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sábado, 14 de abril de 2018

Sabe quem é? Com sangue de chinês - Shéu Han

"Pai era pescador de Cantão e foi para Moçambique; No foguete que rebentou na mão, logo se viu o seu espírito

1. Nasceu em Inhassoro, na província de Inhambane, a 3 de Agosto de 1953. Aos 10 anos, estando a brincar com um foguete que não estoirara, o foguete rebentou-lhe na mão direita, causando-lhe uma deficiência. Não, não se deixou abalar ou abater pela partida do destino, de pronto começou a escrever com a mão esquerda - e, assim, deu sinal do que era o seu espírito, sempre seria.
2. Ao chegar à idade escolar, o pai mandou-o de Inhassoro para um colégio da Beira - e logo mostrou o jeito que tinha para o futebol. Não tardou a ir para o Sport Lisboa e Beira, primeira filial do Benfica em África - e, estando por lá, em missão, o tenente-coronel Manuel da Costa, andou, encantado, para Lisboa notícias do que garantia ser um «belo achado». E era.
3. Começou por ser extremo-direito - e uma vez contou: «Talvez pela ânsia que tinha do golo, de marcar golos, era muitas vezes apanhado em fora-de-jogo e foi por isso o que o treinador decidiu tirar-me de avançado, passar-me a médio». O encanto foi ainda maior, assim se lhe percebeu melhor a graça do jogo, a magia fina da bola na ponta das chuteiras, a esperteza do jogo na sempre na cabeça. De tal forma que levou a que, certa vez, Lajos Baroti afirmasse: «Pela sua eficácia serena em pezinhos de lã, bem merecia vestir a camisola com as insígnias da FIFA» - mas o destino, ingrato, não o levou a tanto, a uma selecção mundial (ou europeia).
4. Estando Francisco Calado de passagem por Moçambique - foi vê-lo jogar para perceber se havia ou não exagero no que dele se dizia. Mal lhe pôs os olhos em cima largou, a brincar, o desabafo: «Se calhar, o que o rapaz precisa é de comer, não é de jogar à bola» - e o campo saiu convencido: «Sim, é jogador para o Benfica...»
5. Tendo José Augusto, o José Augusto que ganhara duas Taças dos Campeões pelo Benfica, ido à Beira buscar documentação de que Nené precisava também aproveitou para o espiolhar - e contou: «Apesar de ainda ser júnior, já jogava nos seniores e mostrava pormenores daqueles que não enganam, nem hesitei em trazê-lo de imediato comigo...»
6. A mãe era de Inhambane, o pai não: era um pescador de Cantão que para Moçambique fora fazer negócio com exportação de peixe - e o que mais queria era que o filho continuasse a estudar. Ouvindo falar dos 100 contos que o Benfica tinha para a sua contratação, avisou: «Não vendo o meu filho?. A custo se convenceu, decisiva foi a promessa que ouviu: «Continuarei a estudar...»
7. Convencido o pai, outro problema se levantou, entretanto: o diferendo entre o Benfica e o Sport Lisboa e Beira. Por isso, em Lisboa, esteve vários meses sem poder jogar. Depois, tendo como treinador Mário Coluna, um dos seus ídolos, o outro era, claro, o Eusébio - o Benfica foi campeão de Lisboa graças a golo que marcou ao Sporting e também foi campeão nacional.
8. Cumpriu a promessa que fizera ao pai: acabou o curso da Mecânica e Desenho Industrial, continuou a espantar os colegas por ir sempre para estágio com os livros debaixo do braço - e de um instante para o outro ouviu rumor de que Jimmy Hagan pensara convocá-lo para o jogo do campeonato que o Benfica teria de fazer, no domingo seguinte, no Barreiro.
9. Perante o rumor de que a equipa principal poderia estar a abrir-se aos seus pés de veludo, fez mala no Lar onde vivia, levou-a escondida para evitar que pudesse ser alvo de paródia se fosse boato. Não foi - e contra o Barreirense entrou aos 80 minutos para o lugar de Toni - foi a 15 de Outubro de 1972 e foi o bastante para ser o seu primeiro de nove campeonatos conquistados no Benfica.
10. O adeus aos relvados, mas não ao Benfica (onde continua nas funções que se sabem, discreto como de costume...) foi a 20 de Maio de 1989 - na festa do Benfica (de Toni) campeão contra o Boavista. Era o seu capitão - e nunca escondeu: faltou-lhe a Taça dos Campeões, a Taça UEFA. Na final da Taça dos Campeões e na final da Taça UEFA esteve - e nessa Taça UEFA foi dele o golo do Benfica que não chegou para a ganhar aos belgas do Anderlecht."

António Simões, in A Bola

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