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quarta-feira, 22 de agosto de 2018

O que Mourinho foi perdendo e que (ainda) não soube recuperar

"Ainda a parolice que voltou com a Liga, e um ou outro ponto sobre as eleições do Sporting

Eu sou do tempo de ver uma equipa de José Mourinho jogar muito bem à bola. Lembro-me do seu FC Porto e das primeiras versões do seu Chelsea, sobretudo. A expressão ilustra, penso, que não se trata de um passado recente.
Ainda sou mais do tempo de ver o seu Inter ser uma equipa controladora, matreira, e perceber perfeitamente como iria enganar os adversários. Um jogar bem diferente, mas defensável e sólido e que também pode e deve ter adeptos, que culminou com uma conquista mágica para o clube: a Liga dos Campeões. Olha-se para o Inter de depois, porque o de imediatamente antes também beneficiou da falta de concorrência por via administrativa – o célebre Calciopoli, que diminuiu muito a Juventus e também o Milan –, e percebe-se a enormidade do feito.
Deve olhar-se igualmente para o Chelsea de 50 anos antes da sua chegada para perceber o impacto estrondoso que teve. Ou para o Real Madrid campeão perante uma das melhores equipas da história, o Barcelona no mais alto tom da sua expressão futebolística e artística.
Mourinho entrou no futebol como um revolucionário. Os seus treinos eram inovadores, e a injecção de moral que dava praticamente a cada jogador tinha efeitos extraordinários. Cada um pensou, a certo ponto, que era o melhor do mundo no seu posto. Tenho dúvidas de que algum deles o negue.
Também é verdade que Mourinho nunca fugiu à polémica, nunca foi monocórdico nas salas de imprensa. Tinha a largura de ombros para aspirar a carregar todos os males da equipa às costas. Depois, sabia sempre o que dizer, como dizer e quando, e as suas palavras podiam inclinar um jogo a seu favor antes do pontapé de saída. Controlava na perfeição todos os aspectos do jogo, dentro e fora de campo. Era o melhor.
A meio de todo este caminho algo, talvez muito, se perdeu.
Já o escrevi antes, Mourinho tem de se reinventar. Não pode achar que lhe basta ser o que é para voltar a ganhar os títulos mais importantes, quando todo o mundo muda à sua volta. Talvez até nos vários aspectos do jogo.
Há muito dinheiro em Inglaterra. É uma realidade que nenhum treinador desdenha, nem sequer aquele que muito apregoam como um dos maiores da história. Pep Guardiola gastou nas suas três épocas de Manchester City mais de 600 milhões de euros. Aliás, dos crónicos candidatos, e excluo aqui o Arsenal dos últimos anos e o Tottenham, que até teve a proeza de não se reforçar neste verão, o Manchester United foi aquele que menos gastou, cerca de 430 milhões. Chelsea (531) e Liverpool (526) ultrapassaram a fasquia dos 500.
Há ainda alguma diferença, mas Mourinho está muito longe de não ter ovos para fazer omoletas. Contratou 10 jogadores, quase uma equipa inteira: um guarda-redes (Lee Grant), um lateral (Dalot), dois centrais (Lindelof e Bailly), três médios (Matic, Pogba e Fred) e três avançados (Lukaku e Mkhitaryan, que depois trocou com Alexis Sánchez).
O que mais impressiona é que o Manchester United não ficou mais perto de jogar um futebol, se não bonito, pelo menos sólido e consistente. Está melhor, mais estável, do que estava antes, nesses anos difíceis do pós-Ferguson, mas parece muito longe de uma candidatura séria ao título. Parece também um círculo vicioso: ao jogar tão pouco e ao ser tão pensado de trás para a frente será assim tão capaz de convencer os melhores jogadores no recrutamento? Fica a dúvida. A verdade é que Sarri, Guardiola e Klopp, por exemplo, conseguem fazer acreditar os futebolistas de que irão evoluir. Será que o treinador português ainda se consegue vender dessa forma? Repito: fica a dúvida.
Mourinho, ele mesmo, ganha já poucas batalhas verbais, e já são poucos os que o acham genial na gestão da comunicação para fora e de fora para dentro. Não terá também aqui um efeito contraproducente? Jesus chegou ao Benfica e disse que os jogadores iam jogar o dobro, e na altura já se achava que era o que acontecia com o Special One. Será que ainda consegue levar os atletas bem para lá dos seus limites?
Foi só a primeira derrota e vale o que vale. Não é por ter sido perante o Brighton e não frente a um dos outros multimilionários. Nem é por aí. É o que não muda semana após semana, ano após ano, que está contra ele. E a imagem imutável de que continua certo e que a culpa é sempre apenas dos outros. 

P.S. A Liga começou como a anterior acabou, e não é surpresa. Benfica e FC Porto – o Sporting tem ainda muito internamente com que se preocupar, e até a mudança de actores principais fez mudar o tom – arrancaram para mais um campeonato muito próprio, em que reina a falta de bom senso e a parolice. Uma perda de tempo, com objectivos claros: enfraquecer o rival seja de que maneira for. Nada disto é novo, apenas continua a ser muito mau. Ano após ano, o futebol português bate no fundo.

P.P.S As eleições do Sporting pertencem aos sócios, e serão estes que devem fazer a escolha. Em termos gerais, parecem-me demasiados candidatos, uma vez que isso não significa que na realidade existam sete ideias diferentes para o futuro. Com a intranquilidade que ainda há à volta do clube, com providências cautelares, conferências marcadas por cima de eventos em que deve a equipa de futebol ser a protagonista e queixas-crime, a maior parte da informação que estes querem ver passada perde-se pelo caminho. Existe, também, parece-me, alguma agressividade a mais em alguns candidatos, quando depois tudo o que se passou o discurso deveria ser bem positivo. Contudo, repito: o futuro deve ser decidido pelos sócios. A eles pertence."

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