"Os dias de telefonemas para o Agora Escolha (cumprimentos à dona Vera Roquette) eram tecnologicamente mais fiáveis do que estes dias de VAR.
Talvez pela simplicidade do protocolo.
Passo A: reunião acalorada de amigos na sala de estar, entre um Capri-Sonne e um Bollycao mal amanhado; o bando mais bruto defende o BA, o Murdock e as aventuras dos Soldados da Fortuna; a quadrilha dos costumes mais brandos prefere o ‘5, 4, 3, 2, 1... ufa!’ do herói Macgyver.
Passo B: corrida até ao telefone preto da avó, discar o 02 711 09 08, escutar a simpática voz da telefonista e gritar ‘Bloco A’ ou ‘Bloco B’.
Passo C: sossegar 25 minutos, a ver a Ana dos Cabelos Ruivos, as Aventuras de Tom Sawyer ou o Dartacão e Os Três Moscãoteiros, até ao anúncio do resultado final.
Depois, eureka!
Dias simples, infalíveis. Nada falhava nessa era analógica. Um primor de entretenimento e eficácia.
Mais de 30 anos depois, cercados pelo digital, viciados nos nossos gadgets e na tecnologia de ponta, a modernidade falha-nos. Falha-nos em direto, com a certeza de que todo o mundo tem rápido acesso ao vexame. Parece o Truman Show, mas a criatura em forma de vítima tem o ar de árbitro ao telemóvel.
Vexame. Foi isso a que assistimos, domingo passado e em horário nobre, no Dragão. Não me atrevo a apontar o dedo a ninguém, sou mais engenheiro de obras feitas do que eletricista de tomadas de estádio, mas todo o espetáculo foi constrangedor.
Como é possível um campeonato de futebol, já com alguns anos de VAR, não tomar todas as providências e criar os planos A, B, C e D que se impõem para que nada falhe? Imperdoável. Uma afronta aos tantos milhões investidos e pagos nesta área profissional.
É um dos sintomas de competência: antecipar o problema e preveni-lo, no matter what.
A simplicidade eficaz do meu querido Agora Escolha contrasta com a tristeza destes dias, num manto de opacidade e falta de transparência municiadores de desconfiança e descrédito.
A origem do VAR é uma boa ideia, os homens que o operam e o definem parecem-me obsoletos. Aconteceu o que sabemos no Casa Pia-Sporting, replicado com menor mediatismo no Torreense-Oliveirense, e aconteceu este serão de abominações na casa do FC Porto.
Vejo estes jogos da Liga, principalmente os dos chamados grandes, e só me posso sentir enjoado pela atmosfera de pressão, de condoimento, de histeria na hora de um golo sofrido ou de uma decisão desfavorável das equipas de arbitragem.
Ninguém sabe lidar com o insucesso.
De tanto barulho, pouco se fala do jogo. Do arranque aflitivo do FC Porto, dos desequilíbrios do Benfica à esquerda, de um SC Braga com seríssimos ares de candidato, de um Sporting a recuperar a solidez do ano do título.
E há mais, nomes interessantíssimos a surgir. Cristo no Arouca, João Mendes no Vitória, Pedro Malheiro e Seba Pérez neste protótipo de Boavistão.
Respiremos fundo. Pensemos todos no que andamos a fazer ao jogo que amamos. Só me apetece ligar para o Agora Escolha e gritar o nome de outro campeonato qualquer."
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