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quinta-feira, 23 de março de 2017

Ele está aí (aqui) para jogar à bola e não para ir à Escola

"Durante quase uma década de trabalho realizado num dos grandes clubes de referência no futebol do nosso País, e tendo acompanhado de perto o trabalho desenvolvido por outros colegas em outros clubes de referência, muitas foram as ocasiões onde a Escola era claramente negligenciada, face ao percurso desportivo dos jovens.
De facto, apesar de os clubes apostarem na criação de departamentos de psicólogos, sociólogos e assistentes sociais, para garantir a correta integração dos jovens em contexto escolar, a par da sua performance desportiva, no terreno, a aceitação destas directrizes nem sempre foi consensual – seja da parte de alguns treinadores ou até de alguns pais.
Felizmente, a compreensão do fenómeno desportivo e a evidência científica tem demonstrado que o desenvolvimento de determinado tipo de competências em contexto escolar – seja no que respeita à qualidade e diferenciação cognitiva dos jovens ou da sua qualidade em estabelecer adequadas relações em grupo de pares – pode potenciar o desenvolvimento do Atleta, aumentando decisivamente a sua possibilidade de alcançar patamares mais elevados de performance.
Casos como os do Bayer Leverkusen, que optou por respeitar um exame escolar de uma das suas estrelas mais promissoras (Kai Havertz), e que inundou os media na passada semana são, por esta mesma razão, cada vez mais frequentes ainda que, na minha opinião, ainda não suficientemente divulgados.
Por cá, e no que respeita ao futebol profissional, há já quem tenha licenciaturas de Direito, Gestão, Sociologia ou até Medicina terminadas ou em plano de finalização mas, sendo conteúdos da vida privada de cada um (e, curiosamente, se calhar até não muito bem aceites no meio, sejam por colegas ou treinadores, por "fugirem à regra"), acabam por não receber a atenção e reconhecimento merecidos.
Exemplos destes, necessitam ser promovidos, numa perspectiva de contaminarem ainda mais as gerações sucedâneas, contrariando a tendência de que "ou estuda ou joga à bola", até porque ilustram de forma clara como uma frequência académica bem sucedida pode até alavancar uma carreira desportiva de sucesso, na medida em que, inevitavelmente, muitos processos cognitivos determinantes a uma boa performance tornam-se mais fluídos por serem “exercitados” em dois contextos em simultâneo: Escola e Desporto.
Na realidade, se “treino a dobrar” capacidades como a tomada de decisão, de pensar em perspectiva e gerar soluções alternativas, de gerir eficazmente as minhas emoções em contextos potencialmente ansiogénicos (ex: exames), entre tantos outras competências comuns a estas duas áreas de performance, o que posso esperar?
1) Atletas que definem uma estratégia e arriscam, executando-a;
2) Atletas com maior capacidade de analisar em tempo real as dificuldades que o adversário coloca, gerando soluções alternativas ao plano inicial;
3) Atletas que, naquele momento especifico do jogo (uma grande penalidade), regulam eficazmente as suas emoções no sentido de marcar/defender;
4) Atletas que vêem as suas competências de liderança reforçadas;
Urge, neste sentido, dar visibilidade, com todas as ferramentas possíveis ao facto de que Escola e Desporto devem cooperar e não competir entre si (até porque se encontram, também, amplamente documentados os benefícios da participação desportiva, em termos de resultados académicos), uma vez que só assim os jovens, os clubes e, mais tardiamente, a sociedade em geral sairão beneficiados com adultos efectivamente mais capacitados para o desporto, para o trabalho (porque, a grande maioria, não terá oportunidade de seguir uma carreira profissional), enfim... para a vida."

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