Últimas indefectivações
sábado, 25 de janeiro de 2025
A um VAR da vitória mais épica de sempre
"«You find out life’s this game of inches. So is football. Because in either game, life or football, the margin for error is so small -- I mean one-half a step too late, or too early, and you don’t quite make it. One-half second too slow, too fast, you don’t quite catch it.»
Naqueles segundos (minutos? horas? O tempo pareceu voar e ser ao mesmo tempo eterno durante o Benfica-Barcelona de ontem na Luz) em que Raphinha marca e o árbitro decide que não vai ao VAR dar penálti ao Glorioso e valida o golo catalão, lembrei-me do mítico discurso de Al Pacino no filme Any Given Sunday.
Se Aursnes tivesse rematado um inch ao lado e marcado o 4-1... se Di Maria tem feito aquela isolada e direcionado a bola um inch para a direita e tem feito o 5-4. E, acima de tudo, se o VAR tem considerado penálti sobre o Barreiro... Meu Deus. É o «se» que nos está a doer. A azia. A revolta. A pena.
Porque, senhores, se o árbitro vai ao VAR, dá penálti e o 4-5 vira para 5-4, estávamos aqui a falar de um dos jogos mais épicos das nossas vidas de Benfiquistas. Só com paralelo com o 6-3 em Alvalade ou o 4-4 de Leverkusen. Seria a euforia daquele golo do André Gomes ao Porto em 2014, elevado ao cubo.
«Football, bloody hell», disse Alex Ferguson após a final da Liga dos Campeões com o Bayern em 1999, depois do seu Man Utd virar o 0-1 para 2-1 nos descontos. Bloody hell...indeed. Agora pensamos que devíamos ter defendido melhor, que as substituições não resultaram, que Di Maria e Amdouni entraram no jogo a dormir, que não podemos estar a vencer em casa por 4-2 aos 77 minutos e ir perder por 4-5, que podemos e devemos estar super irritados com a arbitragem.
Mas vou-me agarrar ao bem que Lage preparou este jogo. Ao quanto a equipa lutou. Ao quanto a equipa jogou. Ao quanto a Luz apoiou e incentivou.
Podíamos estar agora a falar do hat trick do Pavlidis, de termos estado a vencer por 3-1 e 4-2, do Barcelona ter celebrado o 4-5 e com o penálti termos virado para o 5-4. E a celebração para a História e para a Glória que teria sido na Luz. Enfim. Suspiro. Respirar fundo. Agora é descer à terra e jogar com este mesmo espírito com o Casa Pia como se jogou com o Barcelona. Se não, caros jogadores do Benfica que ontem honraram o Manto Sagrado...os elogios viram críticas. É assim no Benfica. Exigência constante.
O FC Porto perdeu com o Gil Vicente e despediu o seu treinador. Venceram a Supertaça, mas já foram eliminados da Taça de Portugal e da Taça da Liga. Não aparentam ter estofo para serem campeões ou vencer a Liga Europa. Arriscam-se a ir para apenas três campeonatos nos últimos 12 anos.
Longe vão os tempos em que dominavam com mão de ferro o futebol Português, como o fizeram nos anos 90 e até 2013. Onde faziam tris, tetras e pentas com uma aparente facilidade. Há uma hegemonia que morreu com aquele golo do Kelvin. Já venceram mais títulos desde aí, continuam sempre competitivos, mas não mais foram esmagadores.
Deixou de haver Pinto da Costa com sagacidade, deixou de haver macacos e super dragões, deixou de haver golpes de vista extraordinários para o mercado sul americano e deixou de haver dinheiro. E, tal como no Benfica de Vieira, o enriquecimento pessoal, as comissões e as negociatas tornaram-se tão prioridade como vencer campeonatos.
A auditoria que André Villas-Boas encomendou demonstra o que os dirigentes fazem atrás das cortinas, com o dinheiro dos adeptos de futebol. Não tenho dúvidas que um dia haverá um novo Presidente do Benfica, afastado do Vieirismo, e uma auditoria revelará o mesmo tipo de vícios de quem se sente impune e usa e abusa de dinheiro que não é seu e que devia estimar.
PS: Minuto 90 na Luz, 4 para o Benfica, 4 para o Barcelona. E vejo adeptos nos corredores a descerem as escadas para se irem embora. Eu sei que há pessoas que viajam de muito longe, eu sei que o trânsito se torna infernal e sair uns minutos antes pode fazer toda a diferença, mas mesmo assim não consigo entender. Verdadeiramente não consigo. Eu seria incapaz de virar as costas a um jogo assim (bom, a qualquer jogo do Benfica, mas ainda mais neste). Faz confusão. Mas é o que é, cada um vive o futebol e o clube à sua maneira."
Castigo
"Este é um texto que me custa particularmente escrever porque ao longo da minha vida sempre tive muita dificuldade em lidar com situações injustas. E estamos a falar sobre injustiças cometidas contra mim ou contra terceiros, simplesmente não consigo processar este sentimento. Fico a remoer a coisa, a pensar no que correu mal, no que poderia ter sido feito de forma diferente para alterar o desfecho final. Por muito ridículo que pareça, ainda hoje me lembro de um episódio muito antigo em que num dia de creche ajudei um colega mais novo a levantar-se depois de ter sido abalroado por um rapaz mais velho. O miúdo chorava que nem um bezerro e quando a educadora lhe perguntou o que se tinha passado apontou para mim sem hesitar. Fiquei de castigo enquanto o mentiroso e o outro brincavam felizes. Fui castigado por ter feito uma boa ação e não sei se aquilo me mudou para sempre ou se já tinha este sentido de justiça apurado, mas nunca o esqueci. E o que se passou ontem em campo foi uma injustiça tremenda à equipa do Benfica. Os nossos atletas não mereciam sair daquele jogo com um empate, muito menos com uma derrota nas circunstâncias que todos sabemos. O futebol mostrou o seu lado mais cruel e, infelizmente para os benfiquistas, também porque é um desporto absolutamente fascinante onde tudo pode acontecer. Esta é uma partida que recordaremos durante muito tempo pelos piores motivos, mas este jogo tem uma história que merece ser contada para além do resultado final.
Quando é que tudo começou a correr mal? O que fizemos para que isto acontecesse? Foi culpa nossa, do árbitro ou do destino? Possivelmente é um pouco de cada, mas no meio da absoluta infelicidade que nos une no dia de hoje existem aqui algumas lições importantes que não podemos mais ignorar.
Começando pela equipa que entrou em campo. Bravo! Interpretação quase perfeita das ideias do treinador durante cerca de 70 minutos e os atletas mereciam muito mais do que aquele triste final. Toda a gente focada, solidária, a explorar os defeitos do adversário na absoluta perfeição. O Barcelona é uma equipa que gosta de ter a bola, mas o processo de transição defensiva é complicado e aproveitámos isso ao máximo. Schjelderup brilhante a segurar a bola, pausar e esticar o jogo, Pavlidis numa noite de carreira em que tudo lhe saia bem, Akturkoglu menos expansivo mas extremamente ativo no jogo, Tino em modo polvo. Os outros sectores um pouco mais nervosos e com alguns erros inesperados, mas a equipa estava muito focada na missão e o plano estava a correr bem... até aos 71 minutos.
Lage preparou este jogo na perfeição. Entendeu muito bem o que o Barcelona tinha de melhor e pior, e preparou a equipa para isso. Só que, para mal dos nossos pecados, voltou a falhar no que já é uma imagem de marca sua: as substituições foram piorando a performance coletiva e convidaram o adversário a meter toda a carne no assador. Começou a pairar no ar um certo desconforto por já não conseguirmos sair com qualidade perante um adversário completamente lançado para a frente e com muita gente na área. E o que vou escrever de seguida vai aborrecer muita gente, mas é exatamente o que vejo e sinto: o Benfica não pode ficar refém das expectativas individuais dos jogadores, seja qual for o seu estatuto. Deixem-me ser muito claro, a entrada de Di Maria num jogo destes não fez sentido nenhum. Zero. O argentino só entrou porque Lage tem medo de perder o balneário e respeita em demasia o seu estatuto. O que vi ontem deixou-me profundamente desiludido. Di Maria não fez sequer um esforço por ajudar os colegas a conter a ofensiva adversária, entrou aos 71' e simplesmente demitiu-se de participar na lógica coletiva que imperava e fez o seu jogo. Esperou pela bola, mexia-se um pouco quando ela andava por perto... mas deixou Carreras (que grande, grande jogo do espanhol) sozinho para lidar com Yamal e depois Raphinha. E eu acho isto absolutamente lamentável e revelador que muitos dos problemas coletivos desta equipa nascem aqui.
Eu sei, eu sei. É o Di Maria. Supercraque, inúmeros títulos, grandes golos, o melhor marcador da equipa, etc. Nada disso está em causa e não estou a dizer que o argentino não pode jogar. No entanto, o coletivo não pode ficar refém do seu estatuto e a gestão dos seus minutos tem de ser feita com pinças por se tratar de um jogador com 36 anos. Temos de extrair o melhor que ele tem, e ainda é muito, mas isto não pode ser feito sem qualquer critério por medo da sua reação. O Benfica está acima de qualquer atleta, treinador ou presidente, ou pelo menos devia ser assim. Se Di Maria tiver de ficar no banco durante 90' num jogo em particular, que assim seja. Se tiver de descansar num jogo da Taça, que aconteça. Não podemos é continuar a prejudicar a fluidez do coletivo para acomodar um jogador que, neste momento, tem características que não encaixam na maneira como a equipa quer defender e pressionar. Não faz sentido.
De resto, cometemos erros infantis que não se pode cometer a este nível. O 3-2 é para os apanhados e faltou profundidade e qualidade no banco para termos um desfecho diferente. Manu Silva, o novo reforço encarnado, teria sido importante no jogo de ontem.
De referir ainda o Sr. Danny Makkelie, um nome que temos de recordar como o de Felix Brych. Exibição absolutamente lamentável. Dos 3 penaltis assinalados, possivelmente o que era mais flagrante foi o que ignorou olimpicamente aos 95'. Não só isso, como ainda permitiu que o adversário saísse em contra-ataque quando já passava mais de 1 minuto depois da hora extra indicada para fazer o 4-5 final. Um absurdo completo de um árbitro com histórico de barracadas destas: foi ele que esteve no Inter x Benfica (1-0) onde foi ignorado um penalti claro sobre Neres e foi também o autor daquele famoso lance em que Ronaldo marca um golo claro no Sérvia x Portugal (2x2) que simplesmente não foi concedido. É um péssimo árbitro e, infelizmente, a fava voltou a calhar ao nosso clube. Resta denunciar esta exibição absolutamente lamentável às entidades competentes para que, no mínimo, não tenhamos de ver este árbitro novamente à nossa frente. Se foi por ele que perdemos? Teve muita influência, mas também demos vários tiros nos pés e isso não pode ser ignorado para que a equipa possa continuar a evoluir favoravelmente.
Por fim, creio que a maior lição que temos de levar desta partida é que a vencer por 3-1 ao intervalo e 4-2 aos 70 min não podemos perder o jogo, seja contra quem for. É que já não é a primeira vez que uma situação destas acontece: de um 3-0 frente ao Inter para um 3-3 sofrido; de amassar a Juventus por 4-1 para um 4-3 final que quase acabou como jogo de ontem; de 0-3 na Turquia frente ao Besiktas para um triste 3-3. São já vários os casos em que nos faltou killer instinct e experiência. Chega a uma determinada fase de um jogo em que, se necessário, não se joga mais futebol. Neste particular lembro-me sempre do épico Benfica x FC Porto (3-1) para a Taça de Portugal em que demos a volta à eliminatória com menos um homem em campo desde a primeira parte. A partir do 3-1, que nos dava a passagem, praticamente não se jogou futebol. Foram 10 minutos de quezílias, discussões e fizemos tudo ao nosso alcance para parar o jogo e irritar o adversário. Não é bonito, mas é eficaz em casos de extrema necessidade. E mesmo sabendo que não existe um paralelismo perfeito entre a vida e o espírito ultracompetitivo do desporto, por vezes o melhor é mesmo deixar o puto chorão no chão e deixá-lo levantar-se sozinho. O mundo que se encarregue de corrigir as injustiças mais tarde."
O futebol perde-se, mas o Benfica permanece
"Cheguei agora a casa depois deste jogo contra o Barcelona. Senti logo a vontade de escrever e de libertar as minhas frustrações. Fui para o estádio com entusiasmo e uma certa inocência. Voltei com uma mentalidade completamente diferente. Com uma maneira de pensar muito diferente sobre o que é o futebol nos dias de hoje. E cheguei a uma conclusão muito triste: o futebol é dinheiro. O futebol são interesses. O futebol é tudo aquilo que não deveria ser futebol.
Por esse motivo, acho que já não consigo ver os jogos da Champions da mesma forma que via antes. Perdi o interesse. Não vou estar a olhar para uma televisão a ver jogadores do Benfica a serem derrubados dentro da área, e o árbitro sem fazer absolutamente nada.
Uma coisa é certa: a equipa não tem culpa nenhuma da exibição da equipa de arbitragem. Representaram o manto sagrado. Representaram o que é ser Benfica. E é precisamente por isso que continuarei a ir ver todos os jogos da Champions em casa. O apoio a estes jogadores NUNCA pode faltar. As 63 mil pessoas fizeram-se ouvir, e eu cheguei sem voz a casa. Fico com o sentimento de dever cumprido. Fiz a minha parte, e vou continuar a fazê-la.
Por protesto contra esta competição, e por não ter possibilidades de acompanhar o Benfica no estrangeiro, escolho ignorar os jogos fora, já que não consigo passar o meu apoio para a equipa nesses momentos. Enquanto puder apoiar o Glorioso, estarei sempre lá.
O futebol pode já não ser o que era. O futebol pode ser negócio, mas uma coisa eu sei: o Benfica está fora disso. O Benfica não é apenas futebol. É muito mais do que isso. É emoção, paixão, sentimento, dedicação, suor, lágrimas. Tal como os nossos jogadores demonstraram hoje, e deviam ter sido recompensados por isso. Não foram.
Agora, é seguir em frente e ganhar contra o Casa Pia. Rio Maior, aqui vamos nós!
PS: Os criminosos têm de ser levados à justiça. O clube tem de se defender de um ataque nuclear à nossa história, respeito e dignidade. Exige-se, pelo menos, uma queixa à UEFA."
Pavlidis: os deuses devem estar loucos!
"Pavlidis vai ter de colocar uma vela no Santuário de São Demétrio quando regressar a Salónica. No dia em que marcou não um, nem dois, mas três golos ao Barcelona... o Benfica perde...
Quando, com o Benfica ainda a vencer por 4-2, ouvi trovões fortes em Lisboa, pensei sinceramente que era Zeus a congratular-se com os três golos do compatriota Pavlidis marcados ao Bercelona. Zeus, o deus maior da mitologia grega, deus dos céus, raios e relâmpagos que mantêm a ordem e justiça. No final do jogo, fiquei sinceramente na dúvida: ou até Zeus anda a zoar com o desafortunado Pavlidis, ou outro deus ainda mais forte congeminou um plano bem urdido para um quadro surrealista. Que poderíamos equiparar à Persistência da Memória (1931), de Salvador Dali.
Comecemos por Pavlidis. A prova de que cada homem é um ato de fé. Dele e, acima de tudo, de quem quer acreditar nele. E a prova de quem há sempre um Éder em cada um de nós. O mesmo Pavlidis que tem sido assobiado, de forma mais ou menos envergonhada, pela quantidade de golos que falha e que não esconde ansiedade. Do ponto de vista do adepto, elogiar Pavlidis, como Lage o tem feito, pelo muito que trabalha, pela dedicação, por abrir espaços para os colegas ou por desgastar os defesas é o equivalente, para um homem que conhece uma mulher pela primeira vez, dizer que ela é muito simpática… Se é que me faço entender….
Pavilis fez jus ao nome Evangelos – boa nova – e marcou três de uma vez. Guardou-os para um palco de excelência e cada golo foi celebrado nas bancadas em ritmos de festa e de surpresa. Os deuses devem estar loucos, dizia-se. E Lage deve ter-se sentido feliz. Proteger um dos nossos do ataque dos inimigos pode exigir coragem. Mas mais coragem é proteger um dos nossos do ataque dos nossos amigos. E Lage sabia que o um jogo destes haveria de chegar para Pavlidis. Mas, afinal, Pavlidis continua a ser um deserdado do Olimpo… No dia em que faz um hat-trick… o Benfica perde! Talvez quando regressar a Salónica, onde nasceu, deva colocar mais uma vela no altar do Santuário de São Demétrio… Surrealista.
Surrealista também ver Di María, cara a cara com o guarda-redes, falhar o 5-4. Tive de esperar pela repetição, não estava a acreditar. Di María?!!! Devia ser proibido um jogador com o talento e a história do argentino falhar um golo daqueles. Surrealista.
Surrealista também a vista grossa que árbitro e VAR fizeram à grande penalidade cometida sobre Leandro Barreiro e que, mesmo que falhada, daria para manter o empate.
Bruno Lage que me desculpe, bem percebo a frustração, mas surrealista é também afirmar «enorme orgulho pela exibição». Eu entendo que os jogadores fizeram coisas que são, de facto, motivo de orgulho. Mas não há orgulho em sofrer-se cinco golos. Mesmo do Barcelona. Porque é o Benfica. Só tem orgulho na exibição de um jogo em que perdeu e sofreu cinco golos em casa quem se considera bem mais pequeno do que o adversário. Sei que Lage não o disse por mal, não o disse por não valorizar a equipa, mas a perceção começa muitas vezes nas palavras que, juntas, ajudam a formar ideias. Não há grandeza que não comece na vontade de ser grande. Essa, de resto, foi a grande lição do igualmente surrealista, por outros motivos, jogo do Benfica em Munique…
O Benfica foi vítima da qualidade do Barcelona, de erros estranhos, de um golo falhado na cara do guarda-redes por Di María e de uma decisão errada de arbitragem. E se não vejo motivos de orgulho na exibição – repito, o Benfica perdeu, no Benfica a derrota nunca rima com orgulho! - também vejo muitas coisas positivas que devem ser capitalizadas no futuro."
Lage: a estratégia que ficou pela metade
"Bruno Lage conseguiu anular durante 45 minutos uma das melhores equipas da Europa, mas ter-se-á afundado no regresso dos balneários com algumas opções tomadas e falta de clarividência
O Benfica-Barcelona foi um encontro à medida do nível de espectacularidade que se espera na Liga dos Campeões. Muitos golos, vários surreais e uma reviravolta debaixo de chuva intensa, coisa de Hollywood.
Os encarnados sustentaram a estratégia num golo cedo, que reforçou o moral dos jogadores, um choque pitoresco entre defesa e guarda-redes que escancarou o caminho para a baliza, pela segunda vez, a Pavlidis, e um penálti, daqueles que o VAR não tem como dizer que sim ou que não, e que responde sobretudo ao feeling do árbitro.
Foram muitos os acidentes, que acentuam uma falta de controlo onde tem sido difícil plantá-lo, e é preciso reconhecer que os catalães também tiveram os que os beneficiaram, como o erro de Trubin, a excessiva leveza de Yamal e até a estocada final de Raphinha, que foi soco no estômago, gancho de direita e uppercut para um KO do qual não se recupera. No entanto, olhando para a diferença de talento entre as principais figuras, é preciso reconhecer que foi Bruno Lage quem encurtou distâncias, precisamente por esse lado estratégico.
Encarou de frente a agressividade da linha defensiva do Barcelona, bem alta no terreno, e conseguiu colocar a nu todos os seus problemas, sobretudo quando muitas vezes os culers não saltavam à pressão junto do portador, deixando a bola descoberta. E, mesmo assim, nem foi perfeito. Houve momentos em que um pouco mais de discernimento e menos de precipitação teriam aberto ainda mais clareiras.
Na segunda parte, a equipa baixou. Foi empurrada e deixou-se empurrar. Os defesas do Barcelona começaram a estar mais tranquilos para lá do meio-campo e a saída dos encarnados ficou estrangulada graças a essa linha subida e à pressão dos avançados e médios.
O Benfica tinha-se esquecido do meio-campo como referência do fora de jogo, à exceção de uma ou duas ocasiões. Não havia uma camisola vermelha por perto que colocasse os defesas dos catalães em sentido.
A gestão de Lage também foi muito criticada. Di María, num momento em que se alugava o meio-campo dos visitantes, tinha entre ele e a baliza um latifúndio e, na única vez em que lá chegou, já não teve discernimento para bater Szczesny. Kokçu passou ao lado do momento defensivo e, apesar do desgaste de Aursnes, esteve tempo a mais em campo. Bah tinha velocidade, mas não o critério suficiente.
Tinha faltado a segunda parte da estratégia. Estabilizar e aproveitar o espaço na altura certa."
Benfica e Sporting parece que andam a brincar à Champions
"Águias e leões facilitaram e deixaram tudo para o fim. E se não pontuarem na última jornada arriscam-se a ficar de fora da UEFA em janeiro
Jornada desoladora para as cores nacionais na UEFA Champions League. Benfica e Sporting perderam excelentes oportunidades para garantirem um lugar no play-off ou até mesmo sonhar, pelo menos durante uma semana, com a qualificação direta para os oitavos de final. Os dois falharam e agora estão obrigados a fazer outras contas…
Ambos têm 10 pontos e com um Estugarda-PSG (ambos também com 10) e com o Manchester City (primeira equipa abaixo dos lugares de qualificação, com 8) a receber o Club Brugge na última jornada é bem possível que tenham de pontuar para não ficarem pelo caminho. Sim, aqueles estudos científicos com que fomos brindados sobre este novo formato da liga milionária não parecem muito fiáveis e 10 pontos podem não chegar para garantir um lugar entre os 24.
Analisando a participação de águias e leões, é difícil aceitar alguns resultados. Por vezes, até parece que andam a brincar à Champions.
O Sporting terminou a primeira metade desta fase de Liga com fantásticos 10 pontos. Vitórias sobre Lille, Manchester City, Sturm Graz e empate, nos Países Baixos, com o PSV. Adeptos empolgados e já a pensar num lugar entre os oito primeiros. Saiu Ruben Amorim, entrou João Pereira, saiu João Pereira, entrou Rui Borges e três jornadas volvidas… três derrotas e a necessidade de ter de jogar cartada decisiva na quarta-feira, na receção ao Bolonha.
Perder com o Arsenal, mesmo em Alvalade, é um resultado natural, mas deixar três pontos em Brugge e agora em Leipzig é brincar com o fogo, já que se tratavam de duas equipas perfeitamente ao alcance dos leões, mas estes cometeram a proeza de fazer sete jogos na UEFA Champions League com três treinadores e quando assim é…. apurarem-se será um mal menor.
Já o Benfica até tem razões de queixa da arbitragem no jogo com o Barcelona, mas não pode deixar de olhar para dentro. Desperdiçou por duas ocasiões uma vantagem de dois golos, a última já no último quarto de hora. O jogo, é certo, foi louco e atípico, surreal até, mas os derradeiros três golos dos blaugrana não podem ser dissociados das alterações introduzidas por Bruno Lage, que reforçou a defesa… enquanto Flick arriscou tudo no ataque. O resultado todos sabemos: de 4-2 para 4-5.
Esta derrota a juntar ao desaire com o Feyenoord e ao empate com o Bolonha, também na Luz, complicou muito as contas, apesar da sensacional goleada sobre o Atlético Madrid e à tremenda vitória no Mónaco, a que se juntou o triunfo em Belgrado. Agora, ou muito me engano ou vai ser necessário tirar pontos à Juventus, em Turim.
Todos temos noção da dimensão dos clubes portugueses e que para estes o campeonato é sempre prioritário, mas falhar o play-off neste novo formato será mesmo uma proeza histórica…"
Quitó, o sempre-em-pé
"- É que é só mentiras!
Gritou para o ar Quitó, lendo o jornal ao balcão do Café Joaninha. Avançados espanhóis, laterais argentinos, médios checos, centrais do Paraguai, todos anunciados, dia-a-dia, como reforços de peso do seu clube. Num ano que não este chegou a fazer uma lista com as invenções dos jornais: eram para cima de 100 os craques «praticamente garantidos», as bombas «prontas a anunciar», os atletas que haviam «aterrado na Portela para oficializar o contrato de 3 anos com o eterno CRF». Tudo ilusões, sonhos prometidos, invenções de quem anda a brincar com o coração frágil do adepto em tempo sombrio de mercado de Inverno.
Quitó já não tem pachorra para este mês de Janeiro, sempre a ouvir e ler cantos de sereia, a imaginar esperançoso o reforço do onze para depois tudo desaguar num enorme nada ou, pior!, numa contratação pueril mesmo em cima da hora do fecho – um cepo qualquer que só vem afundar ainda mais as finanças do clube e o futebol já de si de uma pobreza franciscana. Só ele é que não vem no jornal como futura contratação sonante: «Joaquim António, homem extraordinário, apoiante de reconhecida arte, famigerado adepto conhecido em Vila Viçosa como o "Sempre-em-pé" por nunca desistir de uma bola, está a horas de ser oficializado no Clube Romântico de Futebol».
- Disso não se lembram eles, os criativos!
Isto disse em voz baixa, já não gritou. Ficou de mini na mão a olhar com olhos baços a baça vitrina da Dona Joaninha. Não tinha fome mas pediu à mesma dois ovos cozidos e um bocado de toucinho para acamar a bebida.
Sentia falta de ir ver um jogo ao vivo. Do cheiro do estádio, daquele nervoso miudinho, que às vezes é graudinho, que o inundava de emoção quando a equipa irrompia fulminante pelo relvado e o público se levantava em euforia e desesperava pelo começo do jogo. Das manhãs a preparar o farnel, das idas à mercearia para apanhar pão, presunto, queijo e garrafões de vinho. Da comida mais substancial tratava Lurdes, a esposa, no tempo em que a Lurdes ainda podia preparar o farnel, antes da morte de Lurdes, antes de Quitó ser o viúvo da Lurdes. Naquele tempo era só, e bastava, o Quitó Sempre-em-pé, o marido orgulhoso da Lurdes.
Agora pensava nas aventuras de horas a fio dentro do carro de Vila Viçosa a Lisboa. Comprava umas empadas para levar, saía pela Florbela Espanca, deixava o Palácio à esquerda e seguia pelas pedreiras até Borba. Parava no Botequim com os amigos por tradição: bebiam uma aguardente com brinde à vitória do CRF e só paravam em Lisboa, já mais para lá do que para cá. Eram tempos diferentes destes: onde agora é um viaduto era um enorme terreno aos socalcos, baldio, solitário, aberto para a cidade de um lado e para o estádio do outro. Tempos em que o carro ficava por ali, onde desse, onde pudesse ser, onde o espaço servisse os intentos dos comensais, onde se pudesse acender uma fogueira, comer, conversar, falar do 11, comer, conversar, falar da vida, conversar, falar da morte, comer, falar sem sentido, falar com o sentido nas balizas do adversário.
Os fogareiros incendiavam-se no final das tardes de Inverno, afundavam-se na lama, soltavam o seu fumo de aconchego por todos aquelas famílias que se engalfinhavam e desapareciam sob uma nuvem de vapores de panelas, tochas, charutos e santa poluição. Era o álcool e a espera da vitória a acelerar os batimentos cardíacos dos corações em chamas.
- Se hoje pudessem anunciar a Lurdes no CRF...
Isto pensou Quitó, a olhar perdido a televisão. Não gritou nem disse em voz baixa. Deixou-se só a pensar nisto. A Lurdes a entrar no Estádio, as bancadas ao rubro, alguém a anunciar de microfone na mão: «Senhoras e senhores, sócios, adeptos e simpatizantes, Românticos, vocês são os melhores adeptos do mundo. Um grande aplauso para Lurdes Gralha, esposa de Quitó Gralha, mulher responsável por centenas de farnéis faustosos que fizeram outras centenas de pessoas felizes; meus caros românticos, melhores adeptos do mundo, vamos homenagear Lurdes Gralha, que do alto da sua ternura e arte confeccionou repastos que alegraram e favoreceram vitórias épicas do Clube Romântico de Futebol».
A Lurdes a cair dos céus aos remoinhos, voando, planando pelo estádio, rodopiando. Um eco de milhares de adeptos aos gritos, aos aplausos, aos beijos, aos abraços. A Lurdes fazendo círculos cada vez mais fechados, acenando à multidão, gritando «CRF, CRF, CRF!», finalmente aterrando nos braços largos e generosos de Joaquim António Gralha, o Sempre-em-pé, que agora está quase-quase a estatelar-se no mosaico triste do Café Joaninha."
A História feita contra a Espanha!
"Vitória épica no andebol português vale qualificação inédita para os quartos de final do Mundial
O andebol português viveu uma noite histórica e memorável no Campeonato do Mundo. Pela primeira vez em competições oficiais, Portugal venceu a poderosa seleção espanhola, num jogo que ficará para sempre na memória dos adeptos e na história do desporto nacional.
Com esta vitória épica, Portugal garantiu a qualificação inédita para os quartos de final do Mundial, um feito que destaca a evolução e o crescimento do andebol português no panorama internacional.
Desta vez, contrariando a tradicional sina portuguesa de fazer contas até à última jornada, a seleção nacional assegurou a passagem à próxima fase ainda na penúltima jornada do main round, vencendo o grupo de forma categórica. O jogo contra o Chile, que fechará esta fase, tornou-se meramente simbólico, uma oportunidade de gestão física e emocional para os desafios que se avizinham.
Agora, todas as atenções se centram nos quartos de final, onde Portugal enfrentará a Alemanha. Apesar da força do adversário, a confiança na qualidade da nossa seleção é total. Com a determinação, irreverencia e união que têm demonstrado, Portugal tem tudo para superar os alemães e alcançar mais um feito desportivo: as tão sonhadas meias-finais.
O sonho continua vivo, e esta equipa já mostrou que não há limites para o que pode alcançar. Força, Portugal!"
Quando o teórico de Zipaquirá caiu finalmente na realidade
"Gabriel García Márquez foi, dos grandes escritores universais, o que mais falou sobre futebol
Zipaquirá. Dá vontade de responder: vai tu! Cá por mim vou lá de boa vontade. Gosto de viajar por nomes. Uma vez estava a ler qualquer coisa sobre Bobo Dioulasso, no Burkina Faso, e dois dias depois estava lá. Também atravessei a Índia de comboio para pôr os pés nessa cidade fantástica chamada Tiruchirappalli. E mais e mais. Zipaquirá é outra palavra que me soa bem. Fica no interior da Colômbia e dizem os de lá que é linda e limpa como poucas, com os edifícios da era colonial bem conservados. Dê-se o desconto que for preciso por via do orgulho de proprietário. Quem passou algum tempo da sua vida em Zipaquirá foi Gabriel José de la Concordia García Márquez, a quem os colombianos passaram a tratar pela alcunha carinhosa de Gabo. Vem mesmo a propósito. OK. Se calhar nem vem, mas deixemos isso para outra altura até porque aqui não há espaço que bonde. Gabriel nasceu em Aracataca (outro nome agradável aos meus ouvidos), na parte caribenha do país e nunca ninguém que tenha lido Cem Anos de Solidão esquecerá a frase irretocável que serve de início ao livro: «Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo…». De truz, menino, de truz!, diria o Ega ao Carlos da Maia do divino Eça. Os habitantes de Aracataca também dizem maravilhas da sua cidade, e volto a dar-lhes o desconto devido, mas têm a seu favor afirmarem ao mundo que lhe deram (ao mundo) o Gabo, e isso é uma daquelas realidades próprias do Princípio deArquimedes. Ah! E também enfunam o peito ao afirmar que Macondo é Aracataca e vice-versa, mas aí só Gabriel o poderia responder não se desse o caso de ter morrido há quase onze anos na Cidade do México
Quando era garoto, Gabo jogava futebol na equipa do Liceo Nacional de Varones, em Zipaquirá, e instalaram-no na defesa o que é irónico já que o moço era extremamente ofensivo, sobretudo para com governo colombiano da altura. Depois, já jornalista, escreveu uma série de crónicas sobre jogadores falhados, aconselhando-lhes a empinarem uns golos de rum e a interessarem-se por literatura. Deve ter sido o seu empreendimento mais fracassado. Contou, em várias entrevistas, que a sua primeira paixão foi o basebol, o desporto mais praticado na Colômbia da sua infância. Ei-lo: «Los niños juegan fútbol en la calle, ahora. Pero cuando era niño en la calle o en la escuela se jugaba béisbol. La afición por el fútbol se sembró a fines de la década del 40, cuando empezaron a llegar jugadores y entrenadores argentinos, uruguayos. Entonces empezó el gran momento del fútbol en América Latina».Depois converteu-se. E passou a ser um dos grandes escritores universais que mais falou sobre o jogo dos ingleses. Filosofava: «A alguien a quien verdaderamente le gusta el fútbol nada le importa quién gana o quién pierde, porque solo el verlo jugar es un gran y bello espectáculo». Um teórico, vamos lá. Mas um teórico sem as habituais parvoeiras dos teóricos que de nada sabem e de tudo falam. Escolheu um clube para ser adepto, o Club Deportivo Popular Junior F.C., mais conhecido por Junior de Barranquilla, mas não me perguntem porquê, andei a vasculhar por toda a parte e não obtive uma resposta convincente. O mais razoável é supor que a razão terá raízes no facto de Barranquilla também ser da zona caribenha da Colômbia onde nasceu. De adepto passou a fanático. Confessou: «El primer instante de lucidez en que caí en la cuenta de que estaba convertido en un hincha intempestivo, fue cuando advertí que durante toda mi vida había tenido algo de que muchas veces me había ufanado y que ayer me estorbaba de una manera inaceptable: el sentido del ridículo». Sim, Gabriel García Márquez, que tanta gente expôs ao ridículo com uma escrita mais corrosiva do que hidróxido de potássio, cambaleou entre a sanidade mental e o grotesco. Mas teve mais da primeira para recusar a segunda. E então escreveu, compungido: «Pienso que no solo hay que calmar a los hinchas del fútbol, sino que hay que calmar también al ser humano y cambiar el modo de ser de la sociedad». Finalmente acabou por ser prático: «Enquanto houver árbitros, um jogo de futebol será sempre imprevível»."
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