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terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Um Homem do seu tempo e muito para além dele

"José de Sousa Esteves
Faleceu em Novembro do ano passado um Benfiquista ilustre de que o nosso Jornal deu a notícia como se impunha. Era de elementar justiça. Mas também se disse nesse obituário que mais tarde Zé Esteves teria o destaque de que era merecedor. Ei-lo.

Durante mais de cinquenta anos foi um dos mais profundos conhecedores do impacto que o desporto tem nas sociedades bem com em cada individuo. E como a sua prática regrada, fundamentada e desenvolvida deve ser um tónico de formação individual de modo a uma integração plena de um ser único numa sociedade diversa.


Associado praticante
Nasceu em Lisboa, a 20 de Setembro de 1919, entrando para associado do Clube pela mão desse extraordinário Benfiquista, 'Águia de Ouro' em 1976, Justino Pinheiro Machado, com aprovação em 19 de Março de 1933, aos 23 anos enquanto estudante universitário. Professor de educação física no Liceu de Oeiras marcou gerações de alunos pelos seus métodos inovadores e exemplo íntegro do modo como a correcta utilização do corpo pode ser útil no dia a dia bem como forma de integração social pelos jogos em equipa que proporcionada onde, na generalidade, há uma divisão de tarefas solidárias para o bem comum, para o sucesso. Amante da prática desportiva viu-a sempre pelo lado lúdico ainda que exigente. Muito menos pelo apego exacerbado ao sucesso a todo o custo, mesmo que com batota.
No Benfica praticou Atletismo entre 1936/37 e 1939/40, tal como Râguebi durante três temporadas entre 1938/41. Dois desportos que considerava complementares em termos de formação, desde o mais individual e solitário até ao mais colectivo numa equipa de 15 em campo, 30 no total.

Curso de Iniciação Desportiva
Estudioso da sociedade humana desde os primórdios, integrando a forma desportiva como dínamo de desenvolvimento humano desde a sua origem foi no Benfica, nos anos 50 e 60, que encontrou as condições ideológicas (liberdade para criar e respeito pela inovação) e associativas (grandeza de um clube que lhe permitisse desenvolver as suas ideias) que fizeram dele uma referência profissional, cívica e Benfiquista para sempre.
Em 1954 com o beneplácito da Direcção presidida pelo inigualável Joaquim Ferreira Bogalho implementou no Clube um 'curso de Iniciação Desportiva' colocando em prática as suas ideias, pois o professor José Esteves abominava a teoria em detrimento da prática. Era a prática que tornava efectiva e justificava a teoria. A 'Iniciação Desportiva' foi um Maço importante num Clube que, apesar de eclético, tinha no Futebol ao mais alto nível a sua razão de ser e existir. Foram milhares os jovens (com inscrições vocacionadas essencialmente para colocar os filhos - entre os 8 e os 15 anos - dos associados a fazer educação física) que durante mais de uma década puderam contactar pela primeira vez com a Ginástica, Natação, Atletismo, Basquetebol, Andebol e Voleibol, movimentando cerca de 200 jovens por temporada. Para além de outras iniciativas interligadas como  visitas culturais e noções de 'dietética e higiene alimentar'.

Secretário-técnico do SLB
Em 1955/56, o sucesso de uma iniciativa para jovens fez com que a Direcção pensasse em criar para José Esteves um cargo que superintendente todo o desporto do Clube extra-futebol. Foi assim criado o lugar de Secretário-técnico continuando a ser um dos professores, num conjunto cada vez mais abrangente, do 'Curso de Iniciação Desportiva'. A progressiva autonomização desta iniciativa que começou ligada à secção para conquistar lugar à parte terminou com a reabertura da secção de Natação, em 1966 até à actualidade, depois de estar inactiva desde 1939/40.

O professor José Esteves
Pouco dado a mediatismos quando tinha condições para ser figura pública no pós-'revolução dos cravos' preferiu continuar com as suas actividades de promoção e fomento da educação física e tentar passar a mensagem do poder do corpo para modelar o poder da mente.

Sócio de Mérito
A 22 de Março de 1958 foi eleito 'Sócio de Mérito' pela prática efectiva e continuada de serviços relevantes ao Clube. Em 1999 foi doutorado honoris causa (tendo como patrono Almeida Santos) pela Universidade Lusófona num reconhecimento justo do seu trabalho criativo, inovador, descomplexado e libertador do ser humano enquanto cidadão responsável e consciente. Em 1961 esteve como preparador físico da Selecção de Juniores que fez um brilharete num torneio europeu organizado pela UEFA.

Em 17 de Novembro de 2015 morreu um Benfiquista daqueles que pelo modo como conduzem a sua vida se tornam ímpares, como é o Clube com que um dia se identificaram. Aos 83 anos teve uma vida preenchida da qual podemos sempre dizer que não foi uma mais uma!
Obrigado Zé Esteves!

Engrandeceste o Benfica no tempo e momento certo. Se não fossem homens como tu o Benfica não seria a instituição que é! E é muito!

Actividade intelectual
O professor José Esteves a par da sua actividade em prol do engrandecimento do Clube foi desenvolvendo intenso trabalho de pesquisa que culminaria com a publicação em 1967 um livro (com 4.ª edição em 1999) que depressa se tornou a 'Bíblia' da sociologia desportiva e pedagogia da actividade física para desenvolvimento dos jovens, 'O Desporto e As Estruturas Sociais'. Mas com consciência cívica elevada, num tempo de Ditadura, tornou-se um cidadão incomodo, situação que se agravou com a tese que apresentou, em conjunto com António de Sousa Santos: 'Sobre a promoção desportiva nacional' no III Congresso da Oposição Democrática, que decorreu em Aveiro, entre 4 e 8 de Abril de 1973. Reunião que foi importante - até pela carga policial desproporcionada pelos agentes da PIDE e da GNR - na aceleração da necessidade de Portugal se tornar um País Livre e Democrático, como ocorreria pouco mais de um ano depois em 25 de Abril de 1974"

Alberto Miguéns, in O Benfica

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