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sexta-feira, 7 de outubro de 2022

Este país não é para estádios de futebol

"O futebol assenta em emoções descontroladas, num irracionalismo capaz de transformar o mais pacato ser humano numa máquina de guerra, regressando à normalidade quando se liberta das frustrações pessoais nos recintos desportivos.

Os recentes acontecimentos ocorridos em estádios de futebol escondem razões mais profundas que não podem ser negligenciadas, sobretudo por quem tem a obrigação de atuar. Só assim será possível erradicar, de uma vez por todas, o que não pertence aos valores do desporto e aos princípios que o deveriam nortear.
Todos os episódios de violência são graves, absolutamente reprováveis, devendo ser censurados sem complacência e as medidas a adotar terão de respeitar o contexto histórico, social e cultural, assim como a essência do problema. Há décadas que se permite uma impunidade insustentável a quem pratica atos provocatórios e propositados, alimentando um clima de guerra sem limites. Quem tiver a memória mais afinada, recorda-se dos tristes episódios dos anos 80 e 90 do século passado e que, desde então, têm beneficiado de uma ausência sancionatória eficaz e do silêncio cúmplice de instituições que apenas se pronunciam quando os temas atingem certos níveis na opinião pública. É assim há demasiado tempo e, no limite, até podemos recuar ao filme O Leão da Estrela, de 1947. Nos nossos dias, a intolerância no desporto tem terreno fértil nas irresponsáveis redes sociais, na proliferação de programas televisivos que apelam ao ódio e numa certa comunicação social populista que cresce as suas audiências nas mentiras difundidas sem contraditório e rigor informativo, contribuindo para aumentar o problema social subjacente, a caminho de se tornar cultural.
Este estado das coisas não convém à esmagadora maioria dos clubes e das sociedades anónimas desportivas, sob pena de continuarem a perder patrocinadores e diminuir de forma drástica a assistência nos seus estádios, prejudicando uma indústria global incapaz de resolver a fragilidade de um dos seus principais alicerces.
As campanhas internacionais contra a violência, contra o racismo e xenofobia ou a favor da inclusão, são muito importantes e não podem deixar de acontecer, mas, como se vê pelo mundo, assim que o apito inicia o jogo, tudo é esquecido dentro e fora do campo. O futebol assenta em emoções descontroladas, num irracionalismo capaz de transformar o mais pacato ser humano numa máquina de guerra, regressando à normalidade quando se liberta das frustrações pessoais nos recintos desportivos. E o comportamento isolado ganha proporções ainda mais perigosas quando se encontra inserido num grupo, tornando-se letal e atingindo limites intransponíveis.
Para solucionar de uma forma progressiva a questão, não é necessário inventar, bastando aplicar os exemplos com sucesso na Europa, onde a situação inglesa é a mais paradigmática. A criação de tribunais especiais nos estádios com a aplicação imediata da justiça e cumprimento das sentenças, afastando os prevaricadores em definitivo desde que se implementem formas de identificação nas entradas, assim como a obrigatoriedade do aumento de seguranças entre as bancadas, foram determinantes. Quanto à punição das multidões, os jogos à porta fechada têm resultado.
Neste esforço nacional, para além da sensibilização com efeitos a longo prazo, precisamos de medidas imediatas e de responsáveis que não estejam preocupados com a sua vaidade ou com a possibilidade de perderem as suas cadeiras de poder, que não se precipitem sem conhecerem os factos e que tenham a coragem de decidir. É para isso que lá estão."

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