"A primeira final da Taça de Portugal (com esta designação) só em 1953 pôs frente a frente Benfica - FC Porto. A exibição dos encarnados foi perfeita como nos filmes: 5-0. Podiam ter sido muitos, muitos mais.
Olhem que foi preciso esperar até 1953 para termos uma final da Taça de Portugal entre Benfica e FC Porto.
Deixei de fora os Campeonatos de Portugal, como está bem de ver. Resolvi falar de Taça de Portugal com esta designação atribuída por decisão federativa em 1939.
Domingo, 28 de Junho de 1953, portanto.
Os do Porto pareciam ter pressa. Entraram em campo cedo, ficaram por lá sozinhos a fazer umas corridinhas, ansiosamente à espera do árbitro e dos adversários.
Tinham jogadores de truz: o grande Barrigana, Virgílio, o Leão de Génova, Carlos Duarte, Monteiro da Costa.
Gente fina. Gente finíssima!
Ah! Mas o Benfica era melhor. Bastos e Moreira, Félix e Ângelo, Arsénio e Águas; Rosário e Rogério.
Havia uma vontade indómita do golo naquela gente que, perfilada na frente da tribuna, escutava, solene, o Hino Nacional.
Com o vento pelas costas, os encarnados enfunaram o peito como velas de galeão, à moda do Raposão d'A Relíquia mais a sua abominável Titi.
Tomam conta o jogo e do público.
Águias que esvoaçam ameaçadoras sobre a área de Barrigana.
José Águas remata ao poste. É um jogador de suprema elegância.
Rosário e Vieira falham lances isolados face ao guarda-redes portista. Barrigana é um figura que provoca receio.
A cada minuto que passa, a pressão do Benfica aumenta como um torno em redor da sua vítima. Toda a gente entusiasmante, inquieta, que se levanta e se senta segundo a segundo, nas bancadas, como se tivessem molas nos traseiros, percebeu já que o FC Porto acabará por soçobrar. Mas quando? Até onde pode ir aquela resistência quase sobre-humana?
A resposta
Pergunta a resposta: minuto 35.
Livre indirecto contra o FC Porto. Toque ligeiro de Ângelo para Arsénio, remate forte, colocado, imparável.
O Benfica abria o marcador, e nada poderia ser mais justo.
Os nortenhos sentiram o golpe como uma traição do Destino. O seu tremendo esforço defensivo fora quebrado, e o moral do conjunto estilhaçou-se.
Três minutos mais tarde, outro choque de enorme rudeza.
Movimento confuso junto da baliza de Barrigana, Arsénio atrapalha-se à primeira, mas emenda à segunda. 2-0.
Uma brisa gloriosa sopra por entre os homens das camisolas vermelhas, de um vermelho vivo.
A bola vai a meio-campo, mas os portistas não conseguem manter a sua posse nem cinco segundos. Não tarda e ela surge nos pés macios de Águas para mais um pontapé imparável: 3-0.
Três golos em quatro minutos!
O vencedor está encontrado ao intervalo.
Iremos assistir a uma degola de inocentes como se estivéssemos no Circo Máximo da antiga Roma? As colunas de pedra da tribuna de honra do Estádio Nacional serão testemunhas mudas disso.
O Benfica regressa ainda envolto numa ânsia goleadora impressionante. Águas é um furacão de movimento estonteantes. Todo o conjunto pratica um futebol bonito e espectacular não perdendo a oportunidade de rematar à baliza sempre que ela surge.
Barrigana é grande. É gigante! Faz o que pode e muito que parecia não poder.
O quarto golo é uma maravilha de 'association': passe largo de Rogério para Águas, centro deste para a cabeça de Rosário, que toca para Arsénio, que vem em corrida e dispara de primeira.
Os jogadores das camisolas azuis e brancas não sabem o que fazer com os braços: mantê-los caídos eu erguê-los para levar as mãos à cabeça?
O público vai abandonando o estádio numa presa de casas.
Falta um minuto para que o jogo termine.
Alguém, de saída, vira o pescoço para a derradeira espreitadela: vislumbra o passe profundo de Águas, a corrida de Arsénio e o toque simples para a baliza.
Os outros só saberão o resultado definitivo na manhã seguinte, quando comprarem o jornal."
Afonso de Melo, in O Benfica
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