"Um clube sem memória não tem futuro. A maior parte dos lugares do camarote presidencial da Luz foi ontem ocupada por antigos campeões.
O Benfica sagrou-se ontem, pela 33.ª vez, campeão nacional. Este título permitirá, nos próximos dias, inúmeras abordagens, dos méritos de Jesus à resiliência de Vieira, da nova forma de jogar da equipa da Luz à paz que finalmente a nação encarnada encontrou, depois do maio-negro do ano passado.
Irei, porém, noutro sentido, pegando em algo que para muitos pode parecer um detalhe menor mas que para mim faz a diferença. Ontem, muitos dariam este mundo e o outro para serem convidados para o camarote presidencial da Luz. Sabendo-se que o Benfica se movimenta em áreas diversas, da economia às finanças, da diplomacia ao negócio do futebol puro e duro, não seria difícil à presidência encarnada encontrar pessoas a quem endereçar convites que poderiam vir a revelar-se mais valias para futuros relacionamentos. No entanto, a verdade é que o Benfica, através de Luís Filipe Vieira, decidiu convidar para o camarote presidencial aqueles que, em algum momento, contribuíram para os 33 campeonatos nacionais ganhos pelo clube da Luz.
O lema para esta forma de estar do Benfica é simples: «Um clube sem memória não pode ter futuro.»
Nos tempos que correm, este tipo de consideração não está na moda. Mas é desta riqueza que nascem condições para transmitir, entre gerações, valores essenciais, no caso do Benfica, a mística.
Ontem, vários jogadores encarnados, campeões pela primeira vez, conquistaram o direito a fazer parte deste grupo. Ganharam o direito a conviver com José Bastos, Artur Santos, Ângelo Martins, Fernando Cruz, António Simões e José Augusto. A ouvir histórias contadas na primeira pessoa, sobre Eusébio ou Coluna. A aprender o Benfica pela memória do monstro da baliza que foi José Henrique, a respeitar, na saudade, Manuel Bento e admirar o percurso de Humberto Coelho.
Foram mais de sete dezenas os campeões que ontem tomaram assento no camarote presidencial da Luz. O que é, a meu ver, uma boa notícia para o Benfica. Porque, na verdade, um clube sem memória não tem futuro...
MARQUÊS POMBAL
O Marquês de Pombal, vestido à Benfica, foi testemunha privilegiada da festa do 33.º título nacional. Mas a época está longe de estar terminada. Na quinta-feira a Juventus visita a Luz na primeira-mão da meia-final da Liga Europa e mais tarde a final da Taça de Portugal. São muitas competições até ao final da temporada, cada uma a requerer concentração máxima dos jogadores do Benfica. Em 2005, depois de se sagrarem campeões, os encarnados entraram em modo de festa e desperdiçaram (com todo o respeito pelo Vitória de Setúbal) a possibilidade da dobradinha.
Desta vez, como será?
O Benfica de Vieira
Terceiro título nacional da era Vieira para um Benfica que em cada ano se tem apresentado com mais argumentos. Longe vão os dias em que Camacho treinava em Massamá e jogava no Estádio Nacional. Hoje, os encarnados são um dos clubes mais fortes da Europa e embora este mérito deva ser distribuído por vários protagonistas, a parte de leão (salvo seja) vai, com todo o mérito, para Luís Filipe Vieira. Tal como aconteceu com outros grandes presidentes do Benfica, Vieira tem uma ideia do clube e um projecto de acordo com essa ideia de grandeza. Por vezes erra, as mais das vezes acerta, mas caminha sabendo o que quer e para onde vai. Seja na estabilidade que impôs ao futebol, seja na revolução que promoveu no panorama audiovisual nacional.
JORGE JESUS
Podiam ser mais? Talvez. Mas em 5 anos, Jesus entregou ao Benfica dois campeonatos. E construiu uma equipa com uma boa ideia, depois de várias etapas menos conseguidas, com ideias não tão boas. No Benfica, sabendo-se que há negócios que não podem deixar de ser feitos, existe base que deve ser preservada.
LUISÃO
O capitão do Benfica sagrou-se tri-campeão nacional. Há muitos anos que não havia, na Luz, um jogador que somasse três campeonatos (é preciso recuar às décadas de oitenta e noventa do século passado). Luisão representa a estabilidade que foi devolvida ao Benfica. E a continuidade de que são feitos os ciclos vitoriosos.
(...)"
José Manuel Delgado, in A Bola
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