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terça-feira, 3 de maio de 2016

Certeza de bom campeão

"Foi magnífico o desempenho do Sporting no Estádio do Dragão, quer na atitude competitiva, quer na dimensão exibicional, e construiu triunfo inatacável, com natural reflexo na expressão do resultado final, aceite até pelo próprio José Peseiro, o qual apenas se confessou decepcionado pelo resultado. «Houve equilíbrio na posse, na qualidade do futebol, nas oportunidades criadas, portanto não fico desiludido com o que a equipa fez», palavras que só a ele comprometem, como se de repente o FC Porto tivesse resolvido medir as suas ambições pelo mesmos parâmetros dos clubes pequenos/médios, para os quais perder em casa diante de candidato ao título é desfecho normal...
No lado oposto, Jesus reagiu como sempre faz em tais circunstâncias, virado para dentro, tipo «o Sporting mostrou que está vivo», «faltam dois jogos e somos um sério candidato» e outras tiradas do género. Não desaproveitou, por isso, a oportunidade para sublinhar a excelente exibição dos seus jogadores e proclamar que, embora persistindo a dúvida sobre o nome do próximo campeão, já existe uma certeza em relação à melhor equipa do Campeonato: o Sporting.

Estou de acordo e nem há duas semanas escrevi, neste espaço semanal, que se o Sporting ganhar o Campeonato será normal, pois foi o clube que mais investiu em novos jogadores e recordei, até, que no mercado de Janeiro entraram no plantel Bruno César, Schelotto, Marvin Zeegelaar, Barcos, Coates e Rúben Semedo. Destes seis, quatro foram titulares no clássico do Dragão e outro foi suplente utilizado e autor do terceiro golo leonino.
Em matéria de soluções, também o referi, enquanto Rui Vitória organiza uma equipa base e disporá de mais quatro elementos de reserva para mudar sem prejudicar a produção do colectivo, Jorge Jesus pode dar-se ao luxo de formar duas equipas sem oscilações sensíveis na coesão e na eficácia, o que não significa trocar onze por outros onze, mas sim mexer simultaneamente em todos os sectores se assim o entender, sem que dessa revolução resultem prejuízos evidentes ao nível dos princípios e das dinâmicas. Jesus gosta de ter muitos e bons jogadores, como sucede, o que suscita várias questões. Uma delas, talvez a que mais salta à vista, prende-se com o facto de, apesar de plantel gordo e valoroso, o Sporting não depender de si próprio quanto ao título nacional. São os árbitros e as arbitragens. Uma desculpa cavernosa a que o presidente do FC Porto estranhamente se agarrou, desta vez com duplo sentido: queixar-se de Artur Soares Dias e ser simpático com quem acabara de o derrotar, no pressuposto de alvejar o Benfica com labareda branda, que nem atear o lume em assador de castanhas consegue: PC está diferente...

Por que motivo, sendo o Sporting lídimo intérprete do futebol espectáculo, porque o é, e possuindo o plantel mais recheado de talentos, falhou a entrada na Liga dos Campeões, que imenso jeito daria para ajudar a pagar o extravagante vencimento do treinador, rubricou presença soluçante na Liga Europa, foi eliminado da Taça de Taça de Portugal, teve uma passagem medíocre pela Taça da Liga e, como se sabe, permitiu que o objectivo supremo ficasse fora de controlo? A resposta não a detenho, mas há qualquer coisa no processo que não bate certo...
O comportamento de uma equipa e o seu lado emocional são o espelho da personalidade de quem a treina. Intitulou-se Jesus, antes do último clássico, um autodidacta que passa horas a criar ideias (no tempo do Benfica já tinha criado uma ciência...), o que se deve louvar, apesar da minha discordância em relação ao pouco ou nenhum relevo que o livro lhe merece. Ora, não sendo o futebol tão complicado como pretende impingir-nos, talvez fosse preferível, para ele e para o clube que representa, se criasse menos e reflectisse mais sobre o que já criou. Amadurecesse essas ideias e atribuísse mais valor ao humano, porque detrás de cada jogador há um homem, e é este que influencia aquele.
Rui Vitória utiliza o nós, sempre, por colocar o espírito solidário no topo das prioridades em nome da boa saúde da sua gente. Jorge Jesus utiliza o eu nos triunfos e as terceiras pessoas ele/eles quando é preciso justificar percalços. Diferentes perspectivas sobre a mesma actividade profissional, sendo certo que, tratando-se de dois bons treinadores, quem chegar ao fim em primeiro será um bom campeão. Para mim é, aliás, a única certeza.
O resto é barulho, e andam por aí tantos barulhentos..."

Fernando Guerra, in A Bola

4 comentários:

  1. este fernando guerra é verdadeiramente um cronista um narrador que muito me apresa ler a sua clareza verbal e o raciocinio fazem desse senhor no mundo do futebol luso uma excessao que muito me agrada e o jornal a bola secalhar nao merece eu penso sobretudo ao seu diretor vitor serpa

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