"Nenhuma seleção do mundo, nem o Brasil a viver tristes dias, tem mais soluções de talento que a portuguesa, num rácio impressionante de qualidade e quantidade, fácil de perceber a partir das escolhes para final com a Espanha. A um onze de enorme qualidade era possível acrescentar, a qualquer momento, Gonçalo Ramos, João Félix, Rafael Leão, Diogo Jota, Francisco Trincão, Pedro Gonçalves ou Rodrigo Mora, pensando só em opções ofensivas. E fora dos convocados ainda havia Geovany Quenda, Fábio Vieira, Bruma, Ricardo Horta ou Jota Silva. É de cortar a respiração. Mas o que aumenta as possibilidades também acrescenta às responsabilidades. E a vitória na Liga das Nações, concretamente o modo como se chegou a ela, não deixa dúvidas: por via das alternativas disponíveis, Portugal tem hipóteses de ser feliz contra qualquer seleção do mundo, e mesmo um jogo que pareça correr mal pode sempre acabar bem.
Dito o óbvio, que é também o que mais conforta para o futuro, reconheçamos que é possível jogar melhor, bastante melhor. Uma análise mais fina permite perceber que o processo coletivo não entusiasma, que a organização defensiva revela deficiências críticas e que a criatividade com bola vive na estrita dependência da (reforço, muita) qualidade individual. Talvez não se pudesse pedir mais a um onze que nunca testado (em jogo) e decerto pouco ensaiado (em treino), mas a pergunta que apetece fazer está mesmo aí: o que poderia render esta seleção com um onze minimamente repetido e rotinado? E já era tempo.
Além da constatação genérica anterior, não parece grande ideia continuar a desaproveitar, a meio-campo, a ligação Vitinha-João Neves, que impressionantemente varreu a Europa, ou agrupar tanta gente de talento nessa zona do campo, capaz do melhor com bola (os dois Neves, Vitinha, Bernardo e Bruno), para depois depender ofensivamente das correrias solitárias de Pedro Neto ou Rafael Leão. As diferenças de linguagem entre o meio-campo e o ataque têm de ser corrigidas, até para que as prematuras perdas de bola não impeçam o contributo pontualmente decisivo de jogadores como Trincão, Conceição ou Félix, fortíssimos na definição perto da baliza mas que nunca serão de acelerações longas, de arrastar a equipa com eles.
Também por isto, porque a equipa vive ofensivamente de rasgos individuais e do aproveitamento de espaços em aceleração, Nuno Mendes foi o atacante mais decisivo da seleção. O resto é a imensa qualidade do melhor lateral esquerdo do mundo e a caminho de ser um dos melhores da história. Com um pouco menos de obsessão com Ronaldo, já nos teríamos dado conta há umas semanas de que há dois potenciais bolas de ouro na equipa das quinas: Nuno Mendes e Vitinha. Foram tímidas e pontuais as vozes que os elevaram, ao mesmo tempo que Espanha avançava diariamente na promoção da justa candidatura de Yamal. Este é bem capaz de ser já o melhor futebolista do mundo, acontece é que Nuno Mendes e Vitinha ganharam mesmo tudo o que era possível este ano. E o prodígio espanhol não.
Quanto a Roberto Martínez, percebeu-se o incómodo da Federação após ter deixado perceber que tinha desenhada a sucessão. A partir desta conquista, Pedro Proença não tem alternativa e vai chegar ao Mundial agarrado a Martínez, mesmo se ambos sabem que a relação é de conveniência. Ou seja, o ponto de partida não foi bom mas o porto de chegada obriga-os a unir esforços. E o final feliz é possível. Lá está, com o talento disponível e mesmo quando parece correr mal pode sempre acabar bem."

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