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terça-feira, 25 de outubro de 2016

Do Portugal de Benguela para o Lisboa e Benfica

"Malta da Silva chegou em 1963. Foi obrigado a esperar. Teve paciência. O seu estilo altivo não se esquece. Foi campeão, campeão e campeão: sete vezes campeão!

Na voragem dos dias, há nomes que ficam no fundo das prateleiras da memória. É preciso falar deles, recordá-los, reescrevê-los.
Por isso vamos a Benguela, no ano de 1963. Cidade do Oeste de Angola, terra de rios e vales, a ver o mar. Havia um clube em Benguela: Sports Clube Portugal de Benguela, o Portugal de Benguela. Depois, claro!, mudou de nome. Passou a ser o Nacional de Benguela.
Foi no Portugal de Benguela que Malta da Silva (havia quem lhe chamasse Malta da Selva) começou a jogar futebol. E basquetebol também, porque era alto e vigoroso. Foi visto, observado, comparado. Veio para Lisboa e para o Benfica.

Não era qualquer um que jogava no Benfica no de 1963. Malta da Silva tinha 20 anos apenas. Esperou: que remédio!
E esperou muito. Quase sete anos até entrar na equipa titular que, na altura, era de Jimmy Hagan, o inglês que não falava: «No commentes!» Em Angola fora central, passava agora para a lateral direita. Eram bons, os laterais do Benfica dessa geração que ocupava o lugar dos campeões da Europa: havia Jacinto, havia Zeca, havia Artur, havia Adolfo... Malta da Silva lutou pelo seu lugar.

Amândio José Malta da Silva - tinha técnica, toque de bola requintado, passe medido. E não virava a cara ao esforço, ao combate, ao sacrifício.
Quem conheceu Hagan não pode ficar admirado por o inglês gostar dele. Era, como diria o Carlos da Maia, com divino descaramento, essencialmente prático.
Malta da Silva esteve 11 anos no Benfica e foi sete vezes campeão. Sete! Leram bem. Vezes de mais para que o deixemos cair no esquecimento, não é?
Por muito pouco não morreu
Mas estamos aqui a relembrá-lo ao correr do QWERT, nestas páginas.
Recordar o momento em que ia morrendo e vivei por um triz, naquele dia dramático que levou Luciano. Ou recordar aquele dia 3 de Janeiro de 1965, no Seixal, campo pelado, com José Henrique na baliza seixalense, em que se estreou de camisola encarnada de águia ao peito vestida. Cometeu um penalty malandro, um toque subtil com a mão na bola, mas o árbitro Reinaldo Silva viu mal, marcou livre directo fora da área. Safou-se Malta da Silva que o Benfica já se tinha safo, ganhando por 4-0, com golos de Eusébio(2), José Augusto e José Torres. O treinador era, então, Elek Schwarz, o homem que o lançou às feras.
O tempo passou. E Malta da Silva ganhou nome na história do seu clube. Recordemo-lo igualmente na despedida. Dia 30 de Maio de 1976: dia de festa. O Benfica era campeão e recebia o FC Porto. Perdeu: 2-3. Os portistas não quiseram alardear simpatia. E, no entanto, pareciam favas contadas. Toni fizera o 1-0, o nosso Toni-do-Benfica, agora septuagenário, quem diria? A seguir foi Vítor Baptista, o «Ponta de Lança da Infância Sem Ternura», como cantava o Vitorino: 2-0.
Tarde de calor na Luz. O sol brilhava sobre as camisolas vermelhas dos campeões. Malta da Silva dizia adeus, rumaria ao novo El Dourado dos Estados Unidos, jogaria ainda no San José Earthquakes e Rhode Island Oceaneers. Não foi titular, mas entrou para o lugar de Bastos Lopes. Já estava apenas 1-2, o FC Porto marcaria mais dois golos e venceria na Luz. Nada que estragasse a festa vermelha em flor. Quando muito uma ligeira sombra tapando o céu de Amândio José. Campeão. Foi campeão que saiu. Habituara-se a sê-lo. Nesse dia, no banco encarnado, também o treinador dizia adeus: Mário Wilson. O Velho Capitão correra o risco de ganhar o título. Não chegou para ficar. Afinal, era só um risco."

Afonso de Melo, in O Benfica

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