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quinta-feira, 5 de abril de 2012

Trégua olímpica

"Este ano, pela primeira vez, todos os países membros das Nações Unidas assinaram a trégua olímpica para o período dos Jogos de Londres. Daqui a uns meses, o Mundo volta a viver uma das tradições inteligentes da Grécia Clássica, que consistia na declaração de um período de deposição das armas e observação de paz absoluta, de forma a assegurar toda a segurança aos participantes e assistentes aos Jogos de Olímpia.
Este ato único universal transporta-nos para um Mundo de verdade, respeito e harmonia em forma de redoma cercada de hipocrisia por todos os lados. Os povos em paz e os desportistas numa competição desenfreada, quantas vezes nos limites da legalidade e da correção, em particular pelo recurso ao doping, sem esquecer o jogo súcio que as regras de algumas modalidades admitem, nomeadamente as do futebol – sem dúvida o menos olímpico de todos os desportos.
Foi precisamente a sua natureza apaixonante que trouxe o futebol para cenários de desconfiança e batota que o ameaçam, mas não conseguem derrubá-lo. Quando as coisas parecem muito negras, uma espécie de trégua olímpica sempre surge em nome do bom senso, refreando as hostes e salvando o essencial, até à próxima guerra.
Desta vez foram os árbitros que obrigaram os agentes extremistas que mantêm o futebol português a viver sob permanente ameaça de estado de sítio a assinarem uma espécie de trégua olímpica, fingindo que respeitam a classe de que mais dependem para alcançarem o sucesso. Foi surpreendente a obediência dos guerrilheiros da verdade desportiva nesta primeira jornada sob efeito da ameaça de boicote, embora fique por saber se um fim-de-semana com poucos erros e com vitórias dos mais fortes valeu, de facto, mais do que o medo de não ter árbitros para a explosiva 26.ª jornada.
Os próximos dias esclarecerão esta dúvida e, se tudo não tiver passado de um ataque de pânico generalizado, haverá que tirar consequências da ameaça dos árbitros. Eles deixaram-se criticar, pisar e vilipendiar, gradualmente, pela falta de independência e pela corrupção moral (e não só) de gerações sucessivas, colocando-se cobardemente no final da cadeia de interesses, incapazes de gerir uma boa imagem e uma comunicação coerente.
Acossados pela coação introduzida na internet pelos adeptos mais cobardes, que nenhum emblema renega, até reagiram da pior forma, colocando-se numa posição eticamente indefensável. Se todos os agentes envolvidos neste meio desistissem por ameaças veladas ou explícitas, há muito não haveria, por exemplo, jornalistas capazes de dar a conhecer o que para aí vai de marginalidade e falsidade.
Não nos iludamos, pois, com a trégua em curso. Os dirigentes dos clubes não respeitam os árbitros e o ilusório fim-de-semana de decoro e mesuras que vivemos acabará por descambar, assim que não houver remédio para as classificações. Os árbitros ficarão, então, reféns da sua contra-ameaça, obrigados a assumir-se repugnantes e dispensáveis, com uma inaceitável deriva justiceira, ou a recuar para um estado de bom senso olímpico que, manifestamente, lhes tem faltado nos últimos tempos."

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