"Cada vez que Roberto Martínez tem uma 'epifania'... Portugal assusta-se. Vale que os jogadores são 'padeiras de Aljubarrota'. E no meio destas reflexões, as discussões em casa, do futebol ao counter-strike 2...
Se formos sinceros, todos preferimos a Padeira de Aljubarrota aos Velhos do Restelo. Por isso, tenho gostado da evolução do discurso na Seleção de futebol, do presidente da FPF, Pedro Proença, aos jogadores, passando naturalmente pelo selecionador Roberto Martínez. Discurso que mudou um pouco – dirão que apenas nuances, mas a diferença está tanta vez no detalhe - após a vitória na Liga das Nações e que passa por assumir de forma mais clara o objetivo de lutar pelo título mundial em 2026.
Fernando Santos que me perdoe – e ele sabe que, por razões pessoais, gosto muito dele - mas sempre embirrei com o «somos candidatos, mas não favoritos». Expressão adotada por outros e que se tornou numa espécie de discurso filosófico que poderíamos traduzir num mais popular «com um pé à frente e outro atrás, não vá a coisa dar para o torto». Um assumir sem se chegar mesmo à frente, uma espécie de seguro para eventuais danos.
Temos de deixar de ter medo das expressões. Não é arrogância assumir-se que a Seleção quer ser campeã do Mundo e acreditar ter qualidade para isso. É saudável, é lógico, é motivador, é até realista. Depois se verá se conseguiu ou não, mas se o não conseguir porque outros foram melhores a ambição prévia nunca se pode jogar contra o ambicioso. Mais depressa o medo do que a ousadia é uma arma de arremesso. Só os Velhos do Restelo ou os especialistas de sofá revelam a desfaçatez de cobrar a ambição demonstrada antes de uma missão que não foi atingida.
No Século XIX, José de Alencar, considerado um dos maiores expoentes do romantismo no Brasil, escreveu que «o sucesso nasce do querer, da determinação e da persistência em se chegar a um objetivo». «Mesmo não atingindo o alvo, quem busca e vence obstáculos, no mínimo fará coisas admiráveis». Não peço mais desta seleção. Mesmo que não chegue ao topo do Mundo vá fazendo coisas admiráveis.
Nesta seleção, a ambição soa legítima quando nasce da confiança tranquila de quem reconhece o próprio valor. Tão simples quanto isso, não há ponta de vaidade nem necessidade de se provar o que todos já sabemos. Que temos enormes jogadores, que temos espírito de seleção, que temos equipa desde que a deixem ser ela própria. E eis que faço a ponte para a segunda linha de reflexão.
Se formos sinceros, todos preferimos a simplicidade à complexidade. Preferimos o que faz sentido e resulta à invenção numa espécie de jogo de xadrez onde as peças se movem fora de sítio e de forma errática. Na Hungria, uma vez mais Martínez teve uma epifania e uma vez mais as coisas iamcorrendo mal. Às vezes parece até um treinador que está aborrecido: parece tudo tão fácil que decide… complicar.
Roberto Martínez, como qualquer outro treinador, tem de saber que é preciso ser-se muito assertivo quando se desafiam duas lógicas do futebol (como da vida, diga-se): cada peça rende mais na sua posição natural; é o mais fraco e não o (muito) mais forte quem tem de mudar a identidade, se for preciso, para tentar surpreender. Os 32 jogos que leva já como selecionador ajudam a provar que foi mais nas certezas das ideias bem sucedidas do que nas experiências colocadas a teste que Portugal esteve melhor.
A minha confiança num histórico Mundial de 2026 - dez anos depois do Europeu de 2016 - reside cem por cento dos jogadores. Somos uma Seleção tão boa que nos demos ao luxo de consquistar a Liga das Nações, batendo Alemanha e Espanha, e passar imenso tempo a debater algumas opções de Martínez (como João Neves a lateral direito) e o nível exibicional que poderia ter sido melhor… Incrível ao que chegámos: das vitórias morais do passado às vitórias dissecadas à lupa com motivos sempre para criticar algo... Somos, de facto, difíceis de saciar. E ainda bem. Fossem os portugueses tão exigentes com os seus políticos como são com os presidentes, treinadores e jogadores dos seus clubes e seleção.
Acreditem no que vos diz quem já andou mundo e viu de perto muita coisa: Portugal tem, em termos humanos, de comprometimento dos jogadores, sentido de família e orgulho em vestir as cores nacionais, muito provavelmente a melhor seleção do Mundo. E é esse espírito que permite superar uma ou outra epifania de Roberto Martínez. Que permite erguer a pá da Padeira de Aljubarrota. Assim o selecionador, de quem até gosto em 90 por cento das vezes - fosse sempre um Nuno Álvares Pereira, o primeiro grande treinador português.
PS – Impressionante o carisma de Cristiano Ronaldo. E não é por não ser algo de novo que vou deixar de me impressionar com o impacto que tem em todo o mundo. Ronaldo tem o dom de tornar ordinário o extraordinário, nós temos a obrigação de não perder a noção das diferenças entre uma e outra realidade. Da criança arménia à estrela húngara Szoboszlai, que anteontem cumpriu o sonho de menino de defrontar CR7, mais exemplos de carisma incomparável. É o maior da história – deixo a classificação de melhor à subjetividade de cada um. Mas porque a humildade também lhe faz bem, não é unânime, a começar nos portugueses. Para vos dar um exemplo, para o meu filho o Cristiano Ronaldo não se compara ao francês Dan ‘apEX’ Madesclaire, 32 anos, jogador profissional de Counter-Strike 2, líder da equipa Vitality. Diz que é carismático, por vezes insolente, que ferve muito. Acha-lhe muita graça. Eu defendo Cristiano Ronaldo e, do mal o menos, temos conversas giras... Até já tive de aprender o que é isso do Counter-Strike 2. O que um pai faz por um filho..."

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