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sexta-feira, 19 de setembro de 2025

Sem tempo a perder: a inevitável saída de Bruno Lage


"A saída de Bruno Lage do comando técnico do Benfica não apanhou ninguém de surpresa. Há muito que a relação com os adeptos tinha sido quebrada, era uma relação já muito desgastada e sem vínculo. Uma pré-época positiva, contratações que entusiasmaram a massa adepta e o importante apuramento para a fase de grupos da UEFA Champions League levaram a que muitas vozes da contestação se calassem. Mas bastaram umas exibições menos conseguidas, um empate e uma derrota para tudo voltar ao mesmo.
Na saída de Roger Schmidt, no meu artigo Uma nova era pós Roger Schmidt, fiz esta referência ao carisma (ou escassez do mesmo) de Bruno Lage e à sua relação (ou ausência dela) com a massa adepta. Mais tarde, em dezembro, expliquei a razão pela qual, na minha opinião, Bruno Lage não teria perfil para treinar neste momento e circunstâncias a equipa do Benfica, uma afirmação polémica, pois os resultados até aí ainda eram favoráveis ao treinador. Mas pouco tempo depois a derrota com o Casa Pia levantou a contestação e levou ao célebre episódio da garagem. A partir desse momento a situação sempre pareceu instável. Chegou a pensar-se na saída após o fim da época, mas não aconteceu. Rui Costa, como presidente, validou a confiança no treinador e investiu no plantel.
Vou tentar sintetizar e explicar este percurso de desgaste na relação em três teorias clássicas da psicologia, pois seguiu um padrão bem conhecido na psicologia das organizações e das equipas desportivas. Primeiramente, não nos podemos esquecer que esta não era uma relação sem história, Bruno Lage já havia sido campeão pelo Benfica, mas saiu do clube sob contestação da massa adepta. A sua chegada não significou um virar de página, mas sim um regresso ao passado. E, como tal, o nível de tolerância à falha estava inequivocamente mais baixo.
Adicionalmente, os adeptos têm sempre expectativas muito altas e, como nos explica a teoria da expectância, quando o desempenho de uma liderança é visto como um elemento antagónico às expectativas geradas, instala-se a frustração e, com ela, a erosão da confiança e consequentemente da relação (algo que já tinha sido quebrado no passado e, como tal, era demasiado frágil num momento em que se exigia uma mudança). Foi precisamente isso que se viu na época passada, exibições sem chama e uma crescente contestação.
Ainda que Rui Costa tenha optado por manter Bruno Lage, essa decisão foi recebida com cepticismo. O afastamento emocional dos adeptos já estava em curso e apenas foi momentaneamente suspenso. O início da nova temporada trouxe alento. A pré-época correu bem, os reforços entusiasmaram e o apuramento para a Liga dos Campeões devolveu algum otimismo. Mas essa calma foi apenas aparente. À luz da teoria da dissonância cognitiva os adeptos entraram num estado de reconciliação forçada entre aquilo que sentiam (desconfiança em relação ao treinador) e aquilo que queriam sentir (esperança e crença no sucesso da equipa). Assim se instalou uma aceitação silenciosa, frágil e meramente circunstancial. A reviravolta sofrida na Luz não foi apenas um episódio infeliz. Foi o catalisador de uma rejeição há muito latente. Com base na teoria do contágio emocional percebemos como, num contexto de elevada carga simbólica como é o futebol, a insatisfação se dissemina rapidamente.
Os adeptos atingiram o seu limite? A tolerância esgotou-se? É verdade que já vimos contestações maiores e sem resposta. Parece que o que se esgotou foi a crença de Rui Costa. Deixou de acreditar na capacidade do treinador de repente ou deixou de acreditar na sua reeleição se mantivesse o treinador? Foi uma decisão desportiva ou acima de tudo política? Se não existissem eleições tão próximas esta seria também a decisão? Rui Costa afirmou que o próximo treinador terá de ter um perfil ganhador. Bruno Lage, afinal, não o tinha?"

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