"Há 60 anos, o Benfica promoveu um sarau desportivo que marcou a apresentação da sua ginástica desportiva. Mas mais do que isso. Foi uma demonstração de força social que deveria balizar todos os grandes clubes. Mil atletas presentes!
Gosto de passear pelas páginas de jornais antigos. Aprende-se uma visão diferente do mundo, mais completa, mais intemporal.
Nada como ter a noção do tempo que passa para perceber o que se vai passando e alicerçar ideias sobre o futuro.
Alongo-me. Explico já o propósito da prosa. Fui visitar, se me dão licença pela expressão, um sarau do Benfica. Há sessenta anos! Há sessenta anos já cumpridos: 25 de Maio de 1957.
Parque Eduardo VII. Pavilhão dos Desportos praticamente esgotado. Então comecei a ler: 'Não há dúvidas de que o Benfica afirmou ontem o seu mais sólido e valioso trabalho, algo que transcende a conquista de campeonatos e troféus, para se erguer num plano de alto interesse nacional, finalidade que devia primordialmente preocupar os clubes desportivos. Na verdade, para quem não possuí instalações convenientes, dividindo a actividade ginástica por diversos locais, alugando recintos aqui e acolá, proporcionar a prática de exercícios físicos a mais de mil indivíduos, crianças na sua maioria, mantendo em acção mais de vinte classes e dez professores diplomados, deixa a entender a obra gigantesca que a utilização de um bloco de quatro ou cinco ginásios - como está projectado - favorecerá'.
Um programa imenso. Ambicioso. À imagem de um clube de enormes horizontes.
Exibições consecutivas de ginástica desportiva.
Claro que, em momentos como estes, o fim desportivo é trocado pela necessidade pedagógica.
Por isso se fala estar para além de campeonatos e troféus.
E boa altura para sublinhar isto numa semana em que os benfiquistas comemoram campeonatos e troféus.
E a ginástica...
Porque um clube só é mais do que um clube quando se coloca ao serviço da sociedade.
Para que se perceba o que foi esse gigantesco sarau levado a cabo pelo Benfica, vamos ler mais um pouco: 'Os bailados regionais, eficientes acessório da prática científica da ginástica, mereceram nota alta: mais de uma vintena de raparigas, todas graciosas e bem compenetradas do seu papel, evolucionou com elegância e alegria em marcações difíceis mas muito bem feitas. O curso de iniciação desportiva teve ontem duas apresentações que, apesar de breves, deram ideia perfeita do acerto com que está a ser orientado. Dezenas de miúdos espalharam o seu irrequietismo verdadeiramente contagiante em demonstrações de atletismo (barreiras e saltos), voleibol, andebol de sete e basquetebol que entusiasmaram o público. Até os juízes eram crianças. Não há dúvida de que é uma obra de alto sentido pedagógico que muito honra os seus responsáveis: professores José Esteves, Jorge Salvador e Nunes da Costa'.
E prossiga-se, a caminho do fim: 'Chegou a altura de falarmos da ginástica desportiva do Benfica que pela primeira vez se apresentou em festivais do género. As perspectivas são muito animadoras, e tanto as exibições de movimentos livres como de paralelas agradaram de uma maneira geral. Queremos, porém, salientar um elemento dos seis ou sete que se exibiram: chama-se Mário de Aguiar e possui, na verdade, extraordinária, notável mesmo, capacidade, sobretudo em exercícios acrobáticos no solo, onde faz prodígios, como entrada de dois fliques-flaques para trás com mortal empranchado com meia pirueta. Por todos os motivos, não há dúvida de que o Benfica alcançou ontem êxito assinalável'.
Eis o Benfica no tempo dos títulos e, ao mesmo tempo, no caminho de uma obra social de importância ímpar. Passaram-se sessenta anos! Mas a ideia de universalidade não se perde para uma associação que pretende ter raízes profundas na sociedade.
Desporto também é isso. E cultura."
Afonso de Melo, in O Benfica
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