"Não é nenhum mistério. A excelência de Portugal na criação de talento no futebol não se deve e nenhuma conjuntura astral, mas sim a trabalho, esforço, dedicação, competência, talento, financiamento e infraestruturas. Esta fórmula é válida para qualquer setor da sociedade. Alguns quase chegam lá. A maioria diz que tem azar...
Na Páscoa de 1975, no Torneio Internacional de Saint-Malo, cidade muralhada, banhada pelo canal da Mancha, na Bretanha, 400 quilómetros a norte de Paris, Portugal apresentou, pela primeira vez, uma Seleção Nacional de sub-17, correspondente à então categoria de Juvenis. Foi o culminar de uma luta ganha pelo selecionador David Sequerra, jornalista e visionário da formação, que tinha estado com José Maria Pedroto na conquista do Europeu de Juniores de 1961, e que na altura contou com um jovem treinador recentemente saído do INEF, Manuel Jesualdo Ferreira. Foi num campo coberto de neve, a 28 de março, que a primeira Seleção Nacional de sub-17 se estreou com uma derrota (0-1) perante um selecionado do Centro-Oeste (que viria a vencer o Torneio, onde estavam também as seleções da Françae dos Países Baixos), com um golo sofrido no último minuto. Mas o resultado é o que menos importa, relevante mesmo foi o salto dado com a criação de uma nova categoria de elite para um escalão etário que nunca tinha ultrapassado as fronteiras lusas.
Para fechar este capítulo de Saint-Malo, cumpre-me informar que fui o guarda-redes da equipa que defrontou o Centro-Oeste, falhando os três jogos que se seguiram (um abraço ao Jorge Madureira, que me substituiu) devido a uma fratura numa costela. Derradeiro pormenor: em pleno PREC, a delegação portuguesa liderada pelo vice-presidente federativo Abreu Rocha, e pelo secretário-geral da FPF, César Grácio, despediu-se de Saint-Malo entoando, após o jantar do último dia, ‘Grândola, Vila Morena’.
Meio século depois, a Seleção Nacional de sub-17 levantou, no Catar, a Taça de Campeão do Mundo, que se junta a muitas outras (só falta o Europeu sub-21 e o Mundial senior) na Cidade do Futebol. E se é verdade que tudo começou em Saint-Malo em 1975, o mais importante foi o facto de, daí em diante, nunca mais se ter descurado a formação, primeiro, a nível federativo, com a ida ao Mundial do Japão de sub-20 em 1979 (vitória da Argentina onde brilhava um certo Diego Armando Maradona), depois com a pequena revolução de José Augusto a que se seguiu um dos traballhos mais importantes da história do nosso futebol, levado a cabo por Carlos Queiroz, com o apoio de Nelo Vingada, que além de valer os títulos mundiais sub-20 de 1989 e 1991, mudou o paradigma e abriu portas a um futuro que chegaria através dos clubes e das apostas que fizeram nas Academias, a que a FPF correspondeu, complementando este esforço com condições de excelência para as representações nacionais, dos mais variados escalões.
O título de campeões do Mundo de sub-17, alcançado na última quinta-feira em Doha, além de nos encher de orgulho, traduz a capacidade de criação de talento, ímpar, de Portugal, e a inevitabilidade, até por uma questão de sobrevivência, do reforço na aposta no futebol jovem. A Taça que Rafael Quintas ergueu, no Catar, não foi obra do acaso, mas sim resultado de muito trabalho, esforço, dedicação, competência, talento, financiamento e infraestruturas. Esta fórmula de sucesso, que nos torna num caso de estudo, é válida para qualquer setor da sociedade. É aplicada em quantos?"

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