Últimas indefectivações

domingo, 3 de junho de 2018

Selecções de memórias

"Não sou o gajo mais patriota do mundo, confesso-vos já. Não sofro daquele amor exacerbado por Portugal que às vezes parece que deixa algumas pessoas tão cegas pelo país que conseguem dizer que a praia de Carcavelos é mais bonita do que as Bahamas, ou que se a padeira de Aljubarrota ainda fosse viva era capaz de acabar sozinha com o conflito israelo-palestiano. Adoro Portugal, não me interpretem mal, mas gosto de manter uma certa largura de horizontes.

Agora, também vos confesso que quando a Selecção joga num Europeu ou num Mundial eu sinto aquilo muito mais intensamente do que racionalmente queria. E é assim que algumas memórias de jogos me ficam guardadas quase com tanta força como a vez em que perdi a virgindade. Mas se calhar isto não é grande exemplo visto que foi tão rápido que me deu menos prazer que o golo do Éder.
Lembro-me bem de quando estávamos a perder 2-0 com a Inglaterra, logo aos 18 minutos de jogo no primeiro desafio do Euro2000. Mas depois Figo. Luís Figo. Não é que o homem me resolve arrancar logo ali de meio campo, vai sozinho, sem GPS nem nada, alça a perna e enfia um bujardão (termo técnico) ao ângulo da baliza do Seaman com tal estrondo que até lhe abanou o bigode. Não satisfeitos – claro, ainda perdíamos -, o Rui Costa pensou “vou fazer aqui uma maravilha de cruzamento ali para o baixote do João Pinto”, ao que este ao ver a bola a vir decidiu ir com a cabeça à altura dos tornozelos dos banais defesas ingleses, naquele mítico “salto à peixinho” e com uma chicotada encefálica mandou a bola para a extremidade da baliza oposta aonde estava. Que sonho de golo. E depois veio Nuno Gomes (não o mais famoso vendedor da Remax, mas sim o nosso avançado que provocava inveja capilar a muitas mulheres) que, com mais uma assistência do Maestro, mandou mais ginja cheia de força para o fundo da baliza inglesa e ganhámos aquilo. Foi épico.
Lembro-me bem desse jogo. Era puto e saí a correr das aulas para ir para casa e estava sozinho a vê-lo, mas foi como se estivesse com os portugueses todos. Foi provavelmente a minha primeira grande memória da Selecção. Depois vieram muitas mais. A mão do Abel Xavier que deixou o país quase tão paralisado como de cada vez que ele mudava de penteado, mas mantinha aquela tonalidade de loiro morto. O João Pinto a transformar-se em Super Guerreiro e a dar um soco no estômago do árbitro – correm rumores que lhe piorou muito o refluxo gástrico desde aí. O Euro 2004. Tudo no Euro2004. Os jogos, as bandeiras, as pessoas. Se o futebol é o ópio do povo, andava tudo tão drogado naquele mês que eu não sei como é que o país não acabou numa overdose gigante. Ah, sei, sei! Fomos ao grego antes que chegássemos a isso. Ou o grego foi a nós, para ser mais preciso.
E muitas mais por aí fora até ao dia de 2016 em que eu fui ao Twitter a meio da tarde e escrevi (juro que é verdade, podem ir confirmar): “E agora ganhávamos à França 1-0 com um golo do Eder?”. O resto é História.
Que este Mundial também seja histórico para nós. Pa’ cima deles, Portugal!"

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