"«Se tu não marcas em cima o adversário, podes comprometer o meio-campo». Esta é uma hipotética frase de muitas ditas no fim de um jogo ou na antevisão do mesmo. Nada de fora de comum, a não ser o tratamento por «tu», ainda que, na maioria dos casos, até nem se conheça o interlocutor ou se esteja a dirigir a um grupo de jornalistas.
Creio que este modo de relação através da segunda pessoa do singular, que se ouve amiúde no nosso futebol falado, terá sido inspirado pelo generalizado tratamento por «tu» na língua castelhana, em versão espanhola ou sul-americana, Jorge Jesus e não só fazem-no correntemente. Alguns jogadores e até dirigentes seguem-nos. Mas não se trata apenas do «tu». O mais curioso é colocar o outro no próprio jogo. «Se tu marcas o livre...», dirigindo-se ao interlocutor e transformando o jornalista num jogador. Por vezes, trata-se mesmo de uma senhora ou de alguém com idade para, há muito, estar aposentado de chutos e pontapés.
Por outro lado, está mais esbatida a moda - entre jogadores - de se referirem a eles próprios pelo nome em vez de simplesmente «eu». «O Jardel sempre marcou muitos golos», o que levava gente menos acostumada a esta linguagem a pensar que o Jardel que falava se referia a outro Jardel. Uma espécie de selfie em versão linguística que precedeu as selfies fotográficas.
Ao invés, fez escola na última e renhida temporada, tratar um clube rival (mormente, o Benfica) pela pronome demonstrativo «os outros», como se não tivesse sequer um nome. Sim, gramaticalmente demonstrativo, mas também demonstrativamente despeitado, como se balbuciar o nome queimasse a língua..."
Bagão Félix, in A Bola
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