fizeram-me recordar o rapaz que ouvia rádio no aparelho cor de laranja. Ouvir o Benfica FM ou a História Gloriosa, entre outros, foi também uma forma de reacender essa paixão. Aqueles programas são Benfica e fizeram-me (voltar a) perceber como é bom ser do Benfica.
Apesar de não poder votar, acompanhei as eleições para o nosso clube com muito interesse. É verdade que não foi um processo isento de críticas (com a falta de debates à cabeça), mas isso não me impediu de viver o dia 28 de outubro com a inquietação própria de quem sabia que aquele era um dia importante. O resultado não foi aquele que mais desejava, mas não foi por isso que me desiludi, bem pelo contrário. O dia das eleições não só foi antecipado com pouca antecedência, como se realizou no meio da uma pandemia, numa quarta-feira, e mesmo assim contou com a participação de 40 mil associados. Ver esta mobilização gigantesca e ordeira para decidir sobre o futuro do clube, foi algo realmente comovente e impressionante. “Como é que eu não faço parte disto?”, pensei várias vezes. O resultado eleitoral foi o que foi. Parabéns a todos aqueles que participaram. Sinceramente. Agora, só quero que o Benfica ganhe. Quando explico a algumas pessoas o que sinto pelo Benfica, e que retomei a minha condição de sócio, ficam a olhar para mim como se padecesse de alguma maleita ou algo estivesse errado. Bem, se isto é errado, eu não quero estar certo. Por isso digo, com orgulho, que sou Benfica. Voltei a ser sócio do clube do meu avô, do Jonas Thern e do César Brito. Sou Benfica e isso, para além de eterno, também me envaidece."

Black Friday

Que futuro!


"A nossa única tábua de salvação, como sector, passa a ser o valor recebido pelos direitos televisivos e agarramo-nos a uma das únicas certezas que temos: os jogos não podem parar. Há um ano, a Liga Portugal alertava para as grandes assimetrias entre os orçamentos das equipas profissionais portuguesas, para a falta de competitividade interna e externa, para um modelo de negócio cansado e incapaz de suportar economicamente alterações estruturais.

Pressionava aqui e ali, junto da FPF (que acabou por desenvolver um estudo estruturante com a McKinsey) e do Governo (que parou para pensar no modelo de centralização dos direitos audiovisuais), reclamou um tratamento diferente, alertando que contribui para o PIB nacional com 0,27%, mais de dois mil postos de trabalho e pagando impostos de 150 milhões de euros (34 empresas/sociedades desportivas). Pedia apoio para um processo urgente de internacionalização e reclamava que as PME do sector tivessem o mesmo tratamento que as demais, solicitava alterações urgentes na lei dos seguros, ajustamento de impostos, uma mão mais pesada contra a violência, entre outros pontos fundamentais. Promovia, e continuará sempre a promover, um Futebol Positivo, garantindo que os líderes deste sector compreendem o impacto que a “espuma política” do mesmo têm de negativo junto de patrocinadores, Governo e público em geral.
De repente, perante uma terceira guerra mundial, agora contra um vírus, ficamos petrificados sobre que futuro esperar! As receitas a diminuir, por todas as vias – os patrocinadores afetados drasticamente por uma crise rápida e sem dimensão conhecida, incerteza sobre o futuro, os ativos (jogadores) a desvalorizar, impedidos de colocar público livremente nas bancadas e com o mercado de transferências abalado mundialmente, principalmente nas principais 5 ligas europeias.
A nossa única tábua de salvação, como sector, passa a ser o valor recebido pelos direitos televisivos e agarramo-nos a uma das únicas certezas que temos: os jogos não podem parar, o calendário (muito complicado com menos dois meses) tem de ser cumprido. Temos que garantir que protegemos a indústria criando regras que nos permitam manter os riscos de segurança higiénica baixos.
Olhemos para números, considerando estimativas e esperando pelo melhor. Num sector em que os rendimentos totais são de 858 milhões euros, poderemos ter uma quebra de 115,5 milhões de euros por não ser possível público nos dias de jogos (bilhética, corporate, comercial, merchandising e quotas). Se não conseguirmos terminar o campeonato, o dano total poderá ascender a 350 milhões de euros. Não contabilizando nenhuma quebra dos valores de transferências anuais de jogadores, que rondam estatisticamente entre os 250 a 300 milhões de euros por ano. Este cenário de fatalidade implicaria um valor de receitas médio, por clube, de 6 milhões de euros versus os “normais” 25 milhões de euros, ou seja, o fim do sector como o conhecemos.
Uma coisa é certa, preocupemo-nos agora com a sobrevivência do sector a curto prazo e em garantir que todas as empresas cumpram os pressupostos financeiros para se manterem nas competições, mas sejamos claros sobre as mudanças estruturais que serão necessárias fazer para o sector sobreviver a longo prazo."

Fever Pitch - João & Markus... Alemanha!