Últimas indefectivações

domingo, 10 de setembro de 2017

Do VAR a André Almeida

"Mesmo à quinta jornada, o VAR é visto a cores. Em certas ocasiões é 'luz da verdade'. Em outras é já quase que uma 'sombra com pecado'.

1. Nesta quinta jornada o VAR - videoárbitro - trabalha com muita serenidade. O conjunto dos jogos da Liga decorrem todos a horas diferentes. Desde as dezanove horas de sexta até às vinte horas de amanhã - com o Aves-Belenenses - a serenidade no espaço da Cidade do Futebol que acolhe a tecnologia contratada para a experiência portuguesa do denominado videoárbitro não tem sobreposições de jogos. Cada um dos nove jogos decorre ou decorrerá num horário que permitirá decisões que contribuirão, em larga escala, para o reconhecimento da repetidamente proclamada verdade desportiva. Como se o futebol conseguisse despir as cores da análise mesmo olhando para o que a televisão mostra e o VAR (mas, também o assistente do VAR), vendo, interfere, por vezes corrigindo. É o que vai acontecendo ao longo destas cinco jornadas. Em alguns casos sem qualquer relevância mediática. Só para efeitos de correcção de erros gritantes, de jurisprudência interna ou de ponderação de erros cometidos. Em que a articulação entre arbitragem e disciplina é, neste ambiente, uma necessidade que se reconhece. Porém em outros casos, poucos, o recurso ao VAR determina longas e repetidas ponderações como se a generalidade dos telespectadores não tivesse discernimento - e capacidade - para fazer a sua avaliação. E, assim, de repetição em repetição temos a avaliação permanente dos três grandes - com a clara anuência deles! - e evidenciando-se, claramente, que o VAR tem dias e circunstâncias. É bom quando nos favorece. É fraquinho quando nos prejudica, acima de tudo no nosso combate. Ou não valida a nossa perspectiva, que é, acima de tudo, prospectiva! E, assim, já são mais conhecidos os videoárbitros que os árbitros dos jogos. Estes já são desculpados. Os outros crucificados ou até já pintados. Nem que sejam as paredes das suas casas. E desta forma percebemos bem que o VAR foi reconhecido como útil por muitos que só o aceitaram em razão de um tempo político de atenuação das altas tensões que dominam e condicionam o tempo actual do futebol português. O VAR foi o remédio - um misto de calmante e do antibiótico - que as nossas principais instituições utilizaram para não terem uma intervenção activa neste clima que corrói e que perturba a indústria do futebol profissional em Portugal. Somos os melhores da Europa no futebol jogado, temos seis treinadores portugueses envolvidos na edição deste ano da Liga dos Campeões, mas sabemos que no final da presente época desportiva só o vencedor da nossa Liga tem acesso garantido à atractiva fase de grupos da Liga que proporciona milhões. E sabemos que as verbas da Liga dos Campeões - directas e indirectas - podem representar entre vinte a trinta por cento de determinados orçamentos de clubes participantes nesta relevante competição. E sabendo tudo isto não há capacidade, nem interesse, na busca de um denominador comum para a indústria do nosso futebol. E como já se reconhece, mesmo à quinta jornada, o VAR é visto a e com cores. E varia a ponderação todos os fins de semana. Em certas ocasiões é uma luz de verdade. Em outras é já quase uma sombra de pecado. E como tudo depende ou da linha exibida ou da intensidade do contacto há que ter paciência. Na certeza, como nos legou Camilo Castelo Branco, também que «a paciência é a riqueza dos infelizes»!

2. O que está a acontecer com Adrien merece reflexão. Concretizou-se uma transferência mas não se efectivou a inscrição. A própria FIFA recusou a inscrição em razão da documentação necessária ter dado entrada no sistema informático (no denominado TMS) catorze segundos para lá da hora. Não nos podemos esquecer que houve milhões de segundos para concretizar, em pleno, a operação. Muitos e muitos milhões de segundos. Mas o que sabemos é que Adrien nem está a treinar no Leicester. Já não é do Sporting e ainda não é em plenitude jogador do Leicester, como resulta de uma declaração do treinador do clube inglês, Craig Shakespeare. E também sabemos que Adrien é um jogador profissional e tem direito a exercer a sua profissão. Esta é uma situação singular. Está no Leicester por transferência mas não está inscrito no Leicester. Aqui são quase que verdadeiras as palavras de Johann Goethe: «A claridade é uma justa repartição de sombras e de luz!» E sem responsabilidade do que quer exercer, em pleno, a sua profissão!

3. Acredito que vão começar as denominadas chicotadas psicológicas. Nas próximas duas semanas já vai haver notícias de treinadores despedidos e de treinadores já oferecidos! O interessante é que, na generalidade dos casos, só agora completaram os respectivos plantéis. A culpa vai casar-se com alguns treinadores São o elo mais fraco. Mas com a certeza que os treinadores da Premier League levaram a que o mercado de transferências encerre nas vésperas do arranque da competição. Sendo mais rigoroso as entradas até à quinta-feira anterior ao primeiro jogo da Liga  mas as saídas até ao último dia de Agosto. O que significa que Adrien não estaria na difícil e complexa situação me que se encontra. Quer trabalhar mas não pode. A não ser que o Tribunal Arbitral do Desporto valide uma interpretação que concretize o princípio da proporcionalidade.

4. Estava no Estádio da Luz na passada sexta-feira e fiquei com a convicção que o André Almeida quis rematar à baliza. Percebi claramente que olhou para a baliza e para o guarda-redes. Para mim foi um grande golo. Um golo extraordinário. Para Vítor Oliveira, com a sagacidade que lhe reconheço, um «chouriço». O que fica é a paixão do futebol. E as suas formas de interpretação. Foi, sim, um golo que determinou uma importante, mas sofrida, vitória do Benfica. E um golo de um profissional exemplar, dedicado, reconhecido e com uma característica que nos faz recordar Gilbert Cesbron: «A personalidade assemelha-se a um perfume de qualidade: quem o usa é o único que o não sente!»"

Fernando Seara, in A Bola

Não chega de bater no árbitro?

"Agora já não interessa se o árbitro decide bem ou mal. Interessa apenas quem da decisão (mesmo que acertada) tira proveito.

A arbitragem portuguesa vive, dentro do campo, o melhor momento da sua história. À quinta jornada não houve um único jogo resolvido por um erro grosseiro de arbitragem, o que torna evidentes os benefícios que a introdução do videoárbitro trouxe ao nosso campeonato - apesar de alguns continuarem a olhar para a tecnologia com desconfiança. Faz parte, nunca a mudança tem o condão de agradar a todos. Mas mesmo os mais cépticos, assumam-no ou não, já puderam perceber que com o VAR temos, todos e sem excepções, muito mais a ganhar do que perder. Só falta agora convencermo-nos de que a verdade desportiva, que durante tantos anos pedimos, vale bem umas paragens mais prolongadas ou compensa o facto de adeptos e equipas festejarem um golo que afinal não vale. É o preço a pagar - e, convenhamos, não é um preço assim tão alto. É, como em tudo na vida, uma questão de hábito.

A arbitragem portuguesa vive, fora do campo, o pior momento da sua história. Porque apesar de ninguém deles de poder queixar até ao momento, todas as semanas os árbitros (e agora também os videoárbitros) continuam sob a mira dos snipers que têm como missão disparar contra tudo o que mexe, inocente ou culpado. Agora já não interessa se a equipa de arbitragem decide bem ou mal. Interessa apenas quem da decisão (mesmo que acertada) tira proveito. Do género: 'se o VAR decide bem a meu favor, é uma evolução tremenda pela qual durante tantos anos batalhei, eu que tenho os olhos rasgados até à nuca e vejo as coisas antes de toda a gente'; 'se decide bem mas contra mim ou a favor dos meus rivais é porque o sistema continua a favorecer sempre os mesmos e o VAR não serve, como eu sempre disse que não serviria, para nada'.
E, talvez, um exagero. Mas face ao que assistimos na noite de sexta-feira, por exemplo, não anda muito longe da verdade. Se não fosse triste até dava para rir... Enquanto aqueles que têm responsabilidades na liderança dos clubes (ou na sua comunicação, vá) não souberem ser sérios, o futebol português não passará de uma brincadeira. Não de meninos, mas de gente grande. Ou pelo menos com idade suficiente para ter muito mais juízo.

Alguém precisa de meter mão nisto. Há, não podemos esconder mais, um risco elevado de as coisas se tornarem demasiado perigosas. E os árbitros precisam, é evidente, de ajuda para ultrapassarem um momento delicadíssimo - talvez o mais delicado da história de arbitragem portuguesa. Façamos este exercício: Francisco J. Marques, director de comunicação do FC Porto, denunciou, ainda antes da época começar, o nome de cinco árbitros como estando ligados ao Benfica por via de e-mails que estão, neste momento, nas mãos da Justiça. E continua a bater neles, porque entendeu o Conselho de Arbitragem continuar a nomeá-los para jogos da Liga - em que têm de arbitrar (ou videoárbitro) Benfica, Sporting e FC Porto. Poderia poupá-los a isso, é verdade, mas entenderá o organismo liderado por José Fontelas Gomes que isso seria ceder à pressão - até porque não há notícia de alguém na Polícia Judiciária ter já encontrado argumentos suficientes para dizer que aqueles cinco árbitros não deveriam apitar mais jogos dos encarnados. E como a esses nomes Francisco J. Marques já juntou, numa outra leva, Bruno Paixão (por razões que ninguém percebeu bem) e Gonçalo Martins (o tal que ontem anulou, bem, o golo que daria o empate do Portimonense na Luz), qualquer dia podíamos não ter sequer árbitros para apitar os três grandes...
É preciso encontrar forma de colocar ponto final na pressão que todas as semanas se coloca, de forma propositada e aparentemente concertada, nos árbitros portugueses. Contra o discurso de ódio, como (e bem) lhe chamou o Conselho de Arbitragem, já não chegam as palavras. É preciso agir. Depressa. E os clubes (perdoem-me os que de mim discordam, mas ainda não me conseguiram convencer do contrário) não conseguem dar o passo necessário. Precisam, pelo menos, de um empurrão.

Lapidar
«Chamem-lhe chouriço, eu chamo-lhe crença. Vi que o guarda-redes deu três passos em frente e tentei a minha sorte»
André Almeida, jogador do Benfica

«O principal segredo do nosso sucesso nos últimos anos é sabermos que não há facilidades. Às vezes tem de ganhar-se assim, com união, com determinação e com muita crença»
Rui Vitória, treinador do Benfica
(...)"

Ricardo Quaresma, in A Bola

Vandalismo de fato e gravata

"Quando o mal acontece, todos lamentam. Todos repudiam. Todos emitem comunicados. Todos dizem não se rever nos comportamentos de violência. Soltam-se umas frases. Um conjunto de linhas baratas. E sai-se de cena. Pela porta das traseiras. A tentar que ninguém note.
Vasco Santos foi o vídeo-árbitro do Benfica-Belenenses. O mesmo que ajuizou mal a entrada de Eliseu sobre Diogo Viana. Uma decisão. Uma má decisão. E apenas isso. Assumiu o que viu, ou não viu, sem se esconder. O prédio onde vive, na cidade do Porto, foi vandalizado esta semana. Em forma de ameaça. De atirar pedras e fugir para semear o medo e abalar alguém que, no seu trabalho, tal como todos nós, tem boas e más decisões.
Mas de quem é a culpa? Dos que lá foram? Sim, principalmente. E de todos os outros que dizem repudiar e não se rever. De dirigentes, funcionários de clubes ou comentadores afectos aos mesmos clubes que se dizem independentes. De todos aqueles que aproveitam o palco que lhes é dado para espalharem o ódio e incendiarem as mentes mais fracas. E, sobretudo, de regulamentos, ou ausência dos mesmos, em que os castigos aplicados a dirigentes e afins não produzam efeitos práticos.
José Fontelas Gomes, presidente do Conselho de Arbitragem, disse tudo: "O discurso de ódio no futebol tem de parar de imediato. O Conselho de Arbitragem apela às autoridades públicas para que não esperem por uma tragédia para intervir." Essa tragédia, infelizmente, já esteve mais longe. Começa no discurso de muitos que agora vêm repudiar e lamentar. No futebol português, o verdadeiro vandalismo veste-se de fato e gravata para se espalhar nos comunicados, e redes sociais."

Pela 'VARdade'

"1 - A verdade é o bem mais precioso que o desporto tem. Quem quer assistir ou participar num espectáculo justo e credível tem de estar satisfeito com a introdução do vídeo-árbitro nestas primeiras jornadas da Liga. A utilização da tecnologia não tem sido perfeita, nem nunca o será – principalmente para aqueles que em nome da clubite aguda se mostram ávidos em inventar focos de polémica – mas não faltam os exemplos fiéis de que a verdade desportiva ficou salvaguardada. O Benfica-Portimonense foi só mais um. FC Porto na frente, como é óbvio
2 - Se é cedo para fazer balanços em relação ao vídeo-árbitro, pois há muito para acontecer, ainda mais o é no que diz respeito à Liga, que ainda não fechou a 5.ª jornada. Apesar disso, parece consensual que tem sido o FC Porto a merecer nota de maior destaque neste arranque de campeonato. Os dragões, que até já tiveram o compromisso mais difícil, passando na deslocação a Braga, apresentam o futebol mais dinâmico, intenso e envolvente e, até ao momento, o plantel a dar mostras de maior equilíbrio. Um dis histórico na Volta a Espanha
3 - A Vuelta acabou (hoje é apenas a etapa de consagração) de forma espectacular, assim como espectacular foi quase toda a prova. Chris Froome acabou de forma eloquente com as últimas dúvidas e prepara-se para juntar, no mesmo ano, a vitória na Volta a Espanha à conquista da Volta a França. Mas ainda mais espectacular esteve ontem Alberto Contador, por sinal aquele que deu maior contributo para excelência desta competição. O espanhol despede-se, triunfando, como merecia, no Angliru. E já é uma saudade para quem gosta de ciclismo."


PS: Pois, claro o Braga que hoje perdeu em Setúbal, foi o adversário mais difícil dos 'grandes' - o Rio Ave, que de facto perdeu nos Barreiros, a jogar com 10 durante muito tempo, não conta...!!! -, ainda por cima um Braga que poucas horas antes tinha jogado uma eliminatória decisiva na Liga Europa, e decidiu 'poupar' jogadores contra os Corruptos!!!

O jogo económico

"De acordo com notícia veiculada no Record, o futebol português foi, nesta janela de transferências, o segundo país que mais beneficiou com a venda de jogadores para as cinco maiores ligas europeias. Com um lucro de 259 milhões de euros, atrás da França que arrecadou cerca de 436 milhões, os clubes e sociedades desportivas de Portugal assumiram mais uma vez as suas capacidades negociais e de ‘persuasão’ nesta Europa do futebol ‘consumidora’!
Desde os anos 90, enquanto treinador e depois já como presidente do Sindicato de Jogadores, defendo que o futebol profissional poderia ser uma das mais importantes, referenciais e lucrativas indústrias do país. Mas, para isso, deveria e teria de ser encarada e trabalhada de forma profissional, específica e organizada e liderada por gente conhecedora de todo o ‘processo’. Por profissionais com conhecimentos multidisciplinares nas variadas áreas onde o futebol se insere e se desenvolve como economia de mercado. Nunca esquecendo, a necessária experiência prática do jogo. A imprescindível necessidade de o entender e compreender. Sempre assumindo a importância que os sentimentos e, particularmente, a paixão, têm na sua evolução e na sua constante regeneração.
Formar de forma qualificada e estruturada é o caminho. E, mais do que o caminho, é a solução! Não existem modelos ideais. Não existem conceitos perfeitos. Existem, sim, projectos que se baseiam em pessoas que pensam e têm a coragem de seguir as suas convicções e a sua visão. E, cada vez mais, não só no futebol mas também na nossa vida ‘cá fora’ enquanto cidadãos, a qualidade das nossas decisões são determinantes para o nosso sucesso! Ou antes, para a nossa realização e felicidade..."

Este futebol será desporto?

"Já há 40 anos, no meu livrinho A Prática e a Educação Física, eu escrevia: “Como não poderia deixar de ser, o desporto, que já de si pressupõe competição e agonismo, foi enredado naturalmente no clima conflituante que é a essência do fluir do tempo em que vivemos. A situação de violência do desporto decorre dum processo de violência em que o mundo todo (,,,) se encontra envolvido (…). O desporto é competição? Mas a competição não é encontro, não é intenção e presença de fraternidade: tudo nela é perfeita incubação de ódio e de guerra, de perplexidades e de angústias” (p. 106).
Em opúsculo, também da minha autoria, editado em 1999 e que dá pelo nome de Algumas Teses sobre o Desporto, eu tentava esclarecer: “Desde a esquerda à direita, as soluções políticas são as mesmas. E as desigualdades mantêm-se, sem solução à vista. Ora, não se realenta o optimismo dos povos com chavões comicieiros e com sonoras vitórias desportivas. Demais, o desporto de alta competição (ou de altos rendimentos) é tão classista e excludente como o neoliberalismo que o governa. Num ponto havemos de convir: ao invés do que parece dizer uma insistência verbal exaltadora, mormente de alguns políticos, ele adormece os marginalizados à recusa da sociedade injusta estabelecida” (p. 128).
E, neste mesmo livrinho, eu deixava uma proposta aos desportistas: “O desporto é, na realidade, um meio de catársis. Por ele, deves purgar-te do homem que foste antes do que és, isto é, do primarismo e do selvagismo que ainda te habita. O desporto de alta competição é uma aliança do maravilhoso e do dramático, onde os mitos e os deuses pululam e se afirmam. Mas os mitos e os deuses, no seu eterno presente (M. Eliade) estão aí com um flagrante primitivismo, embora a exemplaridade de muitos deles, embora o sentido e a religiosidade que lhes é inerente. Assim, não confundas combatividade com agressividade, não faças do árbitro o réu dos inêxitos do teu clube; aprende a ritualizar, humanizando, o drama e a festa, típicos da alta competição. No desporto, ninguém joga contra ninguém, porque se joga com todos (pp. 38/39).
Que o desporto progrediu, tecnológica e tecnocientificamente, é indubitável. Com os meus 84 anos de uma vida, próxima de atletas e de treinadores desportivos, principalmente de treinadores de futebol, tendo feito mesmo amizade com alguns deles; com o estudo e a investigação, no âmbito da filosofia e da epistemologia do desporto, em que fui, com as minhas inúmeras limitações, um dos pioneiros, no nosso País – julgo poder adiantar, sem receio, que o progresso do desporto português é evidente. Só que o progresso científico, quando o invocamos, nem sempre o referimos ao desenvolvimento humano que dele resulta., mas antes ao progresso da ciência como progresso do conhecimento. E aí ficamos! Por outro lado, o nascimento da educação física e do desporto é, digamos assim: o prolongamento, neste âmbito, da ciência clássica e da visão cartesiana de corpo. A educação física nasce no século XVIII e o desporto no dealbar do século XIX. Informa-os, por isso, o dualismo antropológico racionalista, a quantificação da natureza (Galileu) e o determinismo e a inexistência do acaso, que ninguém então punha em dúvida. Aliás, em 1887, o director do gabinete de patentes de Nova Iorque demitiu-se, alegando nada mais haver para inventar. A ciência, segundo ele, atingira o fim da sua história.
Cito, agora, um trecho de O Princepezinho, de Antoine de Saint-Exupéry: “As pessoas grandes gostam de números. Quando vocês lhes falam de um amigo novo, as suas perguntas nunca vão ao essencial. Nunca vos perguntam: “Como é a voz dele? De que brincadeiras é que ele gosta mais? Ele faz colecção de borboletas?”. Mas perguntam-vos : “Que idade é que ele tem? Quantos irmãos tem? Quanto é que ele pesa? Quanto ganha o pai dele?”. É só com números que eles julgam que ficarão a conhecê-lo”.
Mas um conhecimento, só com números, esquece esta realidade insofismável: sempre que se encontra um ser humano, encontram-se também a crença e inúmeras manifestações do sagrado. O ser humano precisa do agasalho e do apoio doutros valores, para além dos científicos, para que a vida passe a ter o mínimo de sentido, para que a vida mereça, finalmente, ser vivida. É conhecida a frase de Rabelais: “ciência, sem consciência, é a ruína da alma”. A ciência, por si só, não pode dizer-nos o que é justo, ou o que é falso, ou o que é belo. E, assim, o ser humano se deixa aprisionar pelos múltiplos circuitos pulsionais do prazer e da vaidade e do poder e do consumo e da vingança e da inveja. Não poderei esquecer jamais o extraordinário livro de George Steiner, Nostalgia for the Absolute, que li em tradução castelhana das Ediciones Siruela, onde este crítico literário e filósofo nos revela o vazio deixado, no homem hodierno, pelas religiões tradicionais, substituídas por inúmeras “ideologias de reposição”, onde cabem perfeitamente um clubismo faccioso e o populismo de certos dirigentes desportivos. Atento à exclamação de Ivan Karamazov, “Se Deus não existe, tudo é permitido”, Nietzsche aconselhou os homens sem Deus a um comportamento “para além do Bem e do Mal” e portanto a sentarem-se no trono que outrora pertencia a Deus Uno e Trino.
No nosso futebol, a atitude permanentemente amuada e puerilmente orgulhosa de alguns dirigentes, o gáudio interesseiro doutras pessoas que os servem e o púlpito de baboseiras em que se transformou certa Comunicação Social – de tudo isto se infere que também essas pessoas se julgam “para além do bem e do mal” e que portanto esperar delas uma esmerada correcção, um pouco de equilíbrio e discernimento é pedir-lhes o que não sabem ou o que não podem dar…
Tony Judt, um historiador notável e um indómito intelectual, diz-nos, no seu Pensar o século XX (Edições 70, Lisboa, 2012) que Hannah Arendt tem razão quando sublinha que “o significado do Holocausto não está provincianamente confinado às vítimas judías e aos criminosos alemães, pois que só pode ser compreendido em termos universais e éticos (…). Isso leva à questão da despreocupação relativa de Sartre com a responsabilidade francesa, no Holocausto” (p. 53). E lá volto eu a Hegel: “A Verdade é o Todo”. E o Todo deste vendaval de paixões, desta atmosfera malsã, que sacodem o nosso futebol, não se resume a alguns dirigentes e jornalistas e comentaristas, ainda que pareçam estes os principais responsáveis, porque nele encontramos muita outra gente que parece não ser talhada também para uma convivência salutar.
Se as audiências crescem, quando um jorro de suspeitas e de ressentimentos desaba sobre os “écrans” da televisão, não vale a pena andarmos a atirar as culpas uns para cima dos outros. As razões dos acontecimentos são bem mais fundas do que as culpas deste ou daquele cidadão. Os panegiristas devotos de um clubismo cego, os trampolineiros disfarçados de quixotes ou de catões são, unicamente, os que melhor corporizam a cultura desportiva que distingue muitos, muitíssimos portugueses! Converter o Desporto num espaço indispensável à formação, mormente dos mais jovens, nos valores da solidariedade, da justiça, da coragem, da disciplina, da coopetição (ou seja, de uma competição que seja também cooperação com os nossos colegas de equipa e com os nossos adversários), do respeito pelos outros e por nós próprios, da transcendência simultaneamente física, intelectual e moral; integrar uma disciplina de Ética, nas licenciaturas em Desporto e nos cursos de treinadores desportivos; potenciar, na Escola e nos Clubes e nas Famílias, um Desporto que seja, sempre e em todas as circunstâncias, Jogo, Humor, Festa, Solidariedade (designadamente com os nossos adversários) e Coopetição – nada disto, que radica no que de mais autêntico o Desporto é e tem, se confunde com o espectáculo da mediocridade, da parva demagogia de certos “agentes do futebol”. Por isso, pergunto eu: será Desporto o futebol mais publicitado e propagandeado?"

«Vamos para o estádio.. que se faz tarde!...»

"Após o calendário competitivo ao nível das exigências por parte dos jogadores dos clubes nas respectivas selecções e a retoma de funções nos clubes de origem, vendo-se-lhes associados novos interlocutores, advindo dos diversos mercados de transferência, estaremos naturalmente atentos ao percurso dos seus níveis de apronto para a tarefa, que basicamente deverá ter como suporte um plano suficientemente claro no concernente ao modelo de jogo já existente e demais características de apuramento para um previsível sucesso.
No que respeita aso jogos das selecções, com os jogadores a sujeitar-se a uma média de oito a dez dias de interregno de rotinas presenciais de treino no seu clube, pelo facto de ainda encontrarem outros graus de exigência comportamental, técnica, táctica, competitiva e emocional, tendo na sua liderança equipas técnicas diferenciadas, com objectivos de conquista medidos a curto prazo, será mais um facto a ter em avaliação de retoma competitiva interna.
Também a acrescentar a definição de utilização ou não de jogadores e sua correspondência ao rendimento e resultado exposto, associando mais um facto por parte de alguns jogadores em pressão constante neste paradigmático dilema de mudança ou não de clube, viagens, alterações climáticas e consequentes adaptações a situações de possível dessincronização neuro biológica, podemos sem dúvida permitir que o julgamento da prestação não vive em “lar de solteiro”.
Porventura, julgo eu, esta paragem competitiva ajudou a reconstruir um colectivo mais coeso por parte de equipas em que porventura não viram convocados alguns dos seus activos nas selecções, procurando colmatar algumas deficiências de resultados negativos obtidos ou por questões conhecidas de jogadores que se encontravam lesionados ou em processo de recuperação.
Perante os fenómenos evidenciados, nuns e noutros casos, será muito interessante verificar esta readmissão de processos na competição que regressa e verificar o “andamento” das equipas e dos seus jogadores por comparação do ranking de rendimento de competências adquiridas em termos do tempo próximo passado … isto é, para quem tem os dados objectivamente definidos na avaliação comportamental de desempenho!..."

Primeiro nós? Melhor, é para todos

"A Federação Inglesa (FA) decidiu, em função das inúmeras questões levantadas pela enorme janela de transferências no futebol, que, em Inglaterra, o mercado passa a fechar na quinta-feira anterior à 1.ª jornada do campeonato.
A UEFA e o seu Presidente, Clubes da Premier League, treinadores participantes no Fórum de Treinadores de Elite da UEFA (recentemente ocorrido em Nyon, onde estiveram também quatro treinadores portugueses: José Mourinho, Leonardo Jardim, Rui Vitória e Sérgio Conceição), concordaram maioritariamente, sem unanimidade.
Foi uma decisão interessante contudo, como vem sendo hábito nestas instituições, com ausência de plano global e estruturado.
Ou seja, os jogadores de clubes ingleses que sejam alvo dos emblemas de outras ligas que não adoptem essa data limite mas mantenham a de 31 de Agosto, podem ser contratados embora fora da Liga Inglesa.
E os clubes ingleses podem vender para essas ligas que mantenham o limite actual, embora estejam impedidos de o fazer para clubes da sua liga.
Essa decisão resolveu o quê? Muito pouco ou quase nada. Os mercados emergentes, a manter-se a tendência, vão ocupar lugares cimeiros em termos de investimentos no futebol. Os casos Neymar e Mbappé são só dois exemplos do que pode vir a generalizar-se.
A grave cise económica que abalou o mundo resultou também de “má conduta e por mentir a investidores” (decisão do Departamento de Justiça dos EUA para com o Goldman Sachs, que por isso foi fortemente multado). Bernard Madoff foi outro dos responsáveis que foi condenado a longa pena de prisão.
A volatibilidade dos mercados financeiros, as estratégias com investidores de capital de risco, a “Estização” do poder económico (China, Arábia Saudita, etc), a apetência pelo mediatismo, a deslocalização de grandes eventos (por exemplo, Mundial de Futebol do Catar 2020), a corrupção e a grande dificuldade em ser detectada, a politização do poder do futebol, os paraísos e regimes fiscais completamente diversos, a força crescente das apostas desportivas para níveis impensáveis e com risco de interferência de viciação de resultados, são muitas das questões a colocar para se poderem prever rumos e anteciparem decisões.
A FIFA, como entidade planetária, tem de ser envolvida na versão final de uma regulamentação adequada aos sinais dos tempos e de assumir controlo exemplar e sem mácula.
Prestigiando-se e derrotando condições favoráveis a corrupção, a FIFA, com o apoio das Confederações Continentais e, portanto com todas as Federações Nacionais, tem o dever de defender o futebol com competência.
A única linguagem comum à escala planetária, o futebol, mais do que competição e negócio é acima de tudo uma expressão do génio humano.
Não decidam alterações sucessivas para experiências contínuas de pormenores insignificantes. Construam planos estáveis e evolutivos, projectos diferenciados localmente mas integrados num mesmo conceito global.
Não parem de investigar, de perguntar, de conhecer as realidades e as preocupações.
O futebol mantém-se como fenómeno intergeracional vivo, motivador, imparável, livre na criatividade.
Impedir as ameaças, travar os exageros, equilibrar as decisões sem perder a noção do conjunto, só com grandes “equipas”.
Se em cada Federação se criar um grupo de “pensadores do futebol” para tentarem antecipar problemas e sugerirem caminhos, já poderia ser um bom pontapé de saída, desde que a escolha nunca seja condicionada. Os dirigentes têm uma importante palavra a dizer para que possam ser aceites como determinantes no futuro da modalidade.
Não se pode sequer imaginar que um forte grupo económico com a conivência de apoio local possa interferir directamente (através de contratações que “destruam” equipas) para mudar o poder numa dada região e beneficiar ainda com jogos de apostas.
Coerência, responsabilidade e competência podem ser “excelentes reforços” para um aberto jogo vitorioso de inclusão e nunca um jogo fechado por interesses alheios e estranhos."

Benfiquismo (DXCII)

Gato !!!

Excelente início...

Águas Santas 20 - 22 Benfica
(12-13)

Excelente vitória, num Pavilhão onde o Benfica tem sempre muitas dificuldades... Recordo que na pré-época tínhamos perdido com o Águas Santas!
Apesar das limitações ofensivas, conseguimos vencer, com um excelente trabalho defensivo, principalmente no 2.º tempo... Isto apesar de mais uma daquelas 'encomendas' arbitrais dos 'clientes' habituais: Nicolau/Caçador!!!

Parece que o Terzic está novamente lesionado! Também parece que a lesão não é tão grave como as anteriores, mas irá ficar de fora algum tempo... Num Campeonato, de regularidade, onde os Corruptos vão dando sinais de bastante fragilidade (algo que não se via à muito tempo...), um Benfica com mais dois Laterais (Esquerdo e Direito) - mesmo com o desequilíbrio absurdo de orçamentos -, iria lutar pelo titulo com os Lagartos até ao fim... Se não 'entrar' ninguém, vai ser muito complicado!

Vitória no Oeste !!!

Burinhosa 2 - 4 Benfica

Estreia vitoriosa, numa deslocação sempre complicada... o recente empate, com este adversário, no jogo de apresentação na Luz (foram só 20 minutos...), foram um aviso sério para as dificuldades que nos esperavam...
Nunca estivemos a perder, mas só a meio da segunda parte - depois de um golo muito mal sofrido -, 'decidimos' o jogo a nosso a favor! Apesar de mais um festival de oportunidades desperdiçadas de forma escandalosa...!!!

Destaque para a estreia oficial do Roncaglio... Recordo que na Supertaça, misteriosamente, o ex-clube ainda não tinha enviado a documentação exigida (algo que no caso do Divanei, enviou...!!!).

Discurso do ódio nos clubes de futebol

"Os canais de TV de clube sucederam aos jornais desses clubes e deles herdaram o sectarismo e a disponibilidade dalguns para a sabujice.

Com o advento dos canais de televisão dos clubes, surgiram as armas de destruição em massa do que restava de honradez e credibilidade da orgânica do futebol em Portugal.
Vocacionados para impedir o contraditório, anular as bases mais essenciais que colocam os media como um pilar decisivo às democracias avançadas em todo o mundo e ainda criando um palco permanente para aventuras populistas e cultos de personalidade, os canais de televisão dos clubes sucederam, com restrito sucesso, à grotesca intransigência que já se verificava na maioria dos jornais de clube, sempre marcados por uma filosofia editorial baseada no sectarismo e, tal como hoje, na disponibilidade para a sabujice dos habituais vencidos da vida.
Hoje, os canais têm outro impacto, mesmo que virados para plateias resumidas, pouco dispostas à crítica e à razão, tomando sempre por bom e verdadeiro não tudo o que poderá ser bom e verdadeiro, mas o que gostariam que fosse.

A linguagem de alguns programas televisivos de informação geral e que tratam, cada vez com mais frequência, da discussão do futebol em função da obsessão das audiências, veio rapidamente somar-se à linguagem brejeira e vulgar dos momentos televisivos mais sectários desses talibãs com assento fixo nos canais de clube.
Daí a esta conhecida e reconhecida balbúrdia no oeste foi um pequeno e inocente pulo de criança. De qualquer forma, é importante assinalar uma diferença decisiva: mesmo quando usa a linguagem vulgar, o argumento primário e o mesmo pensamento cego dos piores programas dos canais de clube, as televisões generalistas não devendo propriamente orgulhar-se daquela pobre matéria editorial, pelo menos, têm a vantagem de criar situações de contraposição, de discussão plural, de visão diferenciada que é a única maneira de distinguirmos um programa de entretenimento televisivo de um programa de mera propaganda pessoal ou clubística.

No seu mais recente documento a criticar duramente as acções de intimidação que levaram corajosos anónimos a vandalizar o local de residência de um árbitro, o Conselho de Arbitragem fez uma análise perturbadora mas certa do momento e apontou responsabilidades a supostos responsáveis que do futebol apenas querem uma cadeira mediática no palco. Um documento importante que nos vem falar, com toda a propriedade no discurso do ódio usado, hoje, pelos clubes.
É, de facto, nesse ponto que estamos, em matéria de discussão nacional do futebol português: O ódio e o seu discurso!

Dois exemplos recentes e significativos, que por razões de higiene mental queremos poupar aos nossos leitores, mas que vale a pena referir resumidamente, porque muito significativos.
O primeiro registou-se num programa azul e branco no Porto Canal e que costuma ter como intérprete regular o actual director de comunicação do FC Porto. Com um conjunto de pontas soltas que terá suposto serem reais e conclusivas, sem qualquer ideia deontológica da necessidade de contraditório e esquecendo que o FC Porto, pelos vistos, só controla a correspondência dos e-mails oficiais do Benfica, mas não os privados, Francisco J. Marques fez, em relação ao jornal A Bola e a alguns dos seus jornalistas, um conjunto de acusações graves, injustas, provocatórias e, acima de tudo, despudoradamente falsas. Daí decorrerá outro caminho que facilmente o irá provar, mas aqui o que importa agora é perceber como esse discurso de ódio varre tudo o que apanha, confunde, denigre, dispersa acusações gratuitas, numa vulnerabilidade de factos que supõe terem existido, de acontecimentos que imagina terem sucedido para, no fundo, chegar ao destino que deseja. Ou seja: a cegueira é tal que parte de onde quer chegar e chega de onde já queria partir. É tão grotesco que se mata a si próprio de ridículo.
Para Francisco J. Marques, se por acaso eu lhe pedir uma esferográfica emprestada e com ela escrever um depoimento de Pinto da Costa, o ex-jornalista entende que de facto foi ele próprio quem escreveu o depoimento do seu chefe.

O segundo exemplo passa pela omnipresente figura de Bruno de Carvalho e do seu acólito Saraiva. São ambos e na devida escala, que o presidente do Sporting determinará, os cavaleiros andantes da nova saga de batalhar contra tudo e contra todas, mesmo que no todo estejam os nossos e aqueles que, como nós, não têm nem nunca tiveram nada a ver com essas guerras em que tanto gostam de se envolver. É, como diz Bruno de Carvalho, uma questão de estilo e não duvido que desse estilo não passe nem mude.
O caso, procurando falar sério por respeito ao Sporting, é o que respeita à credibilidade. Um presidente pode dizer mandou um treinador não pôr mais um dos seus jogadores enquanto ele não lhe dissesse o contrário e pode também dizer que é o responsável pelo William Carvalho ter tido uma carreira, achando ser uma questão de descartável pormenor o talento do próprio jogador. Ou seja: Tal como se provou em toda a História do futebol português um presidente de clube pode achar que pode dizer tudo porque é Deus, mas não é. Deus está e vai estar muito mais tempo no poder do que o presidente do Sporting ou qualquer presidente de clube. Por isso Deus é Deus e os presidentes de clubes são apenas e só passageiros em trânsito para o esquecimento.
Perceber isto não é apenas um exercício de louvável humildade, mas um exercício de louvável inteligência, com ou sem desenhos.
Do estilo do presidente do Sporting e do conteúdo das suas intervenções, apesar das hipotéticas ameaças e pressões que me são feitas, dos gostos e dos desgostos que lhe possa provocar, continuarei, por dever de ofício e não por particular felicidade ou qualquer interesse intelectual que, de facto, como já lhe disse em privado, em relação a ele não tenho nenhuma, a ser um observador atento e rigoroso, porque faço questão de continuar a ser um crítico justo e um analista que honra o compromisso com os seus leitores e o compromisso com a grandeza de carácter de A Bola que pode não ser maior, mas também não é menor do que a de qualquer clube de futebol em Portugal e no mundo."

Vítor Serpa, in A Bola

Almeida, o bruxo de serviço

"Puxa uma cadeira e senta-se uma pessoa à mesa de um café onde já estão sentadas outras quatro ou cinco individualidades. O tom da conversa é desmesuradamente exaltado sendo o assunto ou política internacional ou futebol ou jardinagem ou desemprego de longa duração. Na realidade, tanto faz. Qualquer que seja o tema em apreço é a exaltação geral que se sobrepõe. Já jantada, sentadinha à mesa do café diz finalmente essa pessoa o que lhe vai na alma sobre isto ou sobre aquilo e caem-lhe em cima os demais comparsas em desacordo numa chinfrineira sem medida. São quatro ou cinco contra um. A conversa prossegue, dá à volta à mesa e todos exprimem com alarido opiniões incrivelmente iguais sobre tudo até chegar outra vez a vez do último a chegar que, constrangido pela desproporção em vigor, lá dá ao seu parecer sobre os tópicos em discussão. Logo lhe voltam a cair em cima os outros clientes numa tal gritaria que até parece coisa de gente doida. Uns impedem-no de falar batendo com as mãos no tampo da mesa, outros espumam-se e reviram os olhos e outros desatam a debitar recordações sobre as visitas que faziam à madrinha na Páscoa no tempo em que as madrinhas lhes davam saquinhos com amêndoas e já era um pau. O empregado de mesa não só não mexe uma palha para por cobro aos desacatos como ainda vai servindo doses reforçadas de cafeína porque o patrão lhe disse que estava ali para vender bicas e não para vender chá de tília que dá sono segundo a tradição popular. Um cidadão comum colocado perante uma situação destas, impossibilitado pela grossa maioria de exprimir as suas mais banais opiniões à mesa do café só tem duas opções: ou se levanta e vai para casa tranquilamente deixando os demais a falar sozinhos ou, se for dado a ímpetos socialmente condenáveis, levanta-se e, antes de voltar para casa, vira a mesa do café provocando estardalhaço e uma quantidade de louça partida. Ou não é assim? Toda esta historieta para sugerir que talvez esteja na altura de o departamento de comunicação do Benfica repensar seriamente os termos e os objectivos da participação – ou da não-participação – dos seus esforçados e minoritários comunicadores nas charlas televisivas que, na verdade, só existem maioritariamente à pala do mesmo Benfica.
O que Sporting e Benfica ontem sofreram para vencer o Feirense e o Portimonense deitou um bocadinho por terra a teoria de Manuel Machado e de todos os que, como ele, entendem que a diferença de orçamentos entre as equipas da Liga é determinante e incontornável. Ontem o Sporting só contornou o Feirense no oitavo minuto do tempo extra e o Benfica para vencer os algarvios passou pela vergonha de ter de agradecer ao vídeo-árbitro a anulação – certíssima – do segundo golo de Fabrício e pela vergonha de sofrer as passas do Algarve quando jogava em superioridade numérica contra um recém-promovido. Se foi questão de bruxos, os bruxos estiveram em grande. Os bruxos e André Almeida."

Resultado melhor do que exibição

"Houve demérito do Benfica, sim, mas também muito mérito do Portimonense.

Má entrada das águias
1. Foi um jogo realmente complicado para o Benfica, mas faz parte do futebol, todos o sabem: tanto pode ganhar-se a jogar bem como a jogar menos bem. Ontem, para as águias, foi o segundo caso, numa noite em que o resultado foi claramente melhor do que a exibição. O Benfica não entrou bem, desde o início que teve muitas dificuldades em criar lances de perigo e, por outro lado, em suster os venenosos contra-ataques desenhados pelo Portimonense, uma equipa que do ponto de vista táctico foi quase perfeita, provando que, ganhando ou perdendo, tem sido uma das melhores formações do campeonato neste arranque de temporada.

Questão de lentidão
2. Os problemas ofensivos do Benfica justificam-se pela forma muito lenta, sem criatividade, como a equipa procurou criar espaços. Neste tipo de jogos, são precisamente a velocidade e mobilidade que permitem a criação de desequilíbrios nas defesas adversárias, e de uma forma geral é algo que a equipa encarnada até costuma fazer bem. Mas não desta vez. Essa dificuldade foi particularmente evidente nos corredores laterais, mas não só. A equipa esteve algo apática, o que também se reflectiu na falta de reacção às rapidíssimas transições do adversário, devendo sempre frisar-se que ao demérito do Benfica se somou o enorme mérito do Portimonense, pela forma organizada e disciplinada como se apresentou a defender e a atacar, num desenho de 4x1x4x1 interpretado por executantes de muita qualidade e velocidade que aproveitaram muito bem os espaços concedidos pelo Benfica: Paulinho, Fabrício, Wellington, Nakajima... O Portimonense foi sempre uma equipa muito perigosa e tenho dúvidas de que perdesse o jogo em igualdade numérica. Aliás, mesmo com a expulsão, e apesar de o Benfica nesse período ter finalmente criado mais ocasiões para marcar, a formação de Vítor Oliveira esteve muito perto de pontuar na Luz. O que, a acontecer, seria justo.

Uma defesa muito sozinha
3. Sobretudo na reacção à perda de bola, o Benfica pareceu ser uma equipa muito cansada, com muitas dificuldades físicas, pelo menos em alguns das suas unidades, não sei se foi algo relacionado com os compromissos internacionais. A verdade é que a intranquilidade defensiva esteve presente praticamente do princípio ao fim, apesar de o sistema táctico ter sido o habitual. Percebia-se que rapidamente se criava um buraco, uma enorme distância entre sectores, com a defesa praticamente sozinha diante dos intérpretes das investidas adversárias, por vezes até em situações de superioridade numérica de quatro para três por parte dos visitantes. E aqui há que vincar: Fejsa faz muito falta às águias do ponto de vista do equilíbrio defensivo. Foi o jogo menos conseguido do Benfica esta temporada, mas há dias assim, faz parte. Vai acontecer a todos os candidatos durante o campeonato."

Álvaro Magalhães, in A Bola

Dá-lhes, batanete, dá-lhes!

"Ao pé disto a cena do major em roupão passou a ser das coisas mais chiques do futebol português.

No remanso do lar, confortavelmente sentado no sofá sem deixar cair aquele sorriso de uma aprovação que vem do fundo da alma, com que orgulho deve o presidente da Liga ter assistido na noite de terça-feira à prova oral do presidente do Sporting, o seu colega de estudos. Ambos terão frequentado o mesmo estabelecimento do ensino superior e, por isso mesmo, ambos são doutores e camaradas de armas na linha da frente da luta pelo progresso. E não se trata de um progresso qualquer. Trata-se de fazer avançar para patamares invejáveis em toda a Europa civilizada a maravilhosa indústria do futebol nacional.
- Que talento! – disse o presidente da Liga, falando com os seus botões, quando viu o presidente do Sporting embrenhar-se na imitação do filho de um presidente de um clube com quem teve um desaguisado recentemente.
– Dá-lhes, batanete! – clamavam, entretanto, pelos cafés dos subúrbios os apoiantes do presidente do Sporting definitivamente conquistados pelo momento único a que acabavam de assistir.
- Impecável! – murmurou embevecido o presidente da Liga quando viu o presidente do Sporting puxar dramaticamente da Constituição da República para fazer valer a sua liberdade de expressão e ignorar os castigos absurdos que um qualquer órgão disciplinar lhe impôs por dá cá aquela palha.
O presidente do Sporting reservou para si o estúdio da Sporting TV na já histórica noite de terça-feira passada porque terá sentido uma urgência em explicar à minoria ínfima de sócios que não o veneram as verdadeiras razões pelas quais dois ‘capitães’ do clube ficaram tão amarfanhados no fecho deste mercado. O caso de Adrien que vai estar sem jogar até ao Ano Novo e o caso de William que vai estar sem jogar até que Jorge Jesus, o psicólogo anunciado, o consiga recuperar para a vida activa poderiam estar a provocar algumas ondas de incompreensão – mínimas, esclareça-se… - entre os sportinguistas menos dados a deliciar-se com estas práticas de gestão. E como nesta luta não está sozinho, visto que escolheu o presidente do Porto para companheiro de estrada, não espantará que este também tenha assistido à emissão televisiva por uma questão de delicadeza. - Ao pé disto aquela cena do major em roupão à porta de casa passou a ser um dos momentos mais chiques do futebol português! – terá proclamado o pensativo presidente do Porto, quando viu o presidente do Sporting a representar para a câmara o expelir do fumo pelo nariz e pela boca. Ai o progresso! O progresso que os confunde.

Outras Histórias
O fim da Aliança Luso-Britânica
Falta a chancela do Porto Canal aos emails do West Ham
Os jornais noticiaram a decisão do West Ham no sentido de processar o dirigente ‘tuga’ que chamou "dildo brothers" aos responsáveis do clube inglês. Por ignorância, puritanismo ou alto sentido de Estado, a tradução para língua portuguesa da expressão em causa foi, de um modo geral, sonegada aos leitores nacionais deixando perplexos os que não dominam estas áreas de conhecimento linguístico e vocabular. Mas processado porquê? – ter-se-á interrogado muito boa gente antes de correr ao Google para solucionar o bicudo caso. Entretanto, sem menor pinta de fleuma, os britânicos, de tão ofendidos que ficaram, desataram a mandar para a Sky Sports – uma minúscula estação de televisão inglesa que funciona numa loja de sapateiro num bairro pobre de Londres – uns ‘supostos’, "alegados", "forjados" e "mal amanhados" emails. Coitado do West Ham! Coitada da Sky Sports! Mal sabem eles que para os seus ridículos emails serem levados a sério falta- -lhes a chancela do Porto Canal."