"Uma amiga minha foi, há alguns anos, operada a uma vulgar catarata. Cegou. Na origem? A ganância do médico, que a colocou numa extensa lista de pacientes a operar num só dia e deixou a intervenção para perto das duas da manhã.
Que disseram outros especialistas consultados? Que aconteceu. Que todas as operações têm riscos. Claro que têm, sabem-no até os que não estudaram medicina,mas, convenhamos, não é difícil prever que numa operação às duas da manhã, depois de dezenas de outras iguais, o risco é muito maior.
Nem um médico, já se percebeu, foi capaz de apontar o dedo ao colega. Isto é o corporativismo, uma das piores doenças da sociedade, das que mais injustiças promovem. É o velho código de protecção entre iguais. Se eu não apontar o dedo aos teus erros, tu não apontas aos meus.
O corporativismo tem, no fundo, um quanto de egoísmo - a defesa cega de um culpado que nos é igual só pode ser entendida como um desejo de em circunstância igual não nos culparem também a nós - e um outro de corrupção (moral, por vezes financeira, mas também social).
Que tem isto a ver com desporto? Simples: peguemos na condenação de Lance Armstrong pela União Ciclista Internacional no âmbito de um processo de doping. Ora, o ex-herói mundial, que afinal era não só um atleta dopado, mas também um distribuidor de droga pelo pelotão, tem sido defendido pelos seus iguais como se não passasse de uma vitima do sistema.
O que ouvimos dizer ciclistas e ex-ciclistas é que os mecanismos de controlo anti-doping nunca apanharam o prevaricador. Claro que sim - vergonha incrível, derrota humilhante da lei. Mas Lance Armstrong não tem desculpa, amigos - nem ele próprio ousou defender-se do relatório de mais de mil páginas que o incriminava. E o corporativismo, em última instância, a todos torna cúmplices morais!"
Nuno Perestrelo, in A Bola
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