"Um destes dias, aconteceu benfiquismo. Sem ser uma iniciativa 'oficial', a inauguração da placa que indica o local onde nasceu a primeira ideia do nosso Benfica, em Belém. O mesmo benfiquismo que construiu, À força de donativos e rifas, a nossa 'catedral' da Luz, a original.
Uma das coisas mais extraordinárias do Benfica é este 'ser benfiquista' colectivo. Este sentir, que não está preso nem a presidentes, nem a cargos, nem a bilhetes oferecidos, nem a viagens de avião da equipa, nem a lugares no parque, nem a mais nada que não seja... esta chama imensa. Fiquei feliz por perceber que ainda há Benfica assim. E porque se fez memória, que é de todos e de todos nós, benfiquistas, devia ser conhecida. Quem foi quem e o que fez, no universo do benfiquismo, é para mim uma tarefa essencial para que o Sport Lisboa e Benfica continue a ser, para sempre, o maior de Portugal. É por isso também que aguardo ansiosamente a inauguração do museu. Espero é que o museu tenha espaço previsto para mutos novos troféus, que é de vitórias que se faz o Benfica, não pode ser só de orgulhosos recordações.
Sou do Benfica. Sou orgulhosamente do Benfica. Fico triste, irritado, frustrado, aziado, f... quando perde. Fico mesmo feliz quando ganha. No futebol e em tudo. O meu sonho de menino era jogar no Benfica, fiquei pelas provas de aptidão, e já foi bom. E por um dia, este ano, em que cumpri o sonho de uma vida e, sim, joguei pelo meu clube, na Luz. Que privilégio. Lembro-me desse dia todos os dias. Todos.
Não sei porque sou do Benfica, sei que havia um motorista da carrinha da escola, naturalmente chamado Zé Manel e com bigode (true story), que punha a malta a cantar: 'Quem fala mal do Benfica ou tem inveja ou é xexé'. Abençoado Zé Manel! Ser do Benfica. Tão bom.
Estava em Vigo naquela noite. E nos 7-1 em Alvalade. E nos 0-5, com o Porto, na Luz.
Chorei quando o Veloso falhou o penálti em Estugarda e quando o Lozano nos tramou na final da UEFA em 1983.
Mas todas as vitórias, toda as que vi na Luz antiga e na Luz nova, nas Antas, em Alvalade, em Londres, em Roma, nas finais da Taça, nos torneios todos, caramba todos os golos do Benfica são felicidade, todos.
Ser do Benfica, tão bom. Leverkusen, Vata, José e Rui Águas, Eriksson, Toni. Fernando Martins, Jorge de Brito, Luís Filipe Vieira. Eusébio, Coluna, José Augusto, Torres, Simões, todos os que não vi e fizeram o benfiquismo. Carlos Manuel, Chalana, Bento, Pietra, Humberto Coelho, os Bastos Lopes, o Schwartz, o Stromberg e o Manniche. Carlos Mozer e Ricardo Gomes. Vítor Baptista e Nené. Filopovic e Nélson Oliveira. Aimar e Rui Costa. O homem da bandeira e o homem da águia. O speaker que me irrita quando diz que 'não ouvi nada' e o estádio está aos gritos a puxar pelo Benfica. João Alves e Shéu. Futre de encarnado. E Valdo, João Vieira Pinto, Gamarra, Isaías, José Luís, António Leitão, José Gonçalves, Livramento, Picas e Piruças. Alexandre Yokochi e Carlos Lisboa. João Queimado e Francisco Lázaro. Cosme Damião e Nélson Évora. José Galvão, Telma Monteiro, Vanessa Fernandes, José Maria Nicolau. Preud'Homme e Costa Pereira. Béla Guttmann e Jorge Jesus. Mário Wilson e Trapattoni. José António Camacho e Miklos Fehér. Real Madrid, Manchester United, Liverpool, Barcelona, Bayern, Juventus, Milan a elite. Ser grande, saber sê-lo.
Nunca assobiar os nossos. Assobiar, sim, quando alguém com as nossas cores decide jogar contra nós e fazer rebentar um petardo num jogo da Champions. Isso não é o Benfica, não pode ser. Vamos encarar a coisa como um autogolo. Não devia, mas às vezes acontece.
O que é Benfica, somos todos nós, nas bancadas, por esse mundo fora. O Benfica é o benfiquismo de milhões de pessoas em todo o mundo, e estamos todos de parabéns. Eu, a Inês, o Gonçalo, a Mafalda e a pequenina Maria lá em casa. O mano João, o mano Bruno, o Manel, e outro Pedro, mais a João e os putos - todos Benfica!, o Zé Miguel, o Bruno, que manda mail quando subimos nas audiências e às vezes defende penáltis ao sábado; o Miguel, que jantou lá em casa no sábado; o mister Pedro, o mister Bruno que treina o meu filho, o Ricardo e os 15-a-zero, o grande Vítor, que leva as águas para a futebolada e é de uma generosidade comovente, o meu amigo Paulo Santos, o Paulo Alves, de Amarante, que vai do 'já fomos' ao 'faltam oito vitórias para sermos campeões', nos SMS a seguir aos jogos... todos os meus amigos, 'lampiões' como eu. Os meus companheiros de sector 3, piso 0, fila V, desde a senhora desesperada a dizer «Poças, Luisão, pá!' ao anti-Cardozo militante, que quando o paraguiaio faz golo é gozado por todos à volta. O pessoal da Tertúlia. O grande João, dos almoços no Terceiro Anel do senhor Gonçalves. O Sílvio Cervan, desesperado porque este texto nunca mais chegava. O tipo que não conheço de lado nenhum e me grita na rua, acenando: 'Pedro, Benfica!' Hoje apetece-me gritar: 'Viva o Benfica!' E não se ofendam os de outros clubes, que ser do Benfica é ser pelo Benfica e não anti qualquer outro clube. Ser do Benfica basta. Porque é tudo. 'Vermelho é um coração, Benfica a nossa paixão.' Ah, mas na época passada perderam-se cinco pontos em duas jornadas e ais-não-sei-quê... Não vêem que isso não tem anda a ver com o que estou aqui a tentar explicar? Ser do Benfica está muito acima disso. Seria do Benfica mesmo que estivesse nos distritais. Sócio 10.199, benquista, sempre. É a mística. E é só nossa."
Pedro Ribeiro, in Mística