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domingo, 12 de fevereiro de 2017

Regresso da Europa e de Carrillo

"«Não sei,na verdade, se alguns ficaram com dor de cotovelo pela exibição e, acima de tudo, pelo extraordinário momento do terceiro golo no Arouca»

1. No dia de São Valentim, dia dos Namorados, arrancaram os oitavos de final da Liga dos Campeões. Haverá, por cá, jantares a dois que só arrancam, de verdade, depois do apito final do Benfica - Borússia Dortmund. Dortmund que é indiscutivelmente uma das grandes marcas de futebol alemão e europeu e com uma história rica em que combina a resistência ao nazismo com um colapso financeiro que foi superado com a ajuda, entre outros, do seu rival Bayern de Munique que lhe emprestou em 2003 dois milhões de euros! Singularidades alemãs. Que nos recordam Clarence Darrow que na sua Defesa em Tribunal escreve que «o homem que luta por outro é melhor do que aquele que luta por si próprio». E nesse mesmo dia, à mesma hora, em Paris, o PSG confronta-se com o Barcelona e muitos amantes irão apenas cear, decerto à luz de velas, nas margens do Sena. Depois na quarta-feira será a vez de Real Madrid e Bayern receberam Nápoles e Arsenal. Nestas duas semanas, e em razão dos milionários direitos televisivos, haverá apenas dois jogos nos dias reservados à Liga dos Campeões. Por isso o Futebol Clube do Porto só jogará no Dragão face à Juventus na quarta-feira 22 de Fevereiro. Benfica e Futebol Clube do Porto são os resistentes do futebol português nas competições europeias. E são - como foram em épocas anteriores, incluíndo na Liga Europa - fundamentais para o nosso ranking na UEFA. Que está em risco no que concerne à presença directa, a partir de 2018, de duas equipas portuguesas na fase de grupos desta Liga milionária. O que sabemos é quem se apurar para os quartos-de-final recebe a bonita soma de 6,5 milhões de euros. E quem chegar às meias-finais mais 7,5 milhões. E quem vencer esta Liga recolhe mais 15,5 milhões. E quem perder a final recebe 11 milhões. É muito dinheiro. Sempre, a somar. E muita projecção. Muita mesma! E tal projecção chega a uma China... cheia de milhões. De euros e de dólares! De euros e de dólares! De muita vontade de futebol. Que é a modalidade do regime político e do singular sistema económico.

2. Disputam-se, hoje, alguns jogos da 21.ª jornada da nossa Liga. Na sexta-feira o Benfica ganhou, com mérito, segurança e empenho, a uma Arouca que vê partir o treinador, Lito Vidigal, que o levou e mostrou à Europa e vê chegar um dos grandes senhores do futebol português, Manuel Machado. E que nos faz relembrar, com carinho, outros senhores e senadores do nosso futebol como, entre outros, Henrique Calisto e Toni, Vítor Manuel e Manuel Cajuda, Jesualdo Ferreira e Manuel José, Carlos Queiroz e Artur Jorge. Faltam, assim, treze jornadas para o final desta Liga. Que se antecipa como renhida e sujeita a múltiplas disputas e pressões. Fora e dentro dos relvados. O Benfica terá seis jogos na Luz e sete fora do seu bonito e entusiasmante estádio. E se recebe o Futebol Clube do Porto sabe que vai a Braga e a Alvalade, ao Feirense e ao Boavista e, também, ao Moreirense. Que hoje recebe o Sporting e que será o adversário do Futebol Clube do Porto na última jornada. Onde o Benfica jogará no Bessa e o Sporting, em Alvalade frente ao Chaves. Faltam trinta e nove pontos. Faltam muitos pontos. Por isso cada jogo é, de verdade, uma final. E haverá jornadas, como esta, em que o Benfica joga à sexta e outras, como a próxima, em que o Futebol Clube do Porto, também em razão do difícil confronto europeu, jogará frente a um Tondela a precisar de pontos na sexta-feira. A Europa a ditar o calendário. No futebol mas também nas finanças e na economia. Mas no futebol há sempre saídas. Das suas competições. Nas complexas relações europeias, depois da saída britânica, há novas tensões no ar. E fortes tensões. Mais uma vez tendo a Grécia como epicentro... Talvez seja interessante escutar, nestas matérias, também as vozes de Paulo Bento ou Sá Pinto... Ou, então, a memória intensa e imensa de Fernando Santos. Como nos legou Jorge Luís Borges «a memória é o essencial, visto que a literatura está feita de sonhos e os sonhos fazem-se combinando recordações«!

3. André Carrillo fez, na passada sexta-feira, e na minha modesta opinião, o seu melhor jogo com a camisola do Benfica. Mostrou as suas imensas capacidades e evidenciou o seu entrosamento com a equipa, em especial nos momentos defensivos. Não foi ele e mais dez. Foi ele no onze. Com, entre outos, Zivkovic e Eliseu, Pizzi e Luisão, Júlio César e Fejsa. E também Jonas e Mitroglou. Os adeptos, todos aqueles que estiveram na Luz, consideraram-no, legitimamente, o melhor em campo. Não sei, de verdade, de alguns ficaram com dor de cotovelo pela exibição e, acima de tudo, pelo extraordinário momento do terceiro golo. Que culmina com um instante de arte individual após momentos de um virtuoso colectivismo. Vimos, sim, Carrillo mostrar na Luz tudo aquilo que já evidenciara em outros relvados de Portugal, da Europa, do Peru e da América do Sul. Acredito que Carrillo vai ser muito útil ao Benfica e a Rui Vitória. Como disse Lao Tse «nada é impossível a quem pratica a contemplação. Como ela, tornando-nos os senhores do mundo».

4. A tragédia no Uíge, no arranque da liga angolana, - conhecida como Girabola - é mais um momento de luto em razão do futebol. 17 pessoas morreram quando tentavam entrar no Estádio. Acredito que as autoridades angolanas, como em outras situações e em outros países, entenderam que era mais seguro não interromper o jogo. Mas fica sempre a dor de tanta morte associada a um jogo de futebol. Já que cada um - ou uma - que morreu, decerto com uma dor imensa, é um ser que não se repete. Tendo presente, nesta ante-véspera do Dia de São Valentim que como escreveu Guerra Junqueiro «a vida é um calvário. Sobe-se ao amor pela dor, à redenção pelo sofrimento». Verdade da vida. De todos os dias. Dos nossos dias."

Fernando Seara, in A Bola

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