"O assunto é demasiado sério e preocupante para ser tratado com superficialidade, assente em breves comentários e notas à imprensa, que só produzem ainda mais dúvidas e incertezas.
Assistimos, todos, com estupefação, ao eventual envolvimento de um alto dirigente da Liga Portugal numa realidade inqualificável que sabíamos existir. As piores práticas associadas às supostas "academias de formação," onde o ser humano e os jovens em formação são tratados como mercadorias, representam o que de pior os agentes desportivos podem oferecer à sociedade, ao desporto e ao futebol.
Valores morais, ética e princípios são inexistentes nestas condutas e em quem pratica tais atos de gestão.
E termos a indicação, revelada na declaração do Presidente da Liga, que desconhecia completamente esta realidade associada a Mário Costa, presidente da AG da Liga Portugal, deve, no mínimo, preocupar-nos a todos.
As diligências, por parte de Mário Costa, anterior presidente da AG da Liga Portugal, com a Ministra Ana Catarina Mendes, que tutela o desporto, para solicitar formas de agilizar a legalização de atletas oriundos de outros Países, foi amplamente noticiado na capa do semanário "Expresso".
Não é minimamente verossímil que o Presidente da Liga não soubesse das atividades institucionais de Mário Costa, Presidente da AG, em representação da Liga Portugal, e menos ainda que não tivesse articulado com ele a reunião com a Ministra da Tutela do Desporto.
O que nos leva para as primeiras conclusões:
- O Presidente da Liga Portugal fica fragilizado na sua capacidade de representar o setor do futebol profissional.
- A Liga Portugal perde capacidade negocial para todos os processos de profissionalização onde está envolvida.
- A Liga Portugal fica afastada da maior parte dos órgãos de decisão que podem conduzir o futebol profissional para novos patamares.
Os vendedores de ilusões
A Federação Portuguesa de Futebol tem aqui também uma responsabilidade acrescida, já que é da sua responsabilidade a formação do futebol e o licenciamento das academias de formação.
Mas as ilações que já se podem retirar da informação que vai sendo tornada pública é perturbadora:
- Existia uma orientação clara para se dar prioridade à criação de uma ilusão, com recurso a patrocínios oficiais e aproveitamento da imagem do principal patrocinador da Liga 2, a ser utilizada indevidamente em registos audiovisuais, difundidos nas redes sociais e em plataformas digitais, que confirmam a orientação clara destas práticas inqualificáveis.
Não estamos perante uma mera situação conjuntural. Estamos perante uma prática instalada, há anos, gerida por um dos principais elementos dos órgãos sociais da Liga Portugal e perfeitamente integrada na sua estrutura.
O trabalho da Liga Portugal nos últimos anos tem seguramente muitos aspetos positivos que não podem ser ignorados. Mas também tem estado assente numa estratégia onde nos vendem ilusões, e onde infelizmente alguns dos seus elementos são extremamente negativos para o futebol em Portugal.
O futebol profissional em Portugal apresenta problemas estruturais crónicos, e aí residem os principais motivos de preocupação:
- Clubes sem Estádios homologados para a realização de competições;
- Clubes sem instalações para formação e treino adequadas;
- Baixíssima assistência aos jogos;
- Incapacidade de se criarem produtos audiovisuais atrativos e apelativos para as novas audiências;
- Arbitragens e ações disciplinares deficientes;
- Baixíssimo tempo útil de jogo que afasta espectadores e audiências.
Mas a principal ilação a retirar é que a estrutura atual da Liga também serve todo um conjunto de interesses instalados, alguns deles que representam o pior que o futebol tem em Portugal. "Vender" a ideia de que têm sido anos fantásticos - pese embora todo o empenho e trabalho que o seu presidente tem realizado - é procurar tapar o sol com a peneira.
Se algo de positivo se pode retirar de todo este caso, é efetivamente a necessidade de ser efetuada uma reflexão profunda do papel da Liga Portugal, da sua orgânica, dos seus órgãos de fiscalização e da sua estratégia de atuação.
Pior é a ilusão criada nos Clubes de anos fantásticos que se avizinham, com a regulamentação da centralização dos direitos televisivos. As sociedades vivem hoje de ciclos económicos imprevisíveis, os avanços e as evoluções tecnológicas na área do digital e do audiovisual estão a produzir alterações profundas, e a Liga Portugal e o Governo de Portugal trataram o tema da centralização com procedimentos e análises do século passado.
As ilusões dão sempre, regra geral, péssimos resultados. Não nos podemos iludir mais de que este caso relatado e tornado público é um mero caso isolado.
A reflexão necessária e a formação
Tendo abordado por inúmeras vezes o tema da formação com o Presidente da Liga, tive a oportunidade de lhe apresentar pessoalmente modelos a serem implementados em Portugal, que tanto sucesso tiveram em outros Países.
E tivemos a ocasião de realizar uma reunião conjunta com o anterior Secretário de Estado do Desporto para implementarmos modelos semelhantes em todos os Clubes de Futebol associados da Liga Portugal, com base num novo modelo de financiamento que poderia trazer para o Futebol profissional em Portugal um novo paradigma.
O Presidente da Federação Portuguesa de Futebol considera a demissão de Mário Costa um mínimo inaceitável, mas não assume também ele as responsabilidades que a Federação tem de ter para fiscalizar as ditas academias, ignorando completamente alertas que têm vindo a ser feitos insistentemente por diversas entidades.
Também tive a oportunidade de apresentar pessoalmente ao Presidente da Federação um modelo de Academia que pode ajudar a alterar o panorama da formação de futebol em Portugal, mas infelizmente a formação desportiva não está nas prioridades da Federação.
É tempo de ser feita uma profunda reflexão, onde o papel das instituições públicas e dos organismos que tutelam o desporto, a começar pela Ministra Ana Catarina Mendes, tenham a humildade suficiente de reconhecer que praticamente todas as orientações emanadas de diplomas legislativos dos últimos anos não servem para rigorosamente nada.
É preciso saber separar o desporto amador do futebol profissional, dar a devida dimensão e importância a cada um dos setores onde o futebol, enquanto desporto de massas, se movimenta, e criar mecanismos de acompanhamento para podermos tornar transparente as decisões tomadas."
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