Últimas indefectivações

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Noite Europeia

""Ter uma massa adepta como esta é sempre muito importante. Os adeptos têm sido incansáveis no apoio à equipa do princípio ao fim."
Foi com estas palavras que Buno Lage terminou a conferência de Imprensa de antevisão ao jogo com o Shakhtar Donetsk, cujo início está marcado para hoje, às 20h00, no Estádio da Luz.
Mais do que destacarmos a constatação, por parte do nosso treinador, de uma das virtudes mais proeminentes dos benfiquistas, pegamos na sua afirmação para simultaneamente enaltecermos a dedicação dos nossos adeptos e apelarmos para que a Onda Vermelha de apoio à nossa equipa persista hoje à noite, naquele que será, certamente, um desafio revestido de enorme dificuldade tendo em conta a indiscutível qualidade do nosso adversário e a desvantagem trazida da primeira mão.
O Shakhtar, à semelhança do Benfica, chegou à Liga Europa via fase de grupos da Liga dos Campeões. Assim como o Benfica, a equipa ucraniana esteve perto de obter o apuramento para os oitavos de final da prova num grupo cujos apurados venceram, agora, na primeira mão da eliminatória em disputa. City e Atalanta, como Leipzig e Lyon, estão em vantagem a meio da contenda.
Mas, não obstante o reconhecimento da competência do nosso adversário, queremos ganhar e prosseguir na competição.
Dos objectivos traçados para a temporada, para já está cumprido o relativo à Supertaça. Quanto aos restantes, com as provas em curso, nada se poderá concluir ainda, sem desprimor do bom percurso até ao momento, pois lideramos o Campeonato Nacional e apurámo-nos para a final da Taça de Portugal. Na Europa, pretendemos superar o desempenho da temporada passada e este desiderato começa por, hoje, eliminarmos o valoroso Shakhtar Donetsk.
Temos consciência da dificuldade, mas confiamos que a nossa equipa saberá ultrapassar o obstáculo complicado que tem pela frente. E resta-nos uma certeza: com o apoio incessante e entusiasmante dos nossos adeptos, estaremos mais perto de consegui-lo.
#PeloBenfica"

SL Benfica | As 5 maiores reviravoltas encarnadas na Europa

"A História não está do lado do SL Benfica. Quando entrar em campo esta quinta-feira, para virar o resultado de Kharkiv contra o FK Shakhtar, os encarnados terão o peso das suas experiências anteriores a contrabalançar o que se espera ser uma noite boa para a equipa.
Das 36 vezes que o Benfica entrou a perder nas eliminatórias europeias, apenas em 11 conseguiu virar o resultado e avançar para a próxima fase. Uma clara demonstração de que o clube se sentirá sempre mais confortável a gerir o resultado e não em busca dele, mas nem sempre as condições se reúnem para que tal aconteça e a má fase da equipa impossibilitou tais circunstâncias.
Conseguirão os comandados de Bruno Lage inverter o próprio legado do clube e avançar na Liga Europa? Como fonte de inspiração, ficam aqui as maiores reviravoltas europeias, por ordem cronológica.

1. SL Benfica 3-1 Fenerbahçe SK (agregado 3-2) – Ocupado entre Campeonato, Taça e Europa, aquele trágico Benfica de Jesus tinha que gerir os momentos e o plantel.
Loucura ou necessidade, o jogo em Instambul é jogado com muitas das segundas linhas e a ideia era clara: aguentar resultado curto para resolver na Luz, com a artilharia em peso. Mas em épocas de luxo, as segundas linhas acabariam por ser André Gomes e Aimar, que comanda a equipa a exibição confortável e o 1-0 para os turcos é aceitável.
Tal como planeado, na Luz a equipa é apoiada por 65 mil gloriosos benfiquistas que transformaram aquela noite num dos melhores ambientes da nova Luz, a par do jogo com o United em 2005. Gaitán e Cardozo fizeram o resultado e o paraguaio, como homem do jogo, inscreveu ainda mais o seu nome na história do Benfica.

2. SL Benfica 1-0 Olympique Marseille (2-2 agregado) – Diz quem viu que a partida no Velódrome em 1989/1990 foi dos maiores amassos que o Benfica levou – aliás, o 2-1 final foi uma benção divina, tal não foi o desnível entre as equipas.
Havia Mozer, Deschamps, Francescoli, Waddle e Jean Pierre Papin nos campeões gauleses, pelo que foi natural a ideia de Eriksson em aguentar na primeira mão e dar o assalto na segunda. Com 120 mil nas bancadas, o ambiente ensurdecedor levou a equipa para a frente e ofuscou a constelação de Marselha, que atónitos ficaram com a forma como o Benfica se agigantou e virou a eliminatória.
A mão de Vata já no final do jogo mais não foi que uma lição adiantada de karma: em 1993, surgiria o escândalo da corrupção e o clube cairia na Ligue 2. Bernard Tapie, o presidente, foi forçado a demitir-se e condenado à prisão. O Benfica avançaria até à final do Prater, perdendo frente ao AC Milan de Sacchi (0-1).

3. SL Benfica 5-1 Feyenoord Rotterdam (5-2 agregado) – Num período de domínio holandês na Europa, com Ajax e Feyenoord a dividirem louros nas conquistas, começava-se a discernir o legado que a escola holandesa iria dar ao mundo da bola.
O Benfica de Jimmy Hagan de 1971/1972 era uma equipa prodigiosa, com plantel sem igual (Néné, Jordão, Jaime Graça, Simões, Artur Jorge, Eusébio, Toni…), mas sucumbe na Banheira de Roterdão perante a técnica dos comandados por Ernst Happel. O lendário treinador austríaco insinua no final do primeiro jogo que os encarnados não se aguentariam na Eredivisie: sobranceria a potes e a motivação benfiquista em ebulição.
Na Luz, as palavras proferidas foram certamente engolidas por uma avalanche de futebol ofensivo, que atinge o auge quando Van Hanegem tem a triste ideia de reduzir aos 75’. Como resposta à audácia do ingénuo craque holandês, Néné por duas vezes e Jordão construiram a goleada na melhor versão dos “15 minutos à Benfica”.

4. SL Benfica 3-0 Celtic FC (3-3 agregado) – Não se trata de uma completa remontada, mas o misticismo à volta do episódio de 1969/1970 justifica a inclusão. O Celtic de Jock Stein era uma potência das ilhas britânicas e tinha ganho a TCCE três anos antes, no Jamor – a epopeia dos Lisbon Lions é a primeira saga de sucesso britânico na Europa –e apanhá-los, naqueles aúreos anos e logo à segunda eliminatória era tarefa ingrata para o Benfica de Otto Glória. Ousou-se falar em final antecipada, ideia que os jogos confirmaram.
Primeiro, os encarnados afundam num Celtic Park vibrante da mais pura loucura escocesa; duas semanas passadas, a Luz engalanava-se para operar a reviravolta. O 3-0 chegou aos 90’, por intermédio de Diamantino Costa, já o nervosismo se tinha transformado em desespero nas bancadas. Prolongamento e… nada. O desempate por penalidades, que só seria introduzido no ano seguinte, não estava nos planos.
Tal como na meia-final do Euro68, onde a Itália se safou de um 0-0 titânico frente à União Soviética, a arbitrariedade de uma moeda jogada ao ar iria determinar o desfecho de tão aguerrido confronto. Jock Stein e Billy McNeill de um lado, Coluna e Francisco Calado, adjunto do técnico benfiquista que não quis observar a tragédia in loco, transformaram o confronto futebolístico em jogo de casino. Cara ou Coroa? Billy disse a primeira e a sorte fez-lhe a vontade.

5. SL Benfica 6-0 FC Nuremberga (7-3 agregado) – Nos quartos-de-final da Taça dos Clubes Campeões Europeus de 1961, a caminho da final de Amesterdão, o Benfica (já com Eusébio) vê-se frente a frente com os máximos campeões germânicos, que, com oito títulos, até aí eram a principal potência da Bundesliga.
Para piorar a situação, a equipa é obrigada a enfrentar o rigoroso Inverno da Baviera no primeiro dia de Fevereiro, o que premedita condições que o sol lusitano impede-nos de testemunhar. É natural então a derrocada da primeira volta, 3-1 para os da casa, justificado pela hábito alemão e pelo relvado transformado em pista de gelo. Os portugueses, obviamente pouco dotados para a patinagem artística e sem calçado condizente, deram um trambolhão que só Costa Pereira evitou ser maior.
Na Luz, e com o solo nas perfeitas condições para a prática da bola, a técnica dos portugueses confundiu e ultrapassou a robustez adversária, que foram buscar seis às redes e agradeceram o apito final do árbitro. Águas, José Augusto (x2), Coluna e Eusébio (x2): foram estes os autores dos golos."

Play: Barcelos...

Um anjo e um diabo debatem o Benfica

"Era uma vez um anjo e um diabo a debaterem bola nos ombros de um Benfiquista:
Diabo: "Já fomos! Vamos perder este campeonato! Eu já andava a dizer isto há muito tempo, apesar das vitórias este Benfica não jogava nada..."
Anjo: "Mas que diabo...calma! Não perdemos nada o título! Foi apenas uma má fase, que acontece a todos, mas pensa assim: mesmo perdendo dois jogos continuamos em 1º lugar..."
D: "...deixa lá, que não vai ser por muito tempo! Isto vai ser o oposto do ano passado, agora são eles a recuperar de uma desvantagem de 7 pontos. Nós nunca nos conseguimos impor...de cada vez que penso que podíamos ir matar o título ao Dragão..."
A: "Sim, isso é verdade. Mas o Benfica ainda não sabe vencer títulos assim, calma e descansadamente. Mas sabe vencê-los no stress e nos nervos, ou não sabe!? Nós já fizemos isto, os últimos títulos foram sempre assim! Só precisamos de fazer novo sprint de vitórias...até temos um calendário aceitável e se há coisa que este Benfica sabe é ganhar às equipas "pequenas"..." 
D: "Olha-me este...não sejas anjinho! Vês a equipa com a força do ano passado? Achas que dás 10x0 este ano a quem quer que seja? Vês alguém a jogar como o João Félix, que até meteu o Seferovic a marcar 20 golos?".
A: "Não, não vejo...mas também vejo um Vlachodimos em modo "Saint Michel Preud'Homme", uma defesa que até há pouco tempo passava imensos jogos sem sofrer golos, um meio-campo com soluções de qualidade e um trio atacante com Rafa, Vinícius e Pizzi que é do melhor que há em Portugal."
D: "Oh. Para ti está sempre tudo bem, estás sempre no paraíso. A equipa mal consegue fazer 3 passes seguidos, voltámos ao modo "bombo" dos tempos do Rui Vitória. Eu bem te avisei que essa paixão assolapada pelo Lage ia correr mal, mas tu só vias um aro na cabeça dele, já o querias beatificar e tudo."
A: "Foi uma paixão de verão fantástica e ok, aceito que entrámos naquela fase em que já se começa a ver uns defeitos, mas quem te ouve falar parece que estamos no teu inferno que tanto gostas! Ganhámos a supertaça por 5x0, somos líderes a 12 jornadas do fim, estamos na final da Taça de Portugal e com tudo em aberto para seguir na Liga Europa. E dir-me-ás que a equipa não joga tanto como no ano anterior? Certo, mas o que se viveu o ano passado é que foi extraordinário! Quem é que faz uma 2ª volta só com um empate, ganhando em Alvalade, Braga e Dragão, com os 10x0 à mistura?"
D: "Olha, o mesmo treinador que agora quando se vê a perder, mete os 3 pinheiros Vinícius, Seferovic e Dyego Sousa especados na área à espera do chuveirinho, que não chega porque assim não há ninguém para meter a bola na área. Que ideia fantástica! Parece eu a jogar Football Manager e até aí essa táctica do "Tudo ao molho e fé em Deu....hummm, quer dizer, tudo ao molho e castiga Satanás" corria mal!
A: "Meu amigo, tirando Deus, ninguém é perfeito!"
D: "Tu és mesmo anjinho...o Lage tem que ir embora! E a seguir é o Vieira. Como é que um clube que já compra jogadores por 20 milhões e vende por 120 continua a ter tantas dificuldades com um clube intervencionado pela UEFA?"
A: "Lá estás tu...queres é ver tudo a arder! Pintas tudo como um cenário dantesco. O Benfica ganhou 5 dos últimos 6 campeonatos e está a 12 jornadas de fazer 6 em 7. E o FC Porto desde 2014 só venceu 2 troféus em 25! Compara isso com a hegemonia que eles tinham e diz-me lá se não vamos no bom caminho?"
D: "Bah, que visão cor-de-rosa da situação..."
A: "Enfim. Andamos aqui às voltas, mas tu não sais do ombro esquerdo e eu do direito...será que não conseguimos chegar a um consenso? Não há meio termo?"
D: "Esquece! Ou estamos no paraíso ou no inferno. Ainda por cima quando nos calhou em sorte, ou em azar, vivermos nos ombros de um Benfiquista. Por falar nisso, o que é que ele está a fazer?
A: "O de sempre! Durante a nossa conversa, verificou o calendário do Benfica, pagou as quotas e já está a combinar com os amigos a que horas chegam às roulotes da Luz antes do jogo começar, para o convívio habitual.
D: "Céus! Quer dizer, Infernos! A religião dele é mesmo o Benfica!""

O silêncio das panteras

"Emile Griffith, boxeur que matou Paret no ringue, escondia a sua homossexualidade na companhia de loiras espampanantes.

Emile Griffith trazia uma dor por dentro e não podia falar dela com ninguém. Aos fins de semana, quando saía à noite, procurava nunca ser reconhecido. Oscar Wilde chamava às suas escapadelas em busca de relações sexuais com outros homens – «Dinning with the panthers». Emile não lhes chamava coisa nenhuma. Suportava a vergonha e calava-se. Deixava-se envolver pelo silêncio das panteras.
No dia 24 de Março de 1962, Emile Griffith matou um homem em frente de uma multidão ululante. Na verdade não o matou logo ali, no ringue do_Madison Square Garden. Benny Paret ainda ficou dez dias em coma. Norman Mayler, que cobriu como repórter esse combate que decidia o título de campeão do mundo de pesos médios, escreveu que nunca tinha visto um homem bater noutro com tamanha violência. Ao 13.º assalto, Paret desmanchara-se junto às cordas como um cartucho de papel pardo e vazio.
Três meses antes, Paret, The Kid, tinha sido espancado brutalmente por um daqueles bulldozers que a história do boxe regista como montanhas de carne e músculo: Gene Fullmer. A sova foi de tal forma hedionda que todos ficaram convencidos de que jamais Benny voltaria a combater. Os médicos foram de opinião diferente. Carimbaram-lhe uma autorização oficial para que voltasse a ser sovado. Foi um caminho sem regresso.
Alguém escreveu um dia que Benny Paret, o cubano de Santa Clara, era analfabeto em duas línguas: castelhano e inglês. Não saber ler nem escrever não foi impeditivo de sucesso: tornou-se campeão do mundo de médios em 1960 e 1961. Começou aí a sua questão com Emile, se é que se tratou de uma questão.
Muita gente escreveu sobre Paret, de Lou Lipsitz, o poeta de To a Fighter Killed in the_Ring, a Dave_Smith, o cantor de Blues for_Benny Kid Paret, e a Mark Kozelek, que deixou musicado: 
«Benny Kid Paret came a good way
Climbed to the grey sky to raise his hands
Stopped by the better man».
O «better man», Emile Griffith, não conseguiu merecer tantas palavras escritas como o rapazola de Santa Clara que matou_à custa de punhos. Aliás, caiu de tal forma no esquecimento que um dia se lamentou: «Não me destruíram por ter matado um homem. Mas perseguiram-me a vida inteira por ter amado homens». E, no entanto, deixava-se fotografar ao lado de beldades loiras e espampanantes. Era a sua forma de esconder a dor das panteras.
Um dia, num documentário, vi um homem alto e melânico abrir os braços e declamar com lágrimas nos olhos:
«Comienza el round, voy hacia el centro
en este plan voy a perder
este es el round numero trece
¡voy a demostrarle quién es quién!
Me está llevando hacia una esquina
si caigo aquí me cuentan diez
¡Virgen del Cobre estoy perdido!
No puedo ver
No... pue.. do... ver...».
O homem era Nicomedes Santa Cruz Navarra, peruano, o trovador-ferreiro.
O dia 30 de Setembro de 1961 foi especialmente triste para Griffith. Perdera frente a Benny ao 15.º assalto de forma tão surpreendente que arrasou muitas casas de apostas. Afinal, em Abril aplicara a Kid um KO acachapante e não deixara muitas dúvidas que a diferença de estatura entre ambos marcava a sua superioridade a ferro em brasa. Além disso, suportara a forma viperina como o cubano lhe murmurara ao ouvido de cada vez que se encontraram num daqueles abraços que só os árbitros conseguem separar: «Maricón! Maricón!» Nessa noite, Emile Alphonse Griffith, o gigante de Saint Thomas, nas Ilhas Virgens, chorara como uma criança nos braços de um dos seus amantes sem nome. Paret saíra pela cidade festejando o título, cada vez mais convencido de que se tornara invencível. Humilhara Emile, desfizera-lhe a confiança, apoucara a sua masculinidade. Pusera em prática tudo o que aprendera na lei das ruas. Não imaginava sequer que tinha sido a sua vitória derradeira.
«¿Qué hemos de hacer nosotros los negros
que no sabemos ni leer?
Fregar escupideras en los grandes hoteles
encerar y barrer/manejar ascensores
en el Gran Club servirles de beber».
Nem mesmo depois de ter sido triturado por Fullmer, Kid perdeu a protérvia. Logo no primeiro assalto do combate fatídico de Madison Square Garden, passou uma das luvas pelas nádegas de Emile e ciciou uma porcaria. Viu o sangue raiar nos olhos do adversário. A cadeia de televisão ABC transmitiu tudo em directo. Os murros de Griffith pareciam golpes de bigorna. 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, e mais e mais, O árbitro não mandou parar a carnificina. A cara de_Benny é uma pasta de sangue. 
«La gente aplaude al que me mata
El referee no dice “break
Que mi mujer no sepa nada...
Mi nombre es Benny “Kid” Paret».
Dentro do peito de Emile rosnavam as panteras."

Modalidades - Semanada...

Benfiquismo (MCDLV)

Prontos...

Ódio de perdição

"Que segurança podem ter pessoas de bem e de paz e adeptos que levam a família e filhos menores à festa do desporto?

1. Sendo a terça-feira o dia da minha crónica semanal, sempre me calha o dia de Carnaval. Mas não é deste Carnaval que vou falar. Nestas alturas, sempre me lembro, de uma frase de Vergílio Ferreira: «Que ideia a de que no Carnaval as pessoas se mascaram. No Carnaval desmascaram-se».
Camilo Castelo Branco escreveu o livro Amor de Perdição em 1861. Um tempo em que ainda não havia sido inventado o futebol que, acima de todos os outros desportos, se tornou o mais universal e o mais popular. De tal modo, que, ao longo da sua história de cerca de século e meio, gerou amores também de perdição, paixões assolapadas e relações identitárias absolutas.
Perdição quer dizer, segundo os dicionários, acto ou efeito de perder, desgraça, estrago, danação, ou, ainda, desregramento. Qualquer uma destas indicações semânticas tem o seu lugar no futebol.
O problema é quando a estes diferentes estados de espíritos se junta, explosivamente, o ódio. Daí o título desta crónica: ódio de perdição, que vai invadindo, crescente e impunemente, o ambiente em torno e por causa do futebol.

2. Antes de entrar no tema que escolhi para hoje - o chamado caso Marega - recordo aqui e agora duas extremadas e dramáticas situações que enegreceram o futebol. A primeira relacionada com um notável jogador austríaco Matthias Sindelar, conhecido como o Mozart do futebol, que morreu numa fria noite vienense de Janeiro de 1939. Foi encontrado morto na cama do seu quarto com a sua mulher Camila Castagnola, uma judia de origem italiana. Sindelar, que era filho de emigrantes checos judeus, negou-se a jogar pela selecção da Alemanha nazi que passara a integrar a Wunderteam (equipa maravilha, assim era apelidada a selecção austríaca), como consequência de a Áustria ter passado a ser a província alemã de Ostmark. Hitler não perdoou. Os nazis ofereceram uma recompensa pela sua captura. O cerco ao jogador apertou-se, até que um dia a polícia informou da sua morte. Assim terminou a vida e a brilhante carreira de um jogador que foi popularmente eleito o melhor atleta austríaco do século passado.
A segunda, bem mais recente, sobre Albert Ebossé, jogador de futebol camaronês, que morreu em 2014, com 24 anos. No seu último ano, na idade de todos os sonhos, emigrou para jogar na 1.ª divisão argelina. Na última partida da sua curta vida, até marcou o único golo da sua equipa (JS Kabilylie), o que não impediu a derrota por 1-2. Quando regressava aos balneários, foi barnaramente atingido por uma pedrada na cabeça. Adeptos - inconformados com a derrota - atiraram pedras, como se, do outro lado, pedras estivessem. Curioso é que por cá, esta brutal morte do jovem africano surgiu no rodapé noticioso. Mesmo no desportivo.
Eis dois exemplos brutais do lado perverso deste desporto. Por um lado, o totalitarismo mais cruel e desumano a impor as regras e a esmagar a liberdade mais singela. Por outro lado, a fúria totalitária de quem vê um simples jogo de futebol como se de uma guerra se tratasse.

3. Sobre o que aconteceu em Guimarães já quase tudo foi dito. No calor do momento, no sofá caseiro, na tertúlia do café, nas análises comentaristas, nos compulsivos comunicados de todas autoridades políticas, associativas e clubistas. Tudo... até que o assunto se perca na memória dissolvente e selectiva, trucidada por um qualquer novo epifenómeno, que agite a rotina e alimente o sobressalto vampiresco dos mais inflamados. Depois, virá a necrótica indiferença que tudo banaliza. Até a própria indiferença...
Houve de tudo. Hipocrisia em estado puro, lágrimas de crocodilos, prantos falsos de ateadores profissionais do ódio e da violência verbal, panegíricos compungidos em programas que, todas as semanas, nos dão sangue e ajudam os mais jovens e os mais incautos a transformar rivalidades sadias em insanidades rivais, tiradas políticas e partidárias majestáticas de quem quer ser o primeiro a chegar. Tudo servido em regime de pot-pourri durante horas a fio e páginas sobre páginas.
Houve de todos. Dirigentes com défice de exemplaridade, que não sabem ser homens no fracasso, nem senhores no sucesso. Políticos mais preocupados com consequências sobre a candidatura ibérica ao Mundial-2030 do que com o caso em si. Autoridades disciplinares que abdicaram de ser parte da solução, para serem parte do problema, sobretudo pela omissão, pela ilusória arte da procrastinação, ou, ainda, pelo discurso redondo, inútil e politicamente correcto. Claques em regime de seita que vomitam, quase impunemente, chamas de apelo às mais torpes acções. Certos treinadores e homens de banco incendiários que tudo perdoam na sua casa e tudo criticam na casa dos outros. Árbitros impreparados, enviesados, atemorizados que adoram ser os protagonistas de qualquer jogatana. Auto-regulação entre os clubes em regime de pseudo auto-defesa, com a ilusão de míseras multas face à violência endémica, mas que nada punem e nada dissuadem ou previnem. Órgãos disciplinares que vêm satisfazendo eloquentemente a ideia de que justiça tardia já não é verdadeira justiça (como se compreende, por exemplo, que jogos de há um ano ou largos meses sejam tão tardiamente objecto de punições, por sua vez sempre recorríveis, até que tudo fique nas calendas?).
No meio de todos, os menos culpados são os jogadores.

4. O que é que, de facto, aconteceu em Guimarães de verdadeiramente diferente em comparação com tantas e recorrentes atitudes ignomoniosas nos estádios (ou mesmo fora deles)? Apenas a saída determinada, respeitável, compreensível e corajosa do jogador Marega, depois dos insultos de que foi alvo. Não tivesse ele saído e tudo teria sido visto como normal, sem ser notícia e sem a repulsa lacrimejante de meio-mundo.
Marega foi inusitado sobretudo depois de ter marcado ao seu anterior clube (embora ele também tenha sido provocatório, pormenor que foi quase omitido). Situação infelizmente comum em momentos idênticos, em qualquer estádio, com tantos atletas que foram para um clube rival. Para não citar muitos casos que aconteceram, imagino o que diria a horda de adeptos mais inflamados e malcriados, se visse Hulk no Benfica a marcar um golo no Dragão, Òscar Cardozo no FC Porto a dar a vitória à sua nova equipa, na Luz, Bruno Fernandes no Benfica a facturar em Alvalade, Marega de volta ao Guimarães a marcar no Dragão, etc., etc.. E o que diriam jornais, televisões, comentadores, autoridades nestes casos hipotéticos, iguais a tantos outros? Eu respondo: nada. Quanto muito diriam que foi uma anormalidade dentro da normalidade.
Então o que é que houve em Guimarães que suscitou uma onda generalizada de repulsa? Eu respondo: o meio e a forma dos insultos, não a sua causa. E aqui sim, o meio constituiu uma ignóbil expressão racista que, infelizmente, já tem acontecido com outros jogadores e não deve, em caso algum, ser tolerada. E, repito, como tal, Marega fez bem em sair. Para simular macacos, já bastam aqueles (caucasianos) que até apreciam que assim lhes chamem.
Aliás, no jogo Vitória - Porto, uma parte significativa dos titulares e suplentes até era de origem africana. E não ignoremos que no nosso país muitos ídolos vieram das antigas colónias e são considerados, justamente, ícones da nossa história desportiva, encimados pelo rei Eusébio, o pantera negra (será que ainda posso dizer «pantera negra»?).

5. Diante de tantos problemas que se tendem a agravar, o que fazem o ministro e o secretário de Estado que andam sempre aos papéis, a disciplina federativa que finge que o é, ou quem, nos clubes, deveria dar o bom exemplo? Como é possível que se pactue com insultos e ofensas de todas a espécie e se dê corda a gabinetes comunicação de clubes que alimentam um mundo-cão de grosseira sem limites morais? E por que razão nada acontece - para além de umas multas de uns desprezíveis euros - com a exibição de lonas e tarjas de apelo à violência ou de insulto soez a autoridades e juízes, com cânticos a desejar mortes ou a caluniar um clube que nem sequer está a jogar, com jogadores que escolhem celebrar conquistas desportivas com ordinarices sobre clube rivais? O que será mais preciso para se criarem plenas condições para identificar e punir boçais que dão cabo do futebol e dos seus clubes? Que segurança podem ter pessoas de bem e de paz e adeptos que levam a família e filhos menores à festa do desporto?
E quantas vezes num só jogo se insultam jogadores e árbitros com todos os impropérios possíveis, começando pelo que mais fere a dignidade de cada qual (filho da...)? Será que aqui temos de nos conformar com um acórdão recente de um Tribunal da Relação, que consagrou, em modo de jurisprudência, o mundo do futebol como uma realidade à parte, que se pode resumir neste impensável raciocínio de que «um comportamento revelador de falta de educação e de baixeza moral e contra as regras de ética desportiva é de alguma forma tolerado nos bastidores da cena futebolística», ou seja, uma ilha onde tudo é permitido, mesmo o que é proibido?
Em suma: ódio de perdição com inacção de rendição. Até quando?"

Bagão Félix, in A Bola

Antevisão...

Derrota...

Corrutpos 31 - 22 Benfica
(18-11)

O resultado não é surpresa, talvez fosse expectável um marcador mais 'próximo' mas sem o Capdeville, acabou por ser 'normal'!!!

Um livre de 7 metros para o Benfica, em 60 minutos?! A sério?!

A calendarização e o horário deste jogo, não foi o melhor, porque no próximo Sábado temos jogo importante na Polónia. Não é decisivo, mas uma vitória, será um passo de gigante para a qualificação...