"A história de uma felina escultura que, antagonicamente, vigiava o ninho da águia.
No primeiro dia de Setembro de 1954, entrou em funcionamento o Lar do Jogador. Aí passaram a residir os jogadores solteiros das categorias de honra do Clube e os casados, apenas no dias que antecediam os jogos, juntamente com treinador e massagistas.
Para morada dos seus atletas, o Sport Lisboa e Benfica escolheu 'uma casa portuguesa, em pleno coração do bairro que lhe deu o nome, no meio de uma vasta Quinta (Quinta da Nossa Senhora do Cabo, na Calçada do Tojal) onde a terra, as árvores, a água, tudo o que torna realmente «campo» (...) parece murmurar páginas imortais do Eça'.
Porém, antes dos jogadores do Benfica, um outro inquilino habitava a vivenda, criando alguma inquietação num dos nossos consócios: 'Tendo ido (...) lançar uma vista de olhos pelo exterior do solar dos nossos jogadores, verifiquei (...) que um motivo escultório representando um leão (lagarto, lagarto, lagarto!...) domina o pátio fronteiro do edifício. Agora, que vão ali instalar-se tantas «águias», seria um anacronismo, um verdadeiro atentado até, manter a felina escultura'. Na mesma carta, dirigida ao proprietário do imóvel, pede 'que o leãozinho seja retirado', mas não sem mais nem menos, 'aliás com carinho, peça por peça' e, numa deliciosa ironia, acrescenta: 'Bastaria olhar para a leonina efígie para ver que o seu semblante denota já um certo constrangimento por virtude de pressentir a próxima vizinhança... Repare V. Ex.ª no seu ar de pétrea neurastenia e não hesitará em dar-nos a grande satisfação de libertá-lo de tão incómoda sentinela'.
Semanas antes da inauguração, o jornal O Benfica fez uma visita à casa, guiada por Manuel Abril, presidente da Comissão Instaladora do Lar do Jogador. No fim da visita, apenas uma pergunta faltava:
'- E o leão? - Manuel sorri.
- Venham comigo - disse.
Descemos as escadas, entrámos na sala de jantar e saímos logo de seguida para o pequeno pátio. Abril, sorridente disse-nos:
- O leão «estava» ali.
Gargalhada geral. De facto, o leão já não se encontrava no seu lugar'.
No Museu Benfica - Cosme Damião, na área 17. Chão sagrado, encontra referência a esta e a outras instalações do Clube."
Mafalda Esturrenho, in O Benfica
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