"Até há poucos anos, não havia, nos órgãos gestores de modalidades desportivas, a nível mundial, nenhum que se comparasse, em corporativismo, conservadorismo e retração à inovação, ao IFAB (International Football Association Board), uma espécie de guardião independente das Leis do Jogo, integrando representantes da FIFA, mas também das federações nacionais de Inglaterra, de Gales, da Escócia e da Irlanda do Norte.
Retificações, pequenas ou grandes mudanças, ideias mais ou menos adaptáveis ao curso de um jogo de futebol foram pensadas ao longo dos anos, mas as suas introduções graduais nas dinâmicas e nas competições domésticas e internacionais foram sempre objeto de grandes refluxos e de enorme contenção.
O surgimento da possibilidade de recurso ao VAR (Video Assistant Referee), consignando quatro pontos de intervenção do mesmo num protocolo de atuação, foi um passo (de) gigante na modernização da arbitragem e na colocação ao seu dispor de ferramentas de aproximação da verdade desportiva que, de outro modo, continuaria muitas vezes subvertida ao poder discricionário de um juiz central e de dois assistentes, muito embora se salvaguarde a permanente intenção de decidir da melhor forma em cada circunstância e momento de um jogo.
Mesmo assim, e continuando (obviamente) a decisão final a pertencer ao juiz central de campo, as equipas VAR de apoio têm-se confirmado de inexcedível utilidade, em face dos meios disponíveis, ao mesmo tempo que se confirma a necessidade de aprimorar o protocolo de intervenção, os seus timings e a metodologia seguida. Sempre, sublinhe-se, em nome do jogo, da sua verdade, da sua dinâmica, dos protagonistas e, em última instância, dos adeptos, elemento essencial de suporte a tudo o que diga respeito ao Planeta Futebol.
Chegamos ao que verdadeiramente motiva a nossa conversa de hoje: as potenciais alterações que estão à porta, a uma distância muito curta de aprovação, teste e implementação no jogo de futebol, à escala global.
E, se tivermos em consideração que uma das leis mais questionadas e questionáveis, e até de mais difícil interpretação (mesmo com recurso ao frame e ao VAR), é a Lei XI (a lei do fora de jogo), decerto ficaremos agradados com a perspetiva que agora se coloca para o futuro a longo prazo: com a proposta em cima da mesa, apenas será considerado offside um jogador cuja totalidade do corpo se situe, à altura do passe de definição da legalidade da jogada, totalmente à frente (no sentido do ataque da sua equipa, evidentemente), do penúltimo adversário até à linha final.
Simples, objetivo, aparentemente muito mais fácil de interpretar e analisar do que a atual letra de lei, mais confusa e passível de interpretações e imagens de linhas paralelas de implementação, no mínimo, discutível. A partir do momento em que esta alteração seja formalizada, diminuirão, decerto, as discussões estéreis sobre a matéria, as dúvidas em relação a uma alta percentagem das jogadas ofensivas e, sobretudo, fica também o jogo beneficiado numa perspetiva competitiva, uma vez que as equipas em situação defensiva terão de passar a atuar com muito mais cuidado e rigor nas marcações (sejam individuais ou zonais), para evitar sobressaltos e situações desagradáveis junto às respetivas balizas.
Por outro lado, a eterna questão do tempo de jogo parece a caminho de uma razoável solução, continuando embora a garantir o princípio sagrado de que o árbitro central é, em rigor, o único cronometrista de uma partida de futebol. O que está agora em equação é a possibilidade de paragem efetiva de cronómetro para evitar evidentes situações de perdas (ou ganhos, conforme o interesse e a interpretação…) de tempo. O comportamento antidesportivo de jogadores em situação de vantagem no marcador será exemplarmente punido, não através da disciplina tradicional (a admoestação com o cartão amarelo), porque, em rigor, o árbitro não é médico e não pode ajuizar da legitimidade de uma queixa física, mas com a paragem do cronómetro e consequente compensação, após os 45 minutos dessa parte, e em igual período do tempo entretanto hipotecado.
São duas alterações de fundo, e em contraponto com o tal conservadorismo reconhecido ao IFAB. Mas o jogo, como o conhecemos, deve evoluir para parâmetros mais equitativos e justos, mais desportivos e definidores de um espetáculo limpo, em que a verdade desportiva, esse tão significativo quanto, por vezes, vago conceito, seja estimulada e respeitada.
Se a elas associarmos a possibilidade de, em determinados momentos de um jogo e em número bem definido, os treinadores poderem desafiar uma decisão arbitral, solicitando intervenção junto dos Video Assistant Referees para certificação, congregamos uma participação mais direta mas, ao mesmo tempo, responsável dos treinadores, envolvendo-os no processo de apuramento da legalidade e, curiosamente, dotando-os de uma visão interior do jogo e das dificuldades que o trabalho arbitral concentra e apresenta.
Talvez aí possamos ver cada vez menos o que, por exemplo, foi bem visível no último Benfica-Sporting de Braga, para a Taça de Portugal, no Estádio da Luz, com os dois treinadores (sobretudo o da casa...) a darem um triste espetáculo de protestos, gritos e asneiras para a equipa de arbitragem e as suas decisões. Mesmo que entendamos o momento, a adrenalina e com o óbvio desconto para as emoções à flor da pele, o exemplo é péssimo e a imagem de profissionais e clubes fica, evidentemente, agregada às situações…
Cartão branco
Depois de José Manuel Constantino, o movimento olímpico português tem a obrigação moral e efetiva de continuar um caminho de crescente dignificação, agregação e criação de condições de excelência para que, ao cabo de cada ciclo olímpico, os Jogos que o finalizam disponham da melhor e mais qualificada participação de delegações nacionais.
Laurentino Dias e Fernando Gomes corporizam candidaturas íntegras, com dirigentes profundamente experientes e entendedores dos princípios e da Carta Olímpica, e suficientemente agregadoras de amplos setores, entre federações desportivas, antigos atletas e atuais praticantes e dirigentes. De raízes distintas mas com objetivos comuns, Dias e Gomes prometem uma luta justa, digna e… olímpica.
Cartão amarelo
Gosto genuinamente de José Mourinho. Um treinador com garra e espírito de conquista, pronto a sair da zona de conforto e a tentar desafios pouco imagináveis ou, no mínimo, muito complexos. Conheço bem a Turquia e a sua Superliga. Um campeonato duro, muito competitivo, de rivalidades ao limite e manifestações de adeptos a condizer.
Junte-se Mourinho e a liga turca. Junte-se dois fatores explosivos e com o coração ao pé da boca. Só podia dar o resultado que tem dado.
Ao lado de um Fenerbahçe que é a imagem, em competição, do seu técnico principal, um conjunto de fatores colaterais volta a prevalecer: arbitragens, dirigentes, organização.
Mourinho terá de tomar cuidado para não ser 'devorado' pelas dinâmicas do futebol otomano, num jogo que não admitirá empate."