Últimas indefectivações

terça-feira, 2 de novembro de 2021

Falar mais em «Artures Josés Pereiras»


"O futebol em Portugal é um fenómeno que arrasta multidões desde o século XX e ainda hoje tem uma representatividade tanto nos media como na sociedade, daí ser pertinente estudá-lo de diversos modos. Todavia, a história do futebol enfrenta alguns problemas, sendo o maior de todos ter memória curta.
A atualidade tem uma predominância esmagadora face ao passado, que faz muitas vezes as pessoas e entidades ligarem menos à nossa rica história. Apesar de na hora do triunfo os clubes e dirigentes usarem quase sempre o chavão de quererem ficar na história. No início do século XX, numa altura em que futebol dava os seus primeiros passos, um homem de Belém, de seu nome Artur José Pereira começou a abrilhantar os relvados portugueses com o seu talento futebolístico. Simultaneamente repartia o seu tempo no futebol com o seu emprego enquanto empregado comercial, em virtude de o futebol ser exclusivamente amador (na teoria) e de ser necessário “por a comida na mesa”. Mas depois do horário laboral, Artur José Pereira e muitas centenas de jovens, vestiam a capa de super-heróis e entretinham os adeptos portugueses, cada vez mais apaixonados pela modalidade, com as suas fintas, golos e vitórias épicas. A única diferença de Artur para os outros atletas era que este ganhava mais títulos que os outros e despoletava de forma invulgar emoções fortes nos adeptos e imprensa desportiva portuguesa. Venceu tudo no S.L Benfica e após algumas quezílias internas teve a ousadia de ir jogar para o Sporting C.P desafiando as normas da época. Várias personalidades do mundo desportivo opinaram sobre esta “transferência” no futebol lisboeta e o próprio Benfica considerou que o Sporting teve "falta de camaradagem desportiva”, por ter aceitado no seu seio um jogador que anteriormente tinha sido expulso por mau comportamento. No meio da discussão sobre a moralidade no futebol e no auge da rivalidade entre o S.L Benfica e o Sporting C.P, Artur voltou a destacar-se dos demais com golos, assistências e grandes exibições, que conduziram os “leões” ao seu primeiro título regional, em 1915. Artur, enquanto disfrutava da redondinha e da sua banheira de água quente no balneário do Sporting, escancarou a porta no futebol nacional para as suas primeiras transferências e agudizou a rivalidade entre o Sporting C.P e S.L Benfica, que ainda hoje se consideram “eternos rivais”. Importa salientar que antes da chegada de Artur ao clube leonino, os principais rivais do S.L Benfica, em termos desportivos, eram o CIF e o grupo inglês do Carcavelos.
Enquanto Portugal decidia o seu papel na 1a Guerra Mundial, “leões” e “aguias” dividiam a seu belo prazer os campeonatos regionais lisboetas, no entanto tudo acabaria por mudar. Os anos 20 trouxeram uma lufada de ar fresco no mundo ocidental e por sua vez no futebol português com o aparecimento de clubes como o Casa Pia, C.F “Os Belenenses” e com o fortalecimento do F.C Porto, o primeiro campeão de Portugal.
Voltando um pouco atrás, em 1919, um grupo de jovens oriundos de Belém, um grande viveiro de futebolistas portugueses à época, juntou-se para fundar finalmente um clube que procurava dignificar a qualidade futebolística do seu bairro. Artur, que tudo tinha ganho nos principais clubes lisboetas, arregaçou as mangas e pôs à disposição do clube toda a sua alma e coração, de forma a honrar o bairro que o viu nascer. Logo no primeiro ano do clube, o Belenenses chegou à final do campeonato regional e com isso disse para o que vinha: acabar com a hegemonia dos grandes de lisboa.
Com o tempo as pernas deixaram de correr como dantes, todavia o seu particular espírito observador fez de Artur treinador. E, diga-se de passagem, que não foi um qualquer. Sem os fundos monetários dos rivais e com os seus métodos inovadores criou uma autêntica escola de campeões em Belém, vencendo mais no seu período que todos os seus rivais. Consigo como treinador, o Belenenses aproveitou os jovens oriundos do seu bairro para tornar as suas equipas competitivas e a nível tático distanciou-se um pouco do estilo do sul da Europa que dava primazia ao passe curto para atingir o objetivo do golo. As suas equipas eram geralmente pragmáticas na hora de atacar a baliza, através de poucos passes e jogadores velozes. Para além ter ganho títulos criou bases solidas para a equipa de Belém não deixar de disputar campeonatos e taças no futuro.
Em suma, se hoje um atleta desta modalidade pode ter tanto uma abrangência regional, como nacional ou até à escala planetária, como Cristiano Ronaldo, no início do século XX era bastante diferente. Primeiro porque o futebol não estava globalizado e os media não davam o suporte que hoje dão e segundo em virtude de o futebol nacional nas primeiras décadas ser mais cingido nos principais polos urbanos do país. No entanto é graças a pessoas como Artur José Pereira, ou Cândido de Oliveira que o nosso futebol chegou a onde chegou e por esse motivo, importa valorizar e estimar parte desta história para finalmente fazermos jus ao celebre cliché que os clubes tanto enfatizam antes de um jogo decisivo, isto é, “queremos ficar na história” e para conseguirmos entender cada vez melhor o maior e mais belo fenómeno social do nosso país."

Sem comentários:

Enviar um comentário

A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!